quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

Um ano de intolerância e impunidade, Frederico Vasconcelos, FSP

 

Neste final de ano, o presidente Jair Bolsonaro assinou decreto de indulto natalino aos policiais militares paulistas condenados pelo massacre do Carandiru. A hipótese do perdão foi antecipada um mês antes neste espaço.

Neste final de ano, o presidente do TJ-SP, Ricardo Mair Anafe, recebeu três medalhas da Polícia Militar. Os fatos são distintos, mas a homenagem remete às cinco medalhas da corporação recebidas pelo ex-presidente Ivan Sartori. Ele votou pela absolvição dos policiais e disse não ter havido massacre, mas legítima defesa.

Nenhum PM saiu baleado, enquanto 90% dos mortos receberam tiros na cabeça. As vítimas foram eliminadas de cócoras, em posição de rendição.

Alguns fatos relevantes de 2022 publicados no blog Interesse Público
Presidente Jair Bolsonaro, durante cerimônia em Brasília - Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Bolsonaro concedeu perdão constitucional ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado por estimular atos golpistas e atacar ministros do Supremo.

Na véspera, na sessão em que o STF condenou Silveira a 8 anos e 9 meses de prisão, Gilmar Mendes e André Mendonça votaram de forma remota. Estavam em Lisboa, Portugal, em seminário promovido pelo Fibe (Fórum de Integração Brasil-Europa), do qual são parceiros o IDP e a FGV Conhecimento.

Apesar da Covid, 23 ministros de tribunais superiores, 10 desembargadores e juízes aproveitaram os feriados da Semana Santa e de Tiradentes para viajar à Europa, convidados para três eventos de instituições privadas.

No início de dezembro, uma caravana de juízes e promotores viajou a Washington para um evento organizado sigilosamente pela OEA (Organização dos Estados Americanos). Alguns anteciparam a viagem, outros viajaram na classe executiva por conta do erário.

A presidente do STJ, Maria Thereza de Assis Moura, não aceitou o convite.

O PGR, Augusto Aras, viajou com dois acompanhantes. O evento foi organizado por Valter Shuenquener de Araújo, ex-juiz auxiliar de Luiz Fux no STF e secretário-geral do CNJ, que o indicou para ser "representante do Judiciário brasileiro na OEA".

O ex-presidente do TJ-MG, Gilson Lemes, criou escritório do tribunal em Brasília para facilitar seus contatos políticos. Lemes e a mulher, Aliny Kássia e Silva, participaram de eventos eleitorais na campanha de Bolsonaro.

O CNMP suspendeu um procurador da República do Rio e censurou uma procuradora acusados pelos ex-senadores Romero Jucá e Edison Lobão, denunciados sob acusação de corrupção, de revelar assunto sigiloso em release institucional. A decisão colide com relatório da Comissão Processante, que concluiu pela absolvição de todos os acusados.

O procurador da República Celso Três, aliado de Aras, sustentou que o PGR tinha o dever de instaurar investigação de Bolsonaro. Ele criticou o "silêncio condescendente" do chefe do Executivo diante da tentativa golpista da Polícia Rodoviária Federal.

A criação do TRF-6 em Belo Horizonte foi um laboratório para medir a influência de Bolsonaro no Judiciário. O então presidente do STJ, Humberto Martins, convidou Bolsonaro para a inauguração do TRF-6. Cedeu palanque ao candidato à reeleição.

Quatro filhos de desembargadores concorreram a vagas no novo tribunal. O TRF-6 foi inaugurado sem nenhum negro e apenas duas mulheres.

O juiz federal Evandro Reimão dos Reis, do TRF-6, questiona no STF os critérios de escolha dos dirigentes e membros do novo tribunal.

Às vésperas de julgamento, no STJ, de disputa bilionária entre a BR Distribuidora e o Grupo Forte, foi requerido o substabelecimento de poderes a Eduardo Martins, filho de Humberto Martins, então presidente da corte.

O advogado Rodrigo Cunha Mello Salomão estava na mesa de abertura de um seminário no STJ. Ele é filho do corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, que faria a exposição de encerramento.

A cerimônia de posse de Salomão como corregedor nacional, com a presença de representantes dos Três Poderes, teve o aparato de uma posse de ministro do STF.

Salomão recebeu cumprimentos no Centro de Estudos Justiça e Cidadania, recém-inaugurada central de produção, em Brasília, da revista Justiça & Cidadania, do Rio de Janeiro. O ministro preside o Conselho Editorial da editora, que promove eventos de magistrados em ressortes.

Nesta segunda-feira (26), o Globo publicou que o futuro governo fará visitas ao STF para "construir diálogo com o Judiciário", com base em dez ações mapeadas pelo Instituto Justiça e Cidadania.

Trata-se do braço social daquela editora.

A dispensa de Janio de Freitas reavivou o fato de que, trabalhando no mesmo jornal desde 1983, só vim a conhecê-lo pessoalmente na festa dos 80 anos da Folha, em 2001. Quando ele completou 90 anos, em junho último, fiz o seguinte depoimento:

"Numa coluna da Folha, Janio se ofereceu para ser minha testemunha em frustrada queixa-crime oferecida por um empresário corrupto.

Depois, surpreendeu-me ao escrever a resenha de meu primeiro livro, e a orelha do terceiro.

Orgulho-me da generosidade do grande jornalista".


Ratzinger esvaziou a igreja progressista, Frederico Vasconcelos, FSP

 O então cardeal Joseph Ratzinger, o Papa Emérito Bento 16 que morreu neste sábado (31), teve papel influente na desarticulação da igreja progressista no Brasil durante o pontificado de Karol Józef Wojtyła, o Papa João Paulo 2º.

O esvaziamento se deu por meio da divisão de arquidioceses e censura.

Foi imposto o "silêncio obsequioso", a proibição de falar em público e de publicar suas ideias.

Era o "sofrimento silencioso", no dizer do padre historiador José Oscar Beozzo.

Quando cardeal, Joseph Ratzinger puniu membros da igreja progressista
Papa Bento 16, entre dom Paulo Evaristo Arns e dom Hélder Câmara - Arquidiocese de São Paulo, Vatican News e Evelson de Freitas/Folhapress

A arquidiocese de São Paulo foi fatiada, para esvaziar a liderança de dom Paulo Evaristo Arns.

Na divisão da arquidiocese de São Paulo, dom Paulo não foi consultado sobre os novos subordinados. Bispos escreveram ao Papa, dizendo-se "estarrecidos", considerando a decisão "desaforada, desrespeitosa e humilhante", "preconcebida, injusta e prematura".

O trabalho de dom Hélder Câmara foi desmantelado. Foram fechados o Instituto Teológico do Recife (Iter) e o Seminário Regional do Nordeste. A Comissão de Justiça e Paz foi dissolvida.

Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia (MT), também foi punido com o "silêncio obsequioso", entre outros motivos, por haver celebrado missas "à causa negra e à causa indígena".

"Penas canônicas", destinadas a silenciar figuras expressivas da Teologia da Libertação, foram aplicadas aos irmãos Leonardo Boff e Clodovis Boff.

Muitos ex-padres foram proibidos de dar aula de teologia. Os bispos que não se submetiam à linha dura do Vaticano foram substituídos por outros, contrários ao espírito da Conferência de Medellín (1968) -em que bispos latino-americanos declararam a "opção preferencial pelos pobres".

LINHA DURA NA CÚRIA

Em abril de 2005, conversei, por telefone, com dom Paulo Evaristo Arns e dom Pedro Casaldáliga e com ex-assessores de dom Hélder [que entrevistei no final dos anos 1960].

Pedi a dom Paulo para comentar como "enfrentou a linha dura do regime militar e a linha dura da Cúria Romana".

Ele respondeu:

"Entre os militares, a linha dura era, de fato, uma linha dura no sentido total, enquanto entre os cardeais a linha dura nunca é no sentido total, porque eles ouvem muito a parte dos fiéis que reclamam quando há uma linha dura demais."

Dom Hélder sofreu em silêncio, revelou o beneditino Marcelo Barros, seu secretário para assuntos de ecumenismo entre 1967 e 1976.

"Ele já estava em idade avançada e sua reação foi adoecer", disse Barros. "As veias de suas pernas estouraram", afirmou.

"Por formação, quando se tratava de questões da igreja, ele não protestava. Ele tinha consciência de que, se reagisse contra as ordens de Roma, iriam sofrer as pessoas ainda ligadas a ele".

O espanhol Casaldáliga sofria do mal de Parkinson, doença que afligiu João Paulo 2º. Hipertenso, tinha sobrevivido a várias operações e a 18 ataques de malária.

Disse que era um "cavalo velho, um pouco cansado"... Mas mantinha o bom humor e a crítica vigorosa.

"No pontificado de João Paulo 2º, a Cúria foi dura. Às vezes, com todo o respeito, acho que foi até injusta com os teólogos da libertação", disse.

Ele contou que, na década de 1980, fez uma visita a João Paulo 2º, no Vaticano, depois de ter escrito ao papa uma carta longa.

"Ele teve um gesto. Num momento determinado, ele abriu os braços, como quem quer mostrar o desarme, e falou, em português: "'É para que veja que não sou nenhuma fera'".

Guardei duas lembranças da conversa com dom Paulo.

1. Ele sempre pedia a opinião do jornalista antes de responder às perguntas, concordando ou não com o interlocutor.

2. Ratzinger era forte nome para suceder a João Paulo 2º. Perguntei sobre a hipótese de eleição de um papa latino-americano. Dom Paulo respondeu:

"[A hipótese] é muito pequena, porque nós estamos à margem do mundo, por enquanto. A história do mundo se desenvolve na Europa, na Ásia e na América do Norte. É difícil, então, sair um papa daqui."

E completou: "Pode ser que aconteça, porque o Espírito Santo nunca perguntou para nós... Ele age como quer".

Dom Paulo, quem sabe, anteviu a eleição do Papa Francisco.


terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Solar atinge 23,9 GW e sobre para 2º lugar em potência no Brasil, EPBR

 

A fonte solar fotovoltaica alcançou 23,9 gigawatts (GW) de capacidade instalada no Brasil, ultrapassando – por pouco – a eólica (23,8 GW) e agora ocupa o 2º lugar em potência na matriz nacional, mostra a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).

  • As hidrelétricas seguem no topo, com 109,7 GW de capacidade de geração.

Mesmo com a expansão de adições de potência solar e eólica, na oferta de energia a participação dessas fontes ainda é pequena.
 
Em 2022, a oferta interna de energia elétrica (OIEE) foi atendida principalmente pela geração hidráulica (63,5%), seguida pela térmica (cerca de 20%), de acordo com dados de outubro do Ministério de Minas e Energia (MME).
 
eólica responde por 11,6% da oferta, enquanto a solar por 4,2%. Vale dizer que houve um avanço significativo da participação fotovoltaica na OIEE no último ano – em 2021, 2,5% do consumo era atendido pela fonte.
 
O MME estima um aumento de 3,5% na OIEE de 2022, em relação ao ano anterior, alcançando 703,2 TWh, com mais de 86% obtidos através de fontes renováveis. 
 
Há previsão de um forte aumento na geração solar (mais de 70%) e de crescimento da eólica (mais de 12%) e hidráulica (mais de 16%). 
 
Houve também redução da participação de termelétricas a carvão e gás natural, que deve chegar a cerca de 50%, calcula o boletim. Enquanto térmicas a diesel e óleo combustível observam queda de cerca de 20%.
 
Destaque para a geração distribuída, que no último ano cresceu quase 90% em relação a 2021, de acordo com os dados preliminares, em meio a uma corrida para instalar sistemas fotovoltaicos a tempo de aproveitar os subsídios previstos para encerrar agora em janeiro.
 
A capacidade instalada de solar centralizada (de grandes usinas) também teve forte crescimento, aumentando mais de 50% no ano, podendo alcançar mais de 7GW no ano.