terça-feira, 17 de julho de 2012

Otimismo das famílias atinge 2º melhor resultado em 12 meses


Beatriz Bulla, da Agência Estado
SÃO PAULO - Desaceleração da economia nacional, descrença em uma melhora no cenário externo, rebaixamento da previsão dos analistas de expansão do PIB para 1,90%, alto nível de endividamento e sinais de que o País não está reagindo aos pacotes de estímulo apresentados pelo governo. Nenhuma das notícias recentes parece ter afetado ainda o grau de otimismo das famílias brasileiras, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O Índice de Expectativa das Famílias (IEF), calculado mensalmente pelo Ipea por meio de pesquisa em 3.810 domicílios de 214 municípios espalhados por todos os Estados, mostra que, em junho, o otimismo nacional com a situação socioeconômica do Brasil subiu 1,5 ponto na comparação com maio e chegou a 68,5 pontos. O resultado é o segundo maior dos últimos 12 meses, perdendo apenas, em 0,5 ponto, para o mês de janeiro deste ano, quando o índice marcou 69 pontos. O resultado de junho deste ano é 4,4 pontos superior aos 64,1 registrados ao mesmo mês de 2011.
"No geral, há uma boa expectativa das famílias, que se sentem seguras em seus empregos e se sentem com potencial de crescer no futuro. Muitas famílias estão sem altos graus de endividamento e mantendo o emprego. Não é um endividamento solto e não é um endividamento sem emprego", disse a presidente do Ipea, Vanessa Petrelli Côrrea, explicando o otimismo nacional.
A maioria das famílias consultadas no IEF de junho (53%) afirmou não ter dívidas. Apesar de ser 0,5 ponto porcentual inferior ao resultado de maio, o indicador ainda é positivo. Em regiões do País como Centro-Oeste e o Sudeste, o número é ainda melhor. No primeiro caso, 88,8% das famílias declararam não possuir dívidas. No Sudeste, o número chega a 59,9%. Dentre os que declararam possuir dívidas, cerca de 1/3 dos entrevistados no País disseram não ter condições de quitar plenamente as dívidas. No total nacional, 69% das famílias responderam não possuir contas em atraso.
Quanto ao emprego, 80,2% das pessoas disseram se sentir seguras com a ocupação do responsável pelo domicílio. O resultado é inferior ao apresentado em maio (82,8%), mas segue alto. A expectativa de melhoria profissional do responsável pelo domicílio cresceu, passando de 39,8% em maio para 41,4% em junho.
Com emprego e sem dívidas, o momento parece propício para o consumo, de acordo com a pesquisa do Ipea. A maioria das famílias (60,2%) disse que agora é um bom momento para adquirir bens duráveis. O resultado variou negativamente 0,4 ponto porcentual com relação ao mês anterior, mas a porcentagem de famílias que disseram não considerar o momento ideal para consumir bens duráveis vem diminuindo desde setembro de 2011, quando o índice era de 41,1%, e chegou em 35,3% em junho deste ano. "Muita gente diz que não está muito endividada. E as pessoas acham que estão seguras em seu emprego. Elas consideram que ainda têm condições de consumir", disse a presidente do Ipea.
Economia e situação financeira
A expectativa das famílias para a economia nacional nos próximos 12 meses, um dos critérios usados pelo Ipea para medir o otimismo, continuou em queda. O índice passou de 66,8% de famílias que disseram acreditar que o Brasil passaria por melhores momentos em maio para 65%. Em abril, o índice marcava 68,3%. Com relação ao longo prazo, contudo, a percepção das famílias subiu em junho. Na leitura mais recente do IEF, 63% das famílias se disseram otimistas com a economia brasileira para os próximos cinco anos, ante 62% de respostas positivas registrados em maio.
A percepção sobre a situação financeira piorou em junho. Em maio, 77,8% das famílias pesquisadas indicaram estar melhor financeiramente hoje do que há um ano. Em junho, o número caiu para 75,5%. Para o próximo ano, 85,3% das famílias têm expectativas positivas sobre a situação financeira. O resultado é 0,5 ponto superior ao registrado em maio (84,8%).
Regiões
A análise por regiões mostra que o Centro-Oeste puxou o indicador de otimismo das famílias no País. A região apresentou alta de 6,5 pontos em junho ante maio, passando de 79,5 para 86,0 pontos, um salto que faz a expectativa da região ser considerada como de grande otimismo. O Sudeste, apesar de recuar 0,2 ponto no índice, é a segunda região com maior otimismo (69,9 pontos). Na sequência vêm as regiões Sul (66,8 pontos) e Nordeste (65,3 pontos). O Sul teve alta de 1,3 ponto na comparação com maio e o Nordeste recuou 0,2. O Norte do País entrou na casa do que o Ipea considera como otimismo, ao subir 3,2 pontos em junho, passando de 59,5 pontos em maio para 62,7.
Para o Ipea, resultados entre 60 e 80 pontos são considerados otimistas. Abaixo de 60 pontos, a instituição divide as respostas entre grande pessimismo (0 a 20 pontos), pessimismo (20 a 40 pontos) e moderação (40 a 60 pontos). Acima do grau de otimismo, entre 80 e 100 pontos, a expectativa das famílias é classificada como grande otimismo.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

O bom exemplo do Exército


O Estado de S.Paulo
No momento em que notícias sobre superfaturamento e atraso em obras públicas se tornam corriqueiras, é animador saber que algumas dessas obras estão sendo entregues antes do prazo previsto e a custos inferiores aos originalmente orçados. Não se trata de milagre. É apenas o resultado do trabalho competente e sério realizado por uma instituição cuja missão precípua não é tocar canteiros de obras, mas que nos últimos anos tem assumido maiores responsabilidades na elaboração e execução de projetos de infraestrutura em todo o País: o Exército.
O Departamento de Engenharia e Construção (DEC) do Exército, como mostra o jornal Valor (12/7), está tocando 34 obras em vários Estados, 25 delas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e elabora, a pedido da Infraero, projetos de engenharia destinados a acelerar a expansão dos aeroportos de Porto Alegre, Vitória e Goiânia. Nessa área, o Exército já trabalha na administração dos serviços de terraplenagem da ampliação do aeroporto de Guarulhos e na construção da pista do aeroporto de Amarante, no Rio Grande do Norte.
É principalmente o desempenho do Exército nas obras do aeroporto de Cumbica que tem animado a Infraero a ampliar a parceria com os militares numa área que se tem transformado numa das maiores dores de cabeça do governo no que diz respeito ao cumprimento dos prazos das obras da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016. A terraplenagem do Terminal 3 de Cumbica, cuja previsão inicial de entrega era para dezembro de 2013, será concluída em setembro próximo, com antecipação de 15 meses. Além disso, o custo original da obra, orçado em R$ 417 milhões, deverá ser reduzido - e não é apenas porque a União paga os soldos militares - em cerca de R$ 130 milhões, o que equivale a 25%. É exatamente o contrário do que tem sido noticiado a respeito da verdadeira lambança que a principal empreiteira do PAC, a Delta, tem promovido nas obras bilionárias sob sua responsabilidade em todo o País.
É claro que tocar obras públicas não é a missão precípua das Forças Armadas, que existem para zelar pela defesa nacional. E o Exército, cuja "intervenção" no mercado é malvista pelas empreiteiras de obras públicas, sabe muito bem que essa não é sua verdadeira vocação. O general Joaquim Maia Brandão, chefe do Departamento de Engenharia e Construção, garante, segundo o Valor, que não há planos de ampliar a estrutura da unidade sob seu comando, apesar do aumento da demanda ocorrido nos últimos anos, inclusive no que diz respeito ao planejamento e construção de novas estradas e manutenção das existentes, responsabilidade do mal afamado Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Nessa área o Exército tem 19 contratos firmados. E cumpre outros tantos nos setores portuário e de navegação fluvial.
O Exército está hoje envolvido em 34 projetos de construção, no valor de R$ 3 bilhões em obras, dos quais R$ 2,4 bilhões são do PAC. Intervenção indevida no mercado? Desvio de funções? O general Brandão responde: "O que temos é uma missão para cumprir, que é a preparação de nossas tropas para a guerra. Se não temos guerra, temos a obrigação de manter nosso contingente em atividades que, se necessário, (a tropa) irá desempenhar em situação de emergência". Não é, portanto, a lógica do mercado, mas a necessidade de manter seu contingente ativo e preparado que motiva o Departamento de Engenharia e Construção.
A situação de emergência a que se refere o general seria, obviamente, um eventual conflito militar. Mas não resta dúvida de que o DEC está atendendo também a uma importante e extremamente lamentável emergência ao cumprir com competência, seriedade e economia de recursos públicos uma tarefa fundamental para o desenvolvimento do País que a iniciativa privada tem sido frequentemente incapaz de executar com a mesma eficiência e probidade, devido à crescente promiscuidade entre negócios públicos e privados. É de imaginar que seja difícil trabalhar com orçamentos enxutos quando a regra do jogo é pagar propinas que satisfaçam a crescente voracidade de homens públicos tão desonestos quanto quem lhes molha a mão.

O Largo da Concórdia



16 de julho de 2012 | 3h 03
Chico Alves viera a São Paulo para apresentar-se em programas da Rádio Nacional. Naquele sábado, 27 de setembro de 1952, acompanhado de Rago e seu Regional, cantou, no Largo da Concórdia, alguns de seus muitos sucessos. Era homenagem a seus fãs do bairro do Brás. A caminho da Via Dutra, no retorno ao Rio, o cantor fez ali uma parada para o show, às 14h.
O Largo da Concórdia tivera feira de mulas, no século 19, abrigara circo e parque de diversões. Era agora um lugar de concentrações populares, perto das movimentadas estações do Norte e do Brás. Mutilado pela construção do Viaduto do Gasômetro, em 1949, perderia aos poucos a nobreza dos tempos áureos do bairro. Mas ainda estava lá o Teatro Colombo, onde Pietro Mascagni regera uma de suas óperas em tempos idos. O Brás mantinha a aura da época das serestas e da composição famosa de Alberto Marino,Rapaziada do Brás. Não estavam longe os corsos de carnaval na Avenida Rangel Pestana. O bairro vivia os últimos tempos de italiano e operário, das cadeiras na calçada para conversas das famílias depois do jantar.
Já existia aí por 1850. No fim de 1865, dera-lhe a Câmara Municipal o nome de Largo da Concórdia, tributo à cidade argentina onde se concentraram e de onde partiram para a luta as tropas brasileiras na Guerra do Paraguai, meses antes. Continua da Concórdia apesar da discórdia, há alguns anos, com os camelôs que o haviam ocupado.
A apresentação de Chico Alves foi um evento de fim de época, além de ser o seu último evento: ele morreria carbonizado, horas depois, na Via Dutra, em Pindamonhangaba, quando seu carro, ao se chocar com um caminhão que vinha na contramão, pegou fogo. Significativamente, cantou o fim de épocas. Gravara anos antes Seu Julinho vem, apologia de Júlio Prestes, presidente eleito da República. Seu Julinho não veio, cassado antes da posse pela Revolução de outubro de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder. Um ano antes de morrer, Chico Alves gravara Bota o retrato do velho (Bota no mesmo lugar) para celebrar o retorno de Vargas ao poder, em 1950, cujo suicídio em 1954 daria início ao fim da Era Vargas.
Começou sua despedida de São Paulo no Largo da Concórdia cantando Caminhemos: "Não, eu não posso lembrar que te amei, eu preciso esquecer que sofri." Naquela época de amores impossíveis, ou ao menos difíceis, amava-se sofrendo. Nem o Carnaval escapava. Em Confete, que Chico Alves também cantou naquela tarde, a ausência estava lá, poeticamente: "Confete, pedacinho colorido de saudade".
Em seu enterro, no Rio de Janeiro, o povo cantou Adeus: "Quem fica, também fica chorando, com um lenço acenando, querendo partir também." Em São Paulo, dois dias antes, sem o saber, Chico cantara o réquiem do antigo Largo da Concórdia, o largo do povo do Brás.