Terra para estrangeiros – a insegurança jurídica persiste
A demora em uma orientação precisa do governo sobre o tema de aquisição e propriedade de terras por estrangeiros continua a causar danos ao agronegócio. As restrições impostas aos estrangeiros para a compra de terras no Brasil estão tendo consequências várias na liberação de crédito para atividades rurais. Desde agosto de 2010, quando o parecer da AGU tornou-se “lei”, bancos estrangeiros e tradings multinacionais estão muito mais cautelosos neste tipo de operação pelo grau de insegurança das garantias dadas em terras.
Explica-se: até então as instituições de financiamento aceitavam as terras como garantia dos seus empréstimos. Mas com a nova legislação pode haver problemas para transferir esses imóveis em caso de execução do título, uma hipoteca como exemplo. O problema teve início no ano passado quando o governo decidiu limitar a compra de imóveis por estrangeiros por conta de suposto interesse de fundos soberanos internacionais na compra de grandes extensões de terras no Brasil. O então Presidente Lula aprovou um parecer da Advocacia Geral da União (AGU) destacando que qualquer empresa de capital externo tem de obter autorização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) ou do Congresso para concluir a negociação, dentro de situações específicas.
Há um consenso de que o Brasil tem legitimidade para restringir a compra de terras por estrangeiros, especialmente se houver evidências de que o negócio é especulativo. O que não está claro é como devem ser aplicadas as regras, face às dificuldades encontradas em um país de tão vasta extensão territorial. Desde a entrada em vigor, as regras já atrapalharam inúmeras transações de compra e venda de terras, com muitos investidores temendo fazer aquisições que possam vir a ser anuladas (isto se conseguirem o registro necessário).
A imprecisão já começa em Brasilia. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) diz que dos 851 milhões de hectares do Brasil, cerca de 4,5 milhões de hectares estão nas mãos de estrangeiros. Mas este número não tem qualquer credibilidade em função dos controles precários que o Incra e o governo em geral tem em mãos.
Temendo serem punidos por algum erro no processo de registro, nos principais estados onde ainda há muita terra agricultável a ser negociada, os cartórios não estão fazendo nenhuma escritura de aquisição por empresas que tenham sócios estrangeiros, mesmo que minoritários. Para redigir este texto consultamos vários cartórios de notas e de registro de imóveis em Mato Grosso, Goiás e Mato Grosso do Sul. Todos conhecem a legislação mas, pasmem os leitores, nenhum deles diz ter passado sequer uma escritura ou feito um registro de negócios com estrangeiros, desde que a legislação foi imposta.
Foto: Brazil Map 1602 – encontrado em commons. wikimedia