segunda-feira, 21 de abril de 2014

Passarela para bicicletas começa a ser montada na Marginal do Pinheiros



Construção da ciclopassarela tem início neste sábado, às 16 horas; pistas serão interditadas pela CET

21 de março de 2014 | 18h 08

Adriana Ferraz - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Começa a ser instalada neste sábado, 22, uma passarela feita exclusivamente para ciclistas na Marginal do Pinheiros, zona sul da capital. Estão previstas interdições na altura da Ponte Cidade Jardim, sentido Castelo Branco, a partir das 16 horas. A ciclopassarela ligará o Parque do Povo à ciclovia existente nas margens do Rio Pinheiros, em paralelo aos trilhos da CPTM. A previsão é que o acesso passe a funcionar no fim de abril.
A obra faz parte do pacote de contrapartidas determinado na gestão Gilberto Kassab (PSD) para amenizar os impactos provocados pelo Complexo WTorre JK. Erguido no quadrilátero formado pelas Avenidas Presidente Juscelino Kubitschek, Chedid Jafet e a marginal, o conjunto comercial inclui torres de escritórios, o Shopping JK Iguatemi e o futuro teatro JK, em construção no prédio que abrigava a Daslu.
Com 180 metros de extensão, estrutura metálica e laje em concreto, a ciclopassarela terá um vão livre de 50 metros sob as pistas da Marginal do Pinheiros. O método construtivo de viga pré-moldada visa a provocar menos interdições no tráfego e o visual moderno segue o estilo adotado no viaduto construído ao lado pela WTorre como condição para a abertura do Shopping JK, em 2012.
"Será uma intervenção quase que cirúrgica. Com as peças principais montadas, começaremos a fazer os acabamentos para concluir a entrega por volta do dia 28 de abril", disse o superintendente da WTorre, Francisco Caçador. Para proporcionar maior segurança aos ciclistas e motoristas que passam pela região, um guarda corpo em aço, com placas de acrílico de 20 mm de espessura, envolverá toda a estrutura.
Com a obra pronta, quem utiliza a ciclovia da CPTM ganhará mais um acesso, que poderá ser feito diretamente pelo Parque do Povo. Hoje, existem cinco entradas. De acordo com a companhia, o movimento diário na via durante a semana é de 600 ciclistas, número que salta para 4 mil nos fins de semana. O horário de funcionamento ainda não está definido, mas deve seguir as regras de uso da ciclovia da CPTM, aberta diariamente das 5h às 19h30. A via tem 21,5 km.

Letra fria ( pauta nalini)

THIAGO DOS SANTOS ACCA, (, THIAGO DOS SANTOS ACCA É DOUTOR PELA , FACULDADE DE DIREITO DA USP, PESQUISADOR DO CENTRO DE PESQUISA JURÍDICA APLICADA (CPJA) DA DIREITO GV EM SÃO PAULO - O Estado de S.Paulo
Quando uma demanda é levada ao Poder Judiciário, o que a sociedade espera dele? O que se deseja é uma decisão célere que, sobretudo, não apenas encerre o processo, mas que pela garantia de direitos ponha fim ao conflito.
Os recentes casos de reintegração de posse mostram justamente o contrário, ou seja, que o Judiciário está contribuindo para a intensificação desses conflitos. A ordem de desocupação em áreas como o Pinheirinho (cumprida em 22 de janeiro de 2012 em São José dos Campos), abaixo da Ponte Estaiadinha (cumprida em 16 de novembro de 2013 em São Paulo) e, mais recentemente, o prédio da Oi (cumprida em 11 de abril de 2014 no Rio de Janeiro) é concretizada sem que circunstâncias relevantes sejam devidamente consideradas, bem como ignorando parte substancial das normas jurídicas existentes. O Judiciário analisa o conflito exclusivamente pela ótica da garantia da posse e propriedade e com isso deixa de oferecer uma solução adequada para as partes envolvidas.
Certamente, os problemas dos centros urbanos como falta de moradia e precariedade de infraestrutura nos impõem dificuldades que não podem ser superadas exclusivamente pelo direito. Por outro lado, a complexidade do tema não minimiza a importância de se discutir o papel a ser desempenhando pelo Judiciário quando se trata da atribuição de sentido ao direito à moradia e à função social da propriedade e de como implementá-los. Essa relevância existe até mesmo porque outros casos semelhantes voltarão a cena. As ocupações residem em um problema estrutural e não conjuntural. Em pesquisa realizada pelo Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada CPJA) verificou-se, com base na análise de ações reivindicatórias, que 38% dos conflitos ocorrem em razão de ocupações de casas ou terrenos. Há, de um lado, muitos imóveis que não cumprem sua função social e, de outro, famílias que não gozam de uma habitação digna.
Em casos como os mencionados acima é preciso investigar se o imóvel cumpria sua função social ou estava abandonado e se as pessoas que o ocuparam faziam jus a uma política de moradia. Diante da complexidade fática e jurídica, o que faz o Judiciário? As carências sociais são lidas por um registro jurídico equivocado, o que o leva a envidar por um caminho em que, em última instância, tudo acaba por ser resolvido como "caso de polícia". Assim, há uma solução a curtíssimo prazo, porém essas famílias continuam sem moradia e permanecem à margem da sociedade. Nos casos do Pinheirinho e da Ponte Estaiadinha, as famílias foram simplesmente deslocadas das áreas, mas muitos, por não terem para onde ir, voltaram às ruas. Ora, o Judiciário deveria se preocupar com as consequências de sua decisão e o destino dessas famílias, já que seu dever é solucionar o caso e não simplesmente pôr fim ao processo. Provavelmente, destino semelhante será selado para as famílias que foram desalojadas do prédio da OI.
O Judiciário pronuncia uma decisão, contudo não é capaz de funcionar como uma instituição que auxilie na resolução efetiva do conflito. O caso Pinheirinho é um exemplo disso. Em primeiro lugar, a decisão colocou em contraposição o direito à moradia e o de propriedade de um modo irreconciliável ao afirmar que os esbulhadores "querem ver declarado (seu direito de moradia) às custas da propriedade particular da autora". Sem dúvida, em virtude da garantia do direito de propriedade não se está a esperar que as pessoas ocupem imóveis e vejam, com base na força, seu direito de moradia contemplado. Entretanto, o direito à moradia impõe que o conflito seja visto em outros moldes, como, por exemplo, atribuindo ao Judiciário o dever de tentar uma conciliação inclusive com a participação de órgãos políticos. A própria decisão admite haver um projeto de lei que pretendia desapropriar a área. Por que, então, não ouvir o município para uma tentativa de solucionar o problema? Em segundo lugar, havia um protocolo de intenções assinado por diversos atores políticos com o objetivo de regularizar a situação dos moradores e, assim, atender aos interesses do proprietário e dos ocupantes. Entretanto, tal protocolo foi ignorado pelo Judiciário, que não suspendeu a ordem de reintegração e com isso deixou de dar oportunidade para que houvesse uma conciliação.
A resolução do conflito jurídico com base exclusiva em uma leitura voltada para posse e propriedade e desconsiderando as peculiaridades dos fatos mostra-se não apenas deficiente do ponto de vista social, ao intensificar as possibilidades de violência, mas também jurídico. Ao se fortalecer esse viés privatista do sistema jurídico brasileiro em detrimento de normas constitucionais como o direito à moradia, as decisões de reintegração de posse tornam-se criticáveis não por parâmetros estruturados em torno de um ideal de justiça, mas por não levar em conta o ponto de partida básico em qualquer decisão: os fatos, o direito e sua necessidade de trazer paz social.
No domingo passado, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB-RJ) afirmou que cobrará a Oi pelos gastos com a desocupação do prédio da companhia no Engenho Novo, zona norte do Rio. Marcada por confrontos, a ação da PM e do Bope deixou 5 mil desalojados.

Humanos de gaveta


20 de abril de 2014 | 2h 10
JOSÉ DE SOUZA MARTINS, JOSÉ DE SOUZA MARTINS É SOCIÓLOGO. , PROFESSOR EMÉRITO DA FACULDADE DE , FILOSOFIA DA USP, AUTOR, ENTRE OUTROS , LIVROS, DE A SOCIABILIDADE DO HOMEM , SIMPLES (CONTEXTO) - O Estado de S.Paulo
De quem é a perna? E o braço? E aquela orelha ali? E aquela mão? E os 40 cadáveres de bebês depositados na morgue do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro? Uma inspeção para localizar o cadáver de um bebê ali nascido em 2012, filho de uma toxicodependente, levou a uma verdadeira jazida de cadáveres de bebês, de fetos e de pedaços de corpos humanos amontoados em gavetas do necrotério. Alguns ali havia quatro anos, 15 bebês não identificados. Um verdadeiro documento antropológico sobre a banalização da morte, contrapartida da banalização da vida.

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Evidências dessas banalizações surgem em diferentes pontos do País, de diferentes modos. É o caso do menino Bernardo, em Três Passos, Rio Grande do Sul, que teria sido sedado e morto com uma injeção, supostamente por pessoas que lhe eram muito próximas. Depois, sepultado em cova rasa, na mata e na beira de um rio. A história do menino é uma dolorosa história de descarte, de seres humanos reduzidos a coisa. Recém-nascidos abandonados no lixo pelas próprias mães. Adultos tratados como dejetos. Filhos que matam pais, pais que matam filhos. O crescente número de casos de nulificação absoluta de seres humanos no Brasil choca um pouco nos poucos minutos do noticiário do rádio e da TV. Depois, já é a notícia seguinte, a vítima seguinte, o esquecimento.
Essas ocorrências são sociologicamente preocupantes porque expressam uma problemática degradação da condição humana, a deterioração de valores fundamentais na organização desta sociedade. Há meio século a morte não comportava abandonos nem mesmo nos grandes centros urbanos, onde a secularização crescente suprime as referências de respeito pelo tenebroso transe, o momento da morte, os cuidados rituais com o morto. Em muitas regiões do interior do Brasil, a atitude em relação à morte e ao corpo do morto ainda está referida às alegorias barrocas que dão sentido ao morrer e confortam os vivos, tanto no sentido de pertencimento que enunciam e na responsabilidade dos vivos pelos mortos quanto pela certeza de que os mortos partem ficando na memória e nos sentimentos. Os cemitérios ainda estão povoados de túmulos em que a palavra "saudade" reafirma a morte como perda, não como descarte.
O caso dos bebês do Pedro Ernesto fala de mortos abandonados, de crianças sem infância, mas também sem morte. Porque em nossa tradição cultural a morte não é apenas e tão somente a cessação dos batimentos cardíacos e o fim dos sinais vitais. Em nossa tradição, o morrer começa afetiva e ritualmente muito antes da morte, nas providências de reconhecimento do fim próximo de alguém que é membro do todo, quando a certeza de pertencimento se afirma, quando o grupo de referência se revitaliza numa provisória ruptura do cotidiano. Entre nós, a morte não é a cessação, é a transformação. A morte não é do morto. Existe entre nós a expressão "dono do morto", nome daqueles que decidem por ele os ritos da passagem, o funeral e a própria constituição de sua memória, a figuração simbólica da natureza imperecível e transcendente de cada um.
A privação de ritos é, em nossa cultura funerária, a máxima condenação que se pode impor a alguém. O Brasil tem hoje mais de um linchamento por dia. No caso dos que morrem nesses atos violentos, a vítima é sempre privada de qualquer assistência de natureza religiosa ou ritual. Em São Paulo, há alguns anos, na região da Sé, um senhor que tentou acender uma vela para colocar na mão de um linchado quase foi linchado também. Essa morte de privações rituais é fundamentalmente uma condenação à perdição eterna das trevas, a incapacitação do morto para o retorno da ressurreição no dia do Juízo. Isso não é necessariamente religião: é componente de uma cultura popular. É cultura que alcança até mesmo quem não tem religião. Basta observar como os caixões de defunto são retirados dos recintos do velório: sempre com os pés para fora, o contrário da posição de nascimento, um ritual de expulsão do morto do convívio dos vivos. Algo que nos vem dos gregos. No sertão de Santa Catarina conheci uma senhora que me explicava a importância da posição de saída do morto de casa não só com os pés virados para fora, mas virados para a direção da correnteza do rio mais próximo. Resíduo do mito de Caronte que transportava os mortos, pelos Rios Estiges e Aqueronte, para o Hades, as profundezas.
Os bebês e os pedaços de gente encontrados no hospital são seres que foram privados de um direito nessa cultura contido, o direito à integridade de suas pessoas, como corpo e como alma, como unidade de matéria e espírito. Bebês, sobretudo, eram, nos cemitérios brasileiros, até não faz muito tempo, sepultados nas chamadas quadras dos anjos pequenos, para que não fossem contaminados pela promiscuidade daqueles que haviam conhecido o pecado. Nas gavetas do necrotério do hospital foram encontrados mais do que cadáveres abandonados - foi encontrado o espírito moribundo do nosso ser coletivo.
Divulgada no domingo passado, uma investigação do Juizado da Infância e da Juventude descobriu 40 corpos de recém-nascidos "esquecidos" no necrotério do Hospital Universitário Pedro Ernesto, no Rio. Entre os abandonados, 15 não tinham nenhuma identificação.