domingo, 1 de novembro de 2015

'Dilma só se salva por ela', diz Delfim Netto Oesp

Entrevista. Delfim Netto, economista

Para ex-ministro da Fazenda, presidente deve assumir que é a líder máxima do País e tomar medidas para resgatar a confiança de empresários e consumidores


Ricardo Leopoldo
29 Outubro 2015 | 19h 53
A única saída para a presidente Dilma Rousseff salvar seu governo é retomar a rota do crescimento com rapidez e assumir de fato que é a líder máxima do País, com o envio ao Congresso de um projeto de lei com mudanças estruturais da economia, aponta o ex-ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto. 
Em entrevista ao Broadcast, serviço de informações da Agência Estado, ele aponta, entre outras ações imprescindíveis, a elevação do limite de idade da aposentadoria e a livre negociação entre trabalhadores e empresários, com fiscalização dos sindicatos. "A Dilma só se salva por ela. Se ela tentar continuar se esquivando de assumir o protagonismo fundamental não vai se salvar", disse.
Para Delfim Netto, se a presidente Dilma incorporar esta agenda de mudanças fiscais de longo prazo imediatamente vão se recuperar as expectativas de empresários e consumidores e "a economia vai melhorar muito no ano que vem". Assim, o Brasil poderá crescer de 2% a 2,5% em 2017. "Os empresários estão desesperados para ganhar dinheiro de novo", disse. Acompanhe os principais trechos da entrevista:
'Os empresários estão desesperados para ganhar dinheiro de novo', diz Delfim Netto
'Os empresários estão desesperados para ganhar dinheiro de novo', diz Delfim Netto
O que a presidente Dilma Rousseff deveria fazer para que o Brasil retome rápido a rota do crescimento? 
Só tem uma saída para a presidente Dilma: ela reassumir o seu protagonismo. Sabemos que existe uma situação fiscal muito difícil. Contudo, o que impede o crescimento é que o Brasil não sabe para onde vai. A presidente deveria apresentar ao Congresso um projeto com 5 medidas. A primeira é um limite de idade da aposentadoria mais perto da expectativa de vida do brasileiro. A segunda é aceitar a proposta da CUT que defende a livre negociação entre empresários e trabalhadores, sob a vigilância dos sindicatos. Uma terceira ação é acabar com as vinculações do Orçamento, que são uma barbaridade. A vinculação tira poder do Executivo e do Legislativo. Em quarto lugar, acabar com a indexação ao salário mínimo de coisas como os benefícios da Previdência Social. E em quinto, destravar a reforma do ICMS. A presidente manda o projeto com esses pontos ao Congresso e vai às ruas. Ela enfrenta o panelaço, e diz: "pode bater panela. Estou salvando o futuro do seu filho e permitindo que teu neto encontre um País melhor." A Dilma precisa ir às ruas, pois elas obrigarão o Congresso a cumprir o seu papel. E o parlamento geralmente melhora os projetos.
E qual seria a reação da economia a estas medidas? 
Tudo isto reacenderia a esperança de crescimento. Os empresários voltam a investir e os cidadãos a consumir. A melhora da confiança é instantânea. A economia é expectativa. Só cresce quem acredita que vai crescer. Qual é a realidade hoje? O trabalhador tem medo de perder o emprego, não compra e fica líquido. Se o empresário acha que o trabalhador não vai comprar, ele venderá seu estoque e vai ficar líquido. O banqueiro, quando vê os dois nessa situação aumenta os juros e fica líquido. Quando trabalhador, empresário e banqueiro estão líquidos, os três morrem afogados na liquidez.
E com essas medidas que o senhor sugere, prêmios de risco, dólar e curva de juros futuros baixarão? 
Claro. O importante é fazer. A presidente Dilma precisa entender que a salvação está nela. Sem assumir o seu papel, a economia não vai funcionar.
O senhor acredita que a presidente Dilma vai assumir seu papel de protagonismo? 
Eu espero que sim. A Dilma é honesta, honrada e tinha até uma boa mensagem. Ela se perdeu na busca da modicidade tarifária. Ela começou a baixar os juros arbitrariamente. Todas as intervenções terminaram mal. Mas hoje ela está aprendendo a acreditar no sistema de preços.
Como o senhor avalia a economia para 2016? 
Como o PIB cairá 3% neste ano, isso gerará um carry over de 1,5 ponto porcentual de PIB negativo para 2016. Mesmo que o País cresça 1% no próximo ano, o PIB recuará 0,5% em 2016. Mas se mudar a expectativa, a economia vai melhorar muito no ano que vem.
Como o senhor observou o déficit primário de 1,04% do PIB em 2015? 
A coisa ficou tão complicada que estamos quase em novembro e ainda não sabemos qual será o déficit deste ano. Não há estabilização da dívida em relação ao PIB sem crescimento. Só que nunca o programa do ministro Joaquim (Levy) disse o contrário. O Joaquim tem sido muito injustiçado. Desde o início, o ajuste era uma ponte, que foi esquecida. A receita primária depende da evolução do PIB. Quando o País está crescendo, em geral a receita avança mais. Porém, quando o PIB cai, a arrecadação recua mais ainda. Quando há dificuldade financeira, a primeira coisa que acontece é parar de pagar imposto. Se o PIB sobe 1%, a receita provavelmente avança 1,2%. Mas quando o PIB cai 1%, a receita baixa 2,0%, 2,5%.
E com as mudanças estruturais, quanto será possível crescer em 2017? 
Os empresários estão desesperados para ganhar dinheiro de novo. O Brasil de 1900 a 2000 cresceu 2,6% ao ano, per capita. E o mundo avançou 1,6%. Não há nenhuma razão para que o PIB do Brasil não volte a crescer de 2% a 2,5% ao ano. E vai crescer muito mais se fizermos o que tivermos que fazer.
Como em 2016 a economia estará fraca e o Tesouro provavelmente não terá as receitas da CPMF, seria o caso do governo abandonar a meta do primário de 0,7% do PIB e adotar um resultado estável? 
Estamos dando valor ao que não tem importância. A única coisa que tem valor é colocar a economia na direção correta. O primário será consequência disso. O importante é o governo dizer: vou primeiro estabilizar a relação dívida/PIB. A mãe de todos os equilíbrios é a área fiscal, pois é o instrumento que pode ajudar a demanda quando ela cai. Contudo, aqui começa um pensamento mágico. Tem gente que diz: "Ah, vamos fazer então uma política keynesiana." Coitado do Keynes: seus asseclas são piores do que os do Marx.
O Levy é essencial para o ajuste fiscal? 
As ideias do Levy são essenciais.
Mas e se ele deixar o governo? 
Não tem nenhuma razão para o Levy sair do governo.
O senhor acredita que ele deve continuar no cargo? 
Essa é uma prerrogativa da presidente. Eu acho que a presidente Dilma está com 5 ministros muito bons: O Levy, Nelson Barbosa (Planejamento), Armando Monteiro (Desenvolvimento e Indústria), Kátia Abreu (Agricultura) e a Izabella Teixeira (Meio Ambiente). Mas o que é preciso é a presidente Dilma assumir o papel de presidente num regime presidencialista. Não tem substituto para a Dilma. A Dilma só se salva por ela. Se ela tentar continuar se esquivando de assumir o protagonismo fundamental não vai se salvar. No entanto, ela também não vai sair não.
O senhor não acredita no impeachment da presidente? 
O impeachment não é uma boa solução. Se houvesse uma prova de que houve desvio de função, mas isso não ocorreu. No fundo, é tudo tapetão. Isso transforma o Brasil numa pastelaria. Obedecer a Constituição, para o futuro do Brasil é muito mais importante do que fazer o impeachment. Com a Dilma terminando o governo, provavelmente em 5 ou 6 anos o Brasil vai crescer 1% a mais por ano, porque lá fora vão dizer: aquele é um país civilizado.
O senhor teme a perda do grau de investimento por uma segunda agência de rating? 
Eu acho que é muito provável. A não ser que ocorra uma mudança muito profunda no desempenho da Dilma.
Qual será o fator que levará a maioria do PMDB a apoiar a presidente Dilma no Congresso? 
Se a Dilma assumir seu protagonismo, quando ocorrer o primeiro sinal de melhora da economia vai ser duro manter alguém fora do barco.
Como o senhor vê o destino político do presidente da Câmara, Eduardo Cunha? 
O Cunha vai cumprir o seu papel, vai se defender e o Congresso vai tomar as providências que quiser. Essa não será uma coisa que vai alterar o curso do Brasil. O ponto de inflexão da história brasileira está em Curitiba. O Brasil que vai nascer daquilo é um Pais completamente diferente. É um Brasil onde as empresas serão muito mais cuidadosas e o compliance será absolutamente geral.
Caso o deputado Cunha deixe a presidência da Câmara, isso ajudará a presidente Dilma no Congresso? 
O Cunha é um grande presidente da Câmara. Estamos querendo decidir o que o Cunha vai decidir. Ele vai decidir de acordo com as informações que tiver e vai tratá-las de forma adequada.
Como a recessão é profunda e poderá se estender para 2016, o BC deveria cortar os juros no primeiro semestre do ano que vem? 
Há dúvidas se o Brasil está numa situação de dominância fiscal. Mas se não estivermos nela, estamos muito próximos. A utilidade do Banco Central está muito diminuída. Deixa ele ficar quietinho onde está. O BC fez muito bem em dizer que pode levar a inflação na meta em 2017, que já será uma contribuição importante.
Caso a presidente Dilma adote a agenda que o senhor apontou, aumentaria o espaço para o BC reduzir juros no próximo ano? 
Certamente. E mais que isso. No primeiro momento em que as pessoas acreditarem que o crescimento vai começar haverá uma corrida de investimento no Brasil. 

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