Depois do Bolsa Família
18 de setembro de 2011 | 0h 00
Mac Margolis - O Estado de S.Paulo
Das boas notícias que surgiram da América Latina, a melhor é a queda da pobreza. Quase todos os países das Américas caminham para cumprir, bem antes do prazo, as Metas do Milênio - aquele programa da ONU que desafia o mundo a cortar pela metade os índices de pobreza.
Destaque para o Brasil, que atingiu a meta há cinco anos e vem reduzindo à metade o número de pobres a cada meia década. Os vizinhos não ficam atrás. No Chile, a taxa de pobreza caiu de 45% para 15%, desde 1990. No Peru, de 48% para 31% na última década.
Os latinos fazem parte de uma onda global de mobilidade social em que 70 milhões sobem de padrão de vida todo ano. Enquanto o mundo precisou de 25 anos (de 1980 a 2005) para tirar meio bilhão de pessoas da indigência, outros 500 milhões de pobres seguiram ladeira acima nos últimos seis anos. "Nunca antes tantas pessoas foram alçadas da pobreza num período tão curto", dizem Lawrence Chandry e Geoffrey Gertz, em estudo do Brookings Institution.
Os especialistas ainda debatem o motivo desse sismo social. Na América Latina, os fatores são a estabilização econômica e o fim do populismo fiscal, que derrubaram a inflação, e o boom das commodities, que dilatou o PIB e turbinou o emprego. No Brasil, a melhora súbita se deve ao aumento do salário mínimo e ao dinheiro vivo na mão, por meio do Bolsa Família.
Agora, o Brasil e seus vizinhos enfrentam o dilema do sucesso. Por aqui, 22 milhões passaram de pobres a classe média desde 2003. Mas uma pequena parcela, entre 1 milhão e 2 milhões de pessoas, escapou. De fato, nem mesmo aparece nas estatísticas oficiais, seja porque mora em zonas remotas, seja porque não possui documentos legais. São os pobres invisíveis. O desafio é catá-los e cadastrá-los.
O problema maior são aqueles que já estão nos cadastros, mas ficaram para trás. Para atendê-los, o governo tem de se adaptar. "Não adianta fazer a mesma coisa e esperar que eles também saiam da pobreza", diz Ricardo Paes de Barros, assessor do ministério de Assuntos Estratégicos.
Injetar mais dinheiro no Bolsa Família não é a solução. Graças à queda de pobreza recorde, como também ao trabalho de cadastrar os clientes do Bolsa Família, o governo tem o GPS social na mão. Pelo menos os pobres que ficaram para trás têm nome e endereço.
Nos anos 90, sociólogos elaboraram belas teorias para decifrar a pobreza. Ruins eram as políticas sociais. Caras, perdulárias e ineficientes, não enxergavam a miséria. Hoje, o jogo inverteu-se. Enxutas e precisas, as políticas públicas modernas identificaram e atenderam os pobres em números recordes. Mas, para entender os milhões que sobraram, os teóricos precisam se renovar.
O bom é que o problema encolheu. São menos pobres, mais visíveis, que ficam ao alcance das redes de proteção sociais que já existem. Agora, é só entender como fugiram e aprender a pescá-los. "Toda a vez que você está com uma política social boa e a sociedade muda, a política tem de mudar também", diz Paes de Barros. E torcer para que a economia global colabore.
É COLUNISTA DO ''ESTADO'', CORRESPONDENTE DA REVISTA ''NEWSWEEK'' NO BRASIL E EDITA O SITE WWW.BRAZILINFOCUS.COMD
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