Coluna Econômica - 25/04/2011
Velho guerreiro da industrialização brasileira, Paulo Cunha, do grupo Ultra, está quase realizado. Nos últimos anos o Ultra tornou-se o terceiro grupo privado brasileiro em faturamento, atrás apenas da Vale e da JBS. A empresa profissionalizou-se totalmente. Nas ultimas semanas foi para o Novíssimo Mercado da Bolsa e transformou todas as ações em ordinárias - com direito a voto
Foi o processo final de uma promessa feita em 1980 para o fundador do grupo, Peri Igel, de não colocar em risco a empresa por questão de sucessão.
As três principais famílias acionistas - Cunha, Igel e Beltrão - chegaram a um consenso e toparam abrir mão das vantagens do controle, em favor da empresa.
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Nos últimos anos, Paulo Cunha adotou a estratégia mais adequada para a empresa, mas não a que gostaria de ter adotado se as condições econômicas fossem outras.
Defensor de um cambio competitivo, que permitisse o fortalecimento das indústrias no país, há tempos perdeu as esperanças. Julga que a marcha da insensatez conduzirá o país inapelavelmente para o populismo cambial. Então direcionou o grupo para a área de serviços. Adquiriu o grupo Ipiranga, reforçou a distribuição de gás e abriu mão dos planos de construir uma refinaria para óleo pesado, em parceria com a Petrobras.
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O grupo continua investindo em busca de qualidade, redução de custos e em pesquisas tecnológicas. Mantém um conselho com técnicos internacionais, em geral aposentados de grandes companhias globais, com conhecimento acumulado para indicar o rumo dos investimentos no setor.
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Mas Cunha acumula uma decepção. Acha que a maldição do câmbio baixo veio para ficar, matando as chances de uma industrialização autônoma brasileira.
Dia desses, em uma reunião com empresários, constataram desalentadas que o Brasil não possui mais sequer uma indústria de fundição – base para qualquer tentativa de fabricação de maquinário pesado.
O câmbio abaixo de R$ 1,60 está produzindo uma devastação terrível no perfil industrial, mais ainda que os desastres dos últimos 16 anos, diz ele.
Nas conversas com membros do governo tem tentado alertá-los de que esse processo gradativo de conter a queda do dólar, com poucos resultados, é infrutífero devido ao fator tempo. Quando Fazenda e BC conseguirem contornar as resistências do mercado e, de alguma maneira, tentarem desvalorizar o real, será tarde.
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O velho capitão continua indo diariamente ao trabalho. A profissionalização da empresa permitiu que cada filho seguisse seu caminho, sem a pressão da sucessão. Dia desses registrou sua carreira em longo depoimento no CPDOC, da Fundação Getúlio Vargas. Falou da importância da mãe na sua formação, de seu início na Petrobras, da entrada no grupo Ultra.
Não sei se chegou a registrar a única frustração de uma vida profícua: a de ter apostado em um país que, mesmo com os avanços registrados nas últimas décadas, abdicou da industrialização e, com isso, da rota para consolidar seu papel de grande economia no mundo.
A alta da Selic – 1
Os descaminhos da política monetária brasileira são fáceis de demonstrar. A taxa Selic impacta dois clientes distintos. O primeiro, os demandantes de crédito em reais; o segundo, os investidores e captadores de ativos em dólares. No mundo dos reais, o custo do crédito oscila entre 40% a 200% ao ano; no mundo dos dólares, a 5%, 8% ao ano. Nas aplicações, o mundo do real remunera a 8 a 15% ao ano; o dos dólares a 2%.
A alta da Selic – 2
Qualquer mexida na Selic tem efeito ínfimo sobre o crédito e a demanda interna; e efeitos avassaladores sobre o fluxo de dólares. Suponha um bem de R$ 1.000,00, financiado por 24 meses a taxas de 4% ao mês. O valor da prestação será de R$ 65,59 mensais. Com mais 0,25% de custo de captação, esse valor subirá para R$ 65,73 mensais. Desestimulará algum financiamento? É evidente que não.
A alta da Selic - 3
Na outra ponta, 0,25% - mesmo em cima de uma maluquice de 12% ao ano – é um estímulo a mais para a entrada de dólares. Não apenas isso. Mesmo sendo menos do que o mercado fingiu que seria, é sinal de que o Banco Central não pretende deter a apreciação do real. É gasolina na fogueira da especulação com o real. Não altera em nada o crédito em reais mas influi na veia na entrada de dólares.
A alta da Selic - 4
Esta semana estive com um conhecido, grande investidor. Ele recebeu uma oferta do Credit Suisse para uma aplicação em dólares. Funciona assim: Se o dólar continuar caindo ele ganha até 23% ao ano. O que passar disso é ganho do Credit Suisse. Se o dólar se valorizar, o banco garante ao menos 6% de remuneração nominal para sua aplicação. Na conta dos vendedores do banco, a aposta é que o dólar chegue a R$ 1,32 este ano.
A alta de Selic - 5
O sujeito aplica US$ 1 milhão. Pelo dólar a R$ 1,56, converte em R$ 1.560.000,00. Aplica na Selic a 12,5%. Em um ano, o investimento sobe para R$ 1.755.000,00. Daqui um ano, se o dólar estiver de fato em R$ 1,32, ele converterá o saldo em US$ 1.329.545. O ganho será de 33% em um ano. Não se trata de mero exercício matemático. Trata-se do raciocínio que está embalando todo o mercado a manter a aposta na apreciação do real.
A alta da Selic - 6
O custo que o BC infringiu ao país com essa alta de 0,25 na Selic não é apenas o do impacto direto no custo da dívida. É a manutenção da fogueira acesa das apostas contra o câmbio, é a aceleração do desmonte das indústrias, o aumento do custo de ampliação das reservas cambiais. O governo Dilma tem ess consciência. O que impede medidas mais pro-ativas é o medo da desestabilização provocado pelo mercado.
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