quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Fim do etanol hidratado...

O fim do etanol hidratado. O fantasma voltou a assombrar o setor sucroalcooleiro justamente na semana em que se comemoraram os 40 anos do Proálcool (Programa Nacional do Álcool). O tema entrou na pauta do 8° Congresso Nacional de Bioenergia, promovido pela Udop (União dos Produtores de Bioenergia), que reuniu lideranças do agronegócio em Araçatuba (SP) para debater temas relevantes ao setor em meados de novembro.
Alguns empresários defendem que, como o governo não planeja uma política pública de regulamentação do setor sucroenergético em longo prazo, uma das soluções seria pressioná-lo com a criação de um biocombustível único, o que implicaria no fim da fabricação do etanol hidratado que abastece diretamente os carros nos postos e ficar somente com o anidro, aquele que se mistura à gasolina. A maioria das vozes do segmento, no entanto, é contra. "É uma discussão que já aconteceu várias vezes desde a criação do Proálcool. São pontos de vista diferentes", diz Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro, de São Paulo. "Para alguns, o etanol é um patinho feio. É uma discussão que não é nova e não é simples."
Maurílio Biagi Filho, do Grupo Maubisa, de Ribeirão Preto (SP), filho de um dos fundadores do Proálcool, explica que a proposta, na verdade, não implicará no fim do biocombustível, mas em um produto novo. "Precisamos de uma virada, uma mudança definitiva. Não falo apenas no fim do álcool carburante, mas na fabricação de um produto puro, sem adição de água, com rendimento superior ao da gasolina", diz. Quando defendo essa tese, estou falando de um programa que corrija os erros que cometemos no passado." Biagi acredita que, com o biocombustível único, o governo poderia inserir definitivamente o etanol na matriz energética nacional. "A adaptação dos motores à gasolina para o uso do etanol é uma tapeação."
O posicionamento de Biagi, de acordo com fontes do setor, seria apoiado pelo maior grupo sucroenergético do mundo, a Raízen, de Piracicaba (SP), mas, segundo sua assessoria de imprensa, a empresa não quis se pronunciar. "Essa companhia está em cima do muro porque, de um lado, não quer conflito com a indústria automobilística e, do outro, com os usineiros", afirmou uma fonte. O grupo Raízen é formado pela associação da Cosan (50%) com a Shell (50%).

Caro igual gasolina

Luis Roberto Pogetti, presidente do conselho de administração da Copersucar, o maior conglomerado global de açúcar e etanol, explica que o fim do etanol hidratado é uma demanda das montadoras. "Esse setor quer uma padronização mundial de motores. Os carros flex só existem no Brasil", diz. "Não podemos esquecer que é exatamente por esse motivo que o país é invejado, por ter um etanol eficiente, que cria independência de energia para os veículos. Se não tivéssemos o etanol, quais números tão positivos apresentaríamos na COP 21?"
Contrário à opinião de Biagi, Pogetti diz que o etanol anidro não traria melhorias significativas de per-fomance aos motores, pois os ganhos logísticos da distribuição são de baixa relevância (os postos continuariam tendo duas bombas diferentes), mas o consumidor, por sua vez, teria de pagar mais por ele. "Esse etanol único teria de ser 13% mais caro que o álcool hidratado de hoje para ser equivalente à gasolina", afirma. "Quem vai pagar é o consumidor."
O usineiro Celso Junqueira Franco, presidente da Udop, também defende a manutenção do hidratado e diz que a opção por um combustível único poderia gerar um problema sério no campo. "O etanol anidro, em tese, exige de 8% a 10% menos quantidade de cana-de-açúcar para ser produzido. Se olharmos a demanda para 2030, então sobrariam 40 milhões de toneladas de cana nas lavouras, sem destino. Precisamos primeiro resolver o mecanismo de precificação do etanol", diz.
O economista e ex-presidente da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (UNICA), Eduardo Pereira de Carvalho, considera a discussão um retrocesso. "Preciso ser convencido do contrário. Acho que o ganho que tivemos com o carro flex foi um ganho do consumidor. Ele é quem dá força para o setor, é a escolha dele que prevalece, e essa conquista não pode ser esquecida", diz. "Também é um benefício para o produtor rural, que tem um enorme mercado para conquistar e não pode depender do poder de uma caneta que vai determinar qual é a porcentagem da mistura à gasolina, no caso do anidro."
Para Carvalho, o fato de o setor ter sido penalizado com o congelamento do preço da gasolina pelo governo, para evitar pressão sobre a inflação, não foi exclusividade dos brasileiros. "A presidente Dilma não foi a única a adotar essa estratégia, pois ela ocorreu na história inúmeras vezes. Isso faz parte do risco do setor de combustíveis."

Uma pá de cal no pre-sal, por Fernando Meirelles

COP 21. No final das contas, toda conversa em Paris se resume a uma questão: como e quando acabar com as emissões de gases de efeito estufa, ou como e quando acabar com a indústria do petróleo e do carvão.
Os gases de efeito estufa são cumulativos. Até hoje não existe nada que consiga trazê-los de volta a não ser o crescimento de árvores e os oceanos. Ou seja, uma vez na atmosfera lá ficarão para sempre.
Apenas emitir menos, como querem alguns, não resolve. Não há truque possível: 2/3 das reservas de petróleo terão que ser deixadas no solo. Catástrofes seria a outra opção.
Sim, entramos na era da desmontagem da indústria do petróleo e do carvão. O prazo para isso acontecer é bem apertado, 2050. Temos 35 anos para chegar a emissão zero, para passarmos por Cubatão descendo a Via Anchieta e vermos o mangue ocupando de novo a área onde um dia foi uma refinaria.
Esta imagem de Cubatão sem fumaça, linda para uns, cai como uma bomba para os países e companhias produtoras de petróleo e não é difícil entendê-los. Eles ainda acreditam e lutam para que seu produto tenha mercado até o final do século. Lutam por uma sobrevida na COP21.
Não por acaso a Arábia Saudita foi o último país a enviar sua INDC (Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida, na sigla em inglês) para Paris, mesmo assim um compromisso vago onde exigem que os países ricos os ajude a fazer a transição para fontes de energia limpa e a se recuperar do impacto que sua economia vai sofrer.
Sem esta ajuda o documento saudita sugere que as mudanças poderão não ser levadas a cabo. Claro que os países ricos não querem pagar pela recuperação econômica de quem tem um dos maiores PIBs per capita do mundo e as mãos igualmente sujas. Esta pode ser uma das pedras no caminho do sucesso destas negociações.
Ontem, dia 8, sauditas, argentinos, poloneses e venezuelanos aceitaram baixar a meta de aquecimento máximo de 2˚C para 1,5˚C, só que com a condição de ser retirada do texto a proposta de descarbonização do mundo.
Como se aquecer menos mas continuar emitindo fosse conciliável. Para eles é. A justificativa que deram compete na categoria non-sense e humor com a definição do Cunha de "usufrutuário".
Do lado das companhias privadas a tensão em relação ao futuro não é menor. Nenhuma das grandes como Shell, BP, Exxon ou mesmo a Petrobras fizeram lances no ultimo leilão de blocos do pré-sal em outubro. O tal leilão que foi um fiasco e não vendeu quase nada.
Aparentemente investimentos em petróleo a longo prazo já estão em cheque. Mesmo não sendo um especialista na área, vendo daqui dos corredores da COP 21 me parece que o sonho do pré-sal acabou.
Morreu. Vamos ser realistas: se já não venderam em outubro, depois desta COP e a cada ano ficará mais difícil fazê-lo. Claro que o baixo preço do barril afasta investidores, mas quero crer que o bom senso também tenha peso nesta decisão. Fichas demoram a cair mas parecem já estar caindo. Ainda bem.
Mas aí vem a pergunta: E a Petrobras como fica? Se forem sensatos eles já devem estar montando um time para planejar a data para desligar cada refinaria, tipo de coisa que funciona melhor se pensada com décadas de antecedência.
O Brasil tinha um excelente projeto de biocombustível em andamento, abortado quando o pré-sal foi confirmado em 2008. Talvez agora seja a hora de retomá-lo e a Petrobras poderia fazê-lo. Uma nova vocação.
A rapaziada técnica da Petrobras é extremamente competente para fazer dar certo e assim o Brasil volta para a trilha da energia limpa que não deveria ter abandonado, alinhando-se com o mundo e não mais correndo na contramão.
Fernando Meirelles

'Via rápida' para contratação de obras públicas é alvo de críticas, na FSP

Folha de SP| Folha de SP

Sem apresentar resultados efetivos de melhoria nas obras, o governo conseguiu ampliar o uso do Regime Diferenciado de Contratação para quase todas as construções públicas do país.
Emenda incluída em uma medida provisória, que virou lei em novembro, permitiu que prefeituras e Estados também contratem por esse regime. O STF limitou os efeitos da lei às obras de segurança pública, mas essa medida deverá ser revista em breve.
Criado em 2011, o RDC foi sendo ampliado aos poucos, sem estudos mais aprofundados sobre sua efetividade.
Para o governo federal, o modelo —defendido por grandes construtoras— acelerou licitações e obras públicas. Opositores, principalmente empresas de projeto e pequenas e médias construtoras, dizem o oposto.
A grande polêmica do RDC é a possibilidade de a construtora também fazer o projeto da obra, a chamada Contratação Integrada (RDC-CI), proibida pela lei de licitações. Antes, uma empresa fazia o projeto, que é o desenho e a forma de construir, e outra executava a obra. Só a Petrobras tinha permissão de contratar uma só empresa para fazer todo o pacote.
Levantamento da Aneor (Associação Nacional de Empreiteiras de Obras Públicas) nas licitações do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), principal contratador do RDC-CI no governo, mostra que uma de cada três concorrências feitas seguindo esse formato no órgão não termina.
Para o presidente da associação, José Alberto Pereira Ribeiro, a falta de projeto na concorrência (é necessário apenas o chamado anteprojeto) impede que as empresas saibam quanto de fato vai custar a obra e, assim, apresentar um preço.
Nas obras da Copa, o RDC-CI não conseguiu acelerar as obras, como o governo queria. Segundo Sérgio Magalhães, presidente do IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil), o RDC pode até acelerar a disputa, mas a fase de projeto tem que ser feita, e o tempo será o mesmo.
"Para fazer uma casinha de cachorro ou uma usina nuclear, tem que ter projeto", diz Magalhães, ao ressaltar que não há modelo semelhante no mundo de contratação pública nessa forma.
Em trabalho ainda não concluído, o TCU indica que o RDC-CI não ajudou a trazer melhor qualidade e efetividade para as obras públicas. O tribunal é crítico da falta de projeto, apontando o fato como um dos motivos para os bilionários superfaturamentos das refinarias da Petrobras.
EXEMPLO RUIM
Um exemplo de obra com RDC-CI é o VLT de Cuiabá (MT). Em apresentação no CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), o governo de Mato Grosso responsabilizou a falta de projeto pela desastrosa construção, que, se ficar pronta, vai levar três vezes mais tempo e custar o dobro do previsto.
Tarcísio de Freitas, ex-diretor-geral do Dnit e hoje consultor legislativo concursado da Câmara, diz que há exemplos bem-sucedidos de obras do RDC-CI, como o túnel do Morro do Formigão (BR-101/SC), e malsucedidos da lei de licitações, como o viaduto em Belo Horizonte que caiu antes da Copa de 2014.
Para ele, os problemas nas obras licitadas nesse formato não são decorrentes da contratação de projeto e obra juntos, mas da falta de dinheiro e de estrutura dos órgãos públicos para fiscalizar.
OUTRO LADO
Em nota, o Ministério do Planejamento apoia o RDC dizendo que o tempo de início da obra caiu pela metade.
"Os principais estudos demonstram que a Contratação Integrada assegura maior integração entre projeto básico, projeto executivo e execução de obra, garantindo maior celeridade, segurança de prazo e custo", informa a nota, sem apresentar demonstrações de que isso ocorreu.
O debate sobre o RDC-CI se estendeu para a Câmara e o Senado, que trabalham em dois projetos de lei para mudar a legislação de contratação do país. A tentativa é unificar as várias leis em uma só.
No Senado, o projeto tende a limitar o RDC-CI a grandes obras, acima de R$ 500 milhões. Na Câmara, a tentativa é por acabar com o RDC-CI.