sábado, 3 de abril de 2021

Governo aposta em semana de leilões para destravar R$ 10 bilhões em investimentos, FSP

 Em cenário de piora da pandemia da covid-19 e retração da atividade econômica, o governo marcou uma bateria de leilões de aeroportos, portos e ferrovia para a próxima semana, entre os dias 7 e 9, com a expectativa de atrair até R$ 10 bilhões em novos investimentos. Batizada de Infra Week (ou semana da infraestrutura, no termo em inglês), a rodada será um termômetro do potencial de atração de investimentos de longo prazo, no momento em que o Brasil está com a imagem arranhada pela condução da política de enfrentamento do coronavírus.

Serão leiloados 22 aeroportos hoje operados pela empresa pública Infraero, cinco terminais portuários (quatro em Itaqui e um em Pelotas) e o primeiro trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), entre Ilhéus e Caetité, na Bahia – um projeto em obras desde 2011 e que ainda recebe críticas de ambientalistas. O governo quer que a ferrovia se consolide como um corredor logístico de exportação para o escoamento de minério de ferro, além de grãos.

A oferta dos lotes será feita na Bolsa de Valores (B3), em São Paulo, que se preparou para o leilão presencial com regras rígidas de acesso ao local. O valor de R$ 10 bilhões é alto se comparado, por exemplo, com o orçamento do Ministério da Infraestrutura destinado a obras, em torno de R$ 7 bilhões para todo este ano. O número de projetos que serão oferecidos ao setor privado em uma semana também contrasta com o dado de 2020, quando o ministério organizou o leilão de nove ativos. 

O governo teve de fazer adaptações nos projetos após novos estudos sobre o apetite dos investidores e o retorno esperado com os empreendimentos em razão do impacto da pandemia, que afetou de forma diferenciada os setores envolvidos nas concessões. Enquanto na área de portos a demanda subiu, nos aeroportos o movimento foi fortemente afetado. 

Na reta final, o leilão de aeroportos chegou a ser suspenso por uma liminar judicial em Santa Catarina, mas o governo conseguiu reverter a trava jurídica no mês passado. Há pressão também para renovação de incentivos tributários dos portos, que enfrenta resistências da área econômica.

Apetite pelas concessões

Apesar das incertezas com a pandemia, o governo diz que há apetite pelas concessões de longo prazo, num quadro de excesso de recursos no mundo e investidores buscando maior ganho num ambiente de taxas de juros muito baixas, em alguns casos até negativa. Além disso, o preço dos empreendimentos no Brasil ficou barato com a desvalorização do real frente ao dólar.

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Trecho da Fiol, entre Ilhéus e Caetité (BA), projeto em obras desde 2011  Foto: Isac Nóbrega/PR

“Se seguimos em frente é porque o mercado deu esse feedback (retorno, em inglês) para nós também. Não inventamos demanda”, afirmou ao Estadão/Broadcast o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas.

Na área de aeroportos, a novidade é que o governo não vai mais exigir que o operador do terminal faça parte do consórcio vencedor. Ou seja, quem ganhar o leilão não necessariamente precisa ser um operador, podendo contratar uma outra empresa para exercer essa função. “É um movimento importante de continuidade desse processo de participação privada no setor”, diz o presidente da Associação Nacional das Empresas Administradoras de Aeroportos (Aneaa), Diogo Oliveira, ex-ministro do Planejamento.

Oliveira avalia que o leilão tem boa chance de sucesso porque os efeitos da pandemia foram incorporados, tornando os preços atrativos. Ele reconhece, no entanto, que a crise sanitária em si gera muitas incertezas no negócio, já que alguns grupos podem estar enfrentando problemas nos negócios que já possuem. Em maio de 2019, 12 aeroportos foram arrematados com ágio médio (diferença em relação ao mínimo exigido no edital) considerado alto, de R$ 2,1 bilhões (986%).

Empresas querem diversificar carteira

Já os cinco terminais portuários que serão ofertados na semana que vem vão se somar a outros 20 leiloados desde 2019 e a 69 contratos de terminais de uso privado. Mesmo no ano de pandemia, o setor cresceu 4,2% em 2020. Com a crise sanitária, as empresas do setor sentiram a necessidade de diversificar a carteira e esse novo perfil pode atrair investidores de empresas de contêineres e granel sólido para o leilão dos arrendamentos de Itaqui (MA), que são de granel líquido, como combustíveis.

“Esses novos leilões estão tendo procura também por empresas que hoje já operam em outro segmento”, diz Jesualdo Silva, diretor-presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP). 

Faltando poucos dias para os leilões, a Coalizão Empresarial Portuária ainda cobra a renovação do Reporto, regime especial de tributação do setor, por mais cinco anos ou até a implantação da reforma tributária. Lideranças da Coalizão levaram o pleito diretamente ao presidente Jair Bolsonaro no dia 23 de março. As empresas avaliam que uma definição sobre o Reporto será decisiva para aumentar a competição no leilão.

 

Hélio Schwartsman - Sistema eleitoral e a receita de instabilidades, FSP

  EDIÇÃO IMPRESSA

Há uma semelhança importante entre Brasil e Israel. Gostaria que fosse o ritmo de vacinação contra a Covid-19 ou a capacidade de produzir tecnologias inovadoras do país médio-oriental, mas não. O que nos une é o sistema eleitoral —ambos adotamos o voto proporcional puro em âmbito estadual (Brasil) ou nacional (Israel)—, cuja consequência mais notável é a fragmentação partidária.

No Brasil, há 28 partidos políticos com representação no Congresso, sendo que o maior deles, o PT, tem pouco mais de 10% do total de cadeiras na Câmara. Em Israel, são 13, apesar de uma cláusula de barreira que exige ao menos 3,25% dos votos para ter assento no Knesset, o parlamento local. O mais votado deles, o Likud, do premiê Binyamin Netanyahu, conseguiu 36 vagas, bem menos que as 61 necessárias para assegurar a formação de um governo.

O resultado, lá como cá, é que a governabilidade depende de coalizões, o que até é esperado numa democracia. Mas, como a fragmentação é muito grande, são coalizões instáveis. Em Israel, onde o regime é parlamentarista, a situação é ainda mais paradoxal. Como microlegendas, não raro as mais radicais, decidem a vida ou a morte de governos, elas acabam exercendo um poder desproporcional para os votos que têm, daí a força das minorias ultrarreligiosas.

Os israelenses acabam de fazer a quarta eleição dos últimos dois anos e saíram das urnas sem um vencedor com perspectiva clara de formar um governo. Já há quem fale que será preciso realizar mais uma eleição este ano, mas não há motivos para acreditar que vá produzir um resultado diferente das quatro anteriores.

O voto proporcional puro é provavelmente o melhor sistema que existe para gerar um parlamento que expresse bem a pluralidade de visões e nuances ideológicas que existam numa sociedade. Mas fazê-lo, dependendo do grau de divisão do país, pode não ser tão positivo para a governabilidade.


sexta-feira, 2 de abril de 2021

Covid-19 provoca mortes de ao menos dez prefeitos no país em 2021, FSP

 Marcelo Toledo

RIBEIRÃO PRETO

A morte do prefeito de Hortolândia (SP), Angelo Perugini (PSD), 65, na quinta-feira (1º), em decorrência de complicações provocadas pela Covid-19, chamou atenção por ter ocorrido apenas três meses depois do início da atual gestão.

A morte do político, que estava em seu quarto mandato à frente da cidade na região metropolitana de Campinas (2005-2012 e desde 2016), faz parte de um cenário comum a ao menos dez cidades de oito estados brasileiros que perderam seus principais governantes para a Covid-19 logo nos primeiros meses do ano. Desses, quatro estavam em sua primeira gestão. Os governantes tinham entre 42 e 73 anos.

Perugini, que completaria 66 anos na próxima terça-feira (6), ficou dois meses internado, com as últimas semanas em um leito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) em São Paulo, intubado.

Imagem mostra homem usando calça marrom e camisa azul, com as mangas parcialmente arregaçadas, com uma ponte estaiada ao fundo
O prefeito de Hortolândia (SP), Angelo Perugini, que morreu no dia 1º de abril vítima da Covid-19 - Divulgação

Uma de suas últimas agendas foi o recebimento do primeiro lote de vacinas contra a Covid-19, que chegou à cidade em 20 de janeiro.

Hortolândia, que agora será comandada em definitivo pelo até então vice, Zezé (PL), decretou luto de sete dias pela morte do prefeito. "Seu carisma e sua fé serão sempre lembrados, com carinho, pelos amigos que fez ao longo da jornada", disse, por meio de nota, a prefeitura.

Sete das mortes ocorreram a partir de 14 de março, mês em que os óbitos causados pela pandemia se aceleraram em todo o país.

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A morte de Perugini ocorreu apenas um dia após o prefeito de Pitimbu (PB), Jorge Luiz (PDT), 43, perder a vida depois de passar três dias internado com Covid-19. O prefeito estava se recuperando em sua casa, mas sentiu falta de ar e procurou atendimento hospitalar em João Pessoa, a 58 km de distância.

Dois dias antes da morte do prefeito paraibano, Tarek Dargham (PTB), 68, que governava Guararapes, na região de Araçatuba, morreu em São Paulo, onde estava internado. O político tinha sido reeleito em novembro do ano passado com 51,56% dos votos.

No último dia 23, a prefeita de Coremas (PB), Francisca das Chagas Andrade de Oliveira, a Chaguinha de Edilson (PDT), 62, morreu em João Pessoa, onde estava internada.

Chaguinha —que também estava em seu segundo mandato, já que tinha sido eleita pela primeira vez em 2016— tinha manifestado no último dia 2 o interesse de a cidade aderir a um consórcio público para comprar vacinas.

No dia 9, ela foi internada na capital e intubada. Seu quadro se agravou e ela morreu na manhã do dia 23. Neste domingo (4), haverá uma missa virtual pelos 67 anos de emancipação política de Coremas e em memória de Chaguinha.

Na posse, o novo prefeito da cidade paraibana, Irani Alexandrino (Republicanos), chorou ao discursar e disse que o momento estava sendo muito difícil para ele.

“Não tenho palavras suficientes para expressar a dor que estamos passando. Coremas está de luto e ainda chora a partida precoce, trágica, da doutora Chaguinha [...] Para mim vai ser sempre a nossa prefeita. Era uma grande amiga, líder.”

O prefeito de Campanário (MG), Luiz Antônio Souza Campos (PSC), 65, morreu na madrugada do dia 20 de março no hospital Mater Dei, em Belo Horizonte.

Em 18 de março, foi a vez de o prefeito licenciado de Vitória da Conquista (BA), Herzem Gusmão (MDB), 72, ter sido vítima do coronavírus. Ele morreu na noite daquele dia no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Gusmão estava internado desde 26 de dezembro e tomou posse virtualmente em 1º de janeiro.

Treze dias antes de morrer, o prefeito gravou um áudio para informar a população da cidade baiana que retornaria para a UTI. "Quero dizer para minha terra que, por necessitar de mais oxigênio, a equipe médica indicou o meu retorno para tratamento na UTI", disse na ocasião.

Ele estava iniciando seu segundo mandato, em quatro tentativas de chegar à prefeitura —disputou o cargo também em 2008 e 2012, antes de ser eleito pela primeira vez em 2016. Com a morte de Gusmão, sua vice, Sheila Lemos (DEM), assumiu a função.

A primeira das sete mortes de março foi a de Jorge Postal (MDB), 73, que governava São Jorge (RS) e morreu no último dia 14. O prefeito, que já tinha governado a cidade entre 2009 e 2012, teve diagnóstico de Covid-19 no fim de fevereiro e logo teve de ser internado. Após alguns dias no hospital São João Batista, em Nova Prata, onde foi intubado, foi transferido para a UTI do hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, no dia 7.

Imagem mostra Maguito Vilela, eleito para governar Goiânia e que morreu em janeiro
Maguito Vilela, que morreu em 13 de janeiro por complicações decorrentes da Covid-19 - Divulgação

Outros três óbitos ocorreram ainda em janeiro. O primeiro prefeito a morrer dentro do atual mandato foi Marcelo Puppi (DEM), 61, de Campo Largo (PR), no dia 7 daquele mês. Ele estava internado desde 25 de novembro, dez dias após ter sido reeleito prefeito do município de 133 mil habitantes.

Apenas três dias após ter sido internado, Puppi foi transferido para a UTI, mas não conseguiu se recuperar e estava no hospital na data em que deveria iniciar um novo mandato. Em seu lugar, assumiu Maurício Rivabem (PSL).

A situação foi a mesma enfrentada por Maguito Vilela (MDB), 71, de Goiânia, que não chegou a administrar a capital de Goiás.

Ele tomou posse no hospital, onde estava internado desde outubro devido a complicações decorrentes da Covid-19. Isso significa que ele não participou da reta final da sua campanha eleitoral, tampouco foi às urnas para votar nele próprio nos dois turnos da eleição goiana.

Vilela morreu na madrugada do dia 13 de janeiro no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Com isso, Rogério Cruz (Republicanos), 56, assumiu o governo na capital.

Eleito com 100% dos votos -foi candidato único- para governar Ereré (CE), o professor Otoni Queiroz (PDT), 42, foi outro que não chegou a assumir o cargo. Internado ainda em dezembro, ele morreu em 20 de janeiro.

Em sua última postagem pública numa rede social, em 8 de dezembro, relatou quadro de dor de cabeça, febre e calafrio. A febre aumentou e ele passou a ter dor nos olhos, o que o fez ir para Fortaleza para passar por exames.

“Dentre os exames, fiz uma tomografia do tórax que apresentou ‘características de imagem comumente reportadas na pneumonia por Covid-19’, com envolvimento de 25-50% do parênquima pulmonar. Falta receber ainda o resultado do exame swab, mas mesmo assim o médico já confirmou que estou com o coronavírus.”

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