O Estado de S.Paulo
O Brasil é o único país no mundo em que o emprego cresce e as despesas com seguro-desemprego disparam. O paradoxo decorre de instituições de má qualidade no campo do trabalho. Explico-me.
Para fazer jus ao seguro-desemprego, o empregado precisa ter trabalhado pelo menos seis meses com registro em carteira. Para poder sacar os recursos depositados no FGTS, o empregado necessita completar um ano de serviço, desde que dispensado sem justa causa.
Vejamos o que ocorre com um empregado que ganha R$ 1 mil por mês e que completa um ano na mesma empresa. As estimativas a seguir são feitas com aproximações e sem considerar os descontos de lei.
Se ele for dispensado sem justa causa, terá acumulado R$ 1.040 na sua conta do FGTS (inclusive a parcela do 13.º salário). No caso de ser desligado da empresa sem justa causa, sacará esse montante e receberá R$ 400 a título de indenização de dispensa, perfazendo R$ 1.440. Além do salário do mês, como parte das verbas rescisórias, ele terá direito a R$ 1 mil de 13.º salário e R$ 1.333 a título de férias e abono, o que no agregado soma R$ 3.773. Uma vez despedido, ele receberá quatro parcelas no valor de R$ 763,29 a título de seguro-desemprego, ou seja, R$ 3.053,16. Em resumo: para viver nestes quatro meses, o empregado em tela disporá de R$ 6.826, o que dá uma média mensal de R$ 1.706, ou seja, 70% a mais do que ganhava quando estava trabalhando.
Até aqui foi tudo legal. Mas, com a atual falta de mão de obra, o referido trabalhador pode se reempregar com facilidade. Para não perder o benefício do seguro-desemprego, muitos procuram um emprego informal. Digamos que o protagonista do exemplo consiga ganhar R$ 1 mil nessa atividade, ou seja, R$ 4 mil durante os quatro meses. O ganho total no período subirá para R$ 10.826, que dá uma média de R$ 2.706 mensais! Além disso, há o abono salarial.
Numa realidade desse tipo, não é à toa que tanta gente utilize esses expedientes. Isso ocorre principalmente entre os empregados de baixa renda. Os dados mostram que, em 2010, 85% dos saques do FGTS foram feitos em contas cujo saldo médio era de apenas R$ 1 mil (tendo totalizado R$ 12 bilhões). Para quem ganha R$ 1 mil por mês, um acréscimo de renda de 170% é de extrema valia.
É assim que se explica por que os pedidos de seguro-desemprego aumentam numa hora em que (ainda) são abundantes as oportunidades de emprego. As despesas explodem. O pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial consumiu em 2011 cerca de R$ 32 bilhões - quase 20% acima do que se gastou em 2010.
Uma parte do estouro das despesas foi devida à elevação do salário mínimo em 2011. E o que ocorrerá em 2012? O salário mínimo será de R$ 622 mensais - um aumento de 14% em relação a 2010. O governo que se prepare. As despesas com seguro-desemprego e abono salarial explodirão.
Mas essa é só uma parte da história. A outra, de maior impacto, vem da combinação das estratégias acima descritas e ganha força num mercado de trabalho aquecido. A rotatividade aumenta porque muitos empregados "provocam" sua demissão (sem justa causa) e entram na ciranda das benesses.
Esse é um bom exemplo de como más instituições induzem a perigosas distorções. Está na hora de fazer uma boa revisão das leis que dão suporte a essas manobras. A exigência de aceitar um emprego oferecido pelo Ministério do Trabalho (criada em setembro de 2010) é uma boa medida, mas ainda é tímida. Uma reforma de profundidade exige a combinação do seguro-desemprego e do FGTS com programas de treinamento e com a própria aposentadoria. Mas esse é um assunto complexo que fica para outra oportunidade. Ademais, os recursos do FGTS pertencem aos trabalhadores, que já vêm sendo expropriados por uma taxa de juros ridícula, e a eles cabe a primeira palavra.
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