terça-feira, 6 de outubro de 2009
O papel pode morrer; a leitura, não
Nunca se produziram tantos livros no mundo. O maior sucesso recente da literatura mundial foi uma série de romances juvenis, Harry Potter, cujos volumes têm mais de 700 páginas cada um. O índice de leitura no Brasil aumenta ano a ano. O melhor livro de ficção nacional do último decênio, Dois Irmãos, de Milton Hatoum (2000), já soma cem mil exemplares vendidos; é um sucesso de crítica e público. Feiras literárias como a de Paraty unem grandes autores em salas lotadas. Imprensa? As duas mais sofisticadas revistas de língua inglesa, The Economist e The New Yorker, que se caracterizam pelos textos extensos e análises críticas, hoje têm a maior circulação de sua história: mais de 1 milhão de exemplares cada uma. No Brasil, nunca se falou tanto em jornalismo literário, nome de uma coleção de livros (que teve títulos como A Sangue Frio, de Truman Capote, e Hiroshima, de John Hersey, na lista dos mais vendidos em não-ficção), e nunca se tentou praticá-lo tanto. Entre os estudantes, o jornalismo cultural passou a ser o mais procurado, em vez do político e do econômico.
Quem diz que textos em papel estão morrendo, portanto, está desdenhando fatos. Se há uma queda geral no nível cultural, se hoje vemos até pessoas das artes e das idéias com formação geral deficiente, não é por causa de alguma incompatibilidade fundamental entre o homem contemporâneo e a superfície impressa. O que há é uma perda do valor desse conceito, “formação”, num mundo tão bombardeado de informações e de tantas horas perdidas em trânsito, distração e consumismo. Pois quem deseja tomar contato com o que se escreveu de melhor no passado tem ampla oferta de produtos e eventos. Editoras como Cosac Naify, Companhia das Letras, 34 e L&PM têm feito ótimo trabalho de reedições e novas traduções de clássicos, inclusive com vendas em bancas de jornal a menos de R$ 10 o exemplar. Assim como CDs, DVDs e os sites com vídeos e áudios, o acervo de textos antigos é hoje maior do que já foi em qualquer era anterior; temos Shakespeare a um clique no mundo todo.
Sim, a circulação de jornais tem caído nos últimos anos, sobretudo nos países ricos, como EUA, e boa parte disso pode ser atribuída à concorrência de outros meios de comunicação; a televisão, por sinal, está tão preocupada com a internet quanto a imprensa escrita. Para o sujeito que trabalha e tem família, há uma sensação de que está informado ao longo do dia: escuta rádio no caminho, fica diante do computador o dia inteiro, há TVs com canais de notícia 24h em todos os lugares, volta para casa e ainda consome mais jornalismo até pelo celular. Como não querer que nesse mundo pulverizado o jornal diário em papel não perca espaço? Isso, porém, não significa que ele não vá continuar a ser lido por uma minoria, ainda que em suporte digital (em aparelhos como o Kindle, que foi redesenhado justamente para baixar jornais), nem que a leitura de livros e revistas vá deixar de ser um hábito distintivo do Homo sapiens. Na convergência de mídias, nada elimina o que houve antes: apenas absorve e transforma – e, se a humanidade quiser, pode até ser para melhor.
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Sem aterros, SP planeja incinerar lixo
O governo de São Paulo está na fase final da elaboração de um plano para a construção de grandes usinas de incineração de lixo para colocar fim à falta de locais para aterros nas regiões metropolitanas e no litoral norte do Estado. Os estudos são feitos pela Emae -empresa estadual para a geração de energia - e começaram em 2004. A Emae negocia as usinas com as prefeituras. A ideia é implantar a primeira usina em dois anos.
O plano da Emae é utilizar o lixo queimado para a geração de vapor e energia elétrica, subprodutos que podem bancar quase todo custo da operação, diz o diretor de geração da Emae, Antonio Bolognesi. Polêmica, a incineração de resíduos urbanos foi combatida por décadas por ambientalistas devido à emissão de poluentes altamente nocivos à saúde.
O secretário do Verde e Meio Ambiente da cidade de São Paulo, Eduardo Jorge, é um dos críticos da incineração. "Essas usinas de incineração produzem dioxinas e furanos, substâncias que provocam câncer nas pessoas. Eles (os fabricantes das usinas) ainda precisam provar que o filtro que colocam é seguro", afirma. Os resíduos resultantes da queima também são considerados um problema ambiental, mas, segundo a Emae, o processo a ser adotado em São Paulo transforma esses restos em material inerte e próprio para a fabricação de blocos para serem usados na construção civil.
O assunto é tão recente no Estado que a Secretaria do Meio Ambiente ainda está elaborando uma resolução com parâmetros de emissão de gases, que são necessários para o licenciamento das usinas. "Pensamos o projeto não só como usina de geração de energia, mas o objetivo é colaborar para resolver o problema do lixo no Estado", diz Bolognesi.
Há hoje um processo se esgotamento dos aterros sanitários licenciados no Estado. No litoral norte, as prefeituras chegam a transportar o lixo por até 120 km para aterros em Santa Isabel (Grande SP) e Tremembé (Vale do Paraíba). Em São Paulo, o aterro Bandeirantes está esgotado e o São João recebe só 10% do lixo-a maior parte dos resíduos vai para aterros em Caieiras e Guarulhos, apesar de lei municipal determinar que o depósito seja feito na própria cidade.
A Folha conversou com técnicos da Cetesb que defendem a implantação do método de incineração. O investimento, porém, é alto. Para queimar mil toneladas por dia - produção média de 1 milhão de pessoas no Brasil- uma usina custaria cerca de R$ 250 milhões. São Paulo produz cerca de 15 mil toneladas por dia, incluindo entulho de construção civil, lixo industrial e comercial e varrição de ruas. A Emae já orçou uma usina com capacidade para 600 toneladas/dia por R$ 200 milhões.
Concorrência - As usinas de lixo já têm hoje, de acordo com a Emae, capacidade para concorrer em custos com a energia eólica, considerada a forma mais limpa. André Vilhena, engenheiro químico e diretor-executivo do Cempre (Compromisso Empresarial para a Reciclagem), disse que a incineração tem baixo impacto poluente. "A tecnologia de incineração já é comprovadamente adequada. É muito usada na Europa e no Japão, por exemplo. Eles não iriam adotar a tecnologia se causasse câncer", afirmou.
O governo pretende, primeiro, buscar agregar essas usinas aos polos petroquímicos -como os de Mauá, Cubatão e Paulínia-, que têm forte demanda por energia elétrica e vapor. Isso porque essas regiões, além da concentração industrial, têm capacidade para produzir mais de 150 toneladas diárias, volume considerado mínimo para um projeto desse porte ser considerado economicamente viável.
Bolognesi diz que as conversão estão avançadas com a Prefeitura de São Paulo.
Outra empresa do Estado, a Sabesp, que neste ano começou a atuar em serviços de lixo para prefeituras, se interessa pelo projeto, segundo seu diretor de Sistemas Regionais, Humberto Semeghini.
A principal referência do governo do Estado no projeto de incineração de lixo é a região da Baviera, na Alemanha. Lá, segundo um técnico da Cetesb, 60% do lixo é reciclado e 40%, enviado para incineração, justamente os materiais com maior poder de combustão. (Fonte: Folha de S. Paulo)
sábado, 12 de setembro de 2009
IMPRENSA INDEPENDENTE????
Luiz Gonzaga Belluzzo 03/09/2009 16:50:25
Eu estava na ante-sala de uma médica, em Salvador. Sábado, dia 29 de agosto. E apenas por essa contingência, dei-me de cara com uma chamada de primeira página - uma manchetinha - da revista Época, já antiga, de março deste ano de 2009: A moda de pegar rico - as prisões da dona da Daslu e dos diretores da Camargo Corrêa.
Alguém já imaginou uma manchete diferente, e verdadeira como por exemplo, A moda de prender pobres? Ou A moda de prender negros? Não, mas aí não. A revolta é porque se prende rico. Rico, mesmo que cometendo crimes, não deveria ser preso.
Lembro isso apenas para acentuar aquilo que poderíamos denominar de espírito de classe da maioria da imprensa brasileira. Ela não se acomoda - isso é preciso registrar. Não se acomoda na sua militância a favor de privilégios para os mais ricos. E não cansa de defender o seu projeto de Brasil sempre a favor dos privilegiados e a favor da volta das políticas neoliberais. Tenho dito com certa insistência que a imprensa brasileira tem partido, tem lado, tem programa para o País.
E, como todos sabem, não é o partido do povo brasileiro. Ela não toma partido a favor de quaisquer projetos que beneficiem as maiorias, as multidões. Seus olhos estão permanentemente voltados para os privilegiados.
Não trai o seu espírito de classe. Isso vem a propósito do esforço sobre-humano que a parcela dominante de nossa mídia vem fazendo recentemente para criar escândalos políticos. E essa pretensão, esse esforço não vem ao acaso. Não decorre de fatos jornalísticos que o justifiquem.
Descobriram Sarney agora. Deu trabalho, uma trabalheira danada. A mídia brasileira não o conhecia após umas cinco décadas de presença dele na vida política do país. Só passou a conhecê-lo quando se fazia necessário conturbar a vida do presidente da República. O ódio da parcela dominante de nossa mídia por Lula é impressionante. Já que não era possível atacá-lo de frente, já que a popularidade e credibilidade
Não, não se queira inocência na mídia brasileira. Ninguém pode aceitar que a mídia brasileira descobriu Sarney agora. Já o conhecia de sobra, de cor e salteado. Não houve furo jornalístico, grandes descobertas, nada disso. Tratava-se de cumprir uma tarefa política. Não se diga, porque impossível de provar, ter havido alguma articulação entre a oposição e parte da mídia para essa empreitada. Talvez a mídia tenha simplesmente cumprido o seu tradicional papel golpista.
Houvesse a pretensão de melhorar o Senado, de coibir a confusão entre o público e o privado que ali ocorre, então as coisas não deviam se dirigir apenas ao político maranhense, mas à maior parte da instituição. Só de raspão chegou-se a outros senadores. Nisso, e me limito a apenas isso, o senador Sarney tem razão: foi atacado agora porque é aliado de Lula. Com isso, não se apagam os eventuais erros ou problemas de Sarney. Explica-se, no entanto, a natureza da empreitada da mídia.
A mídia podia se debruçar com mais cuidado sobre a biografia dos
acusadores. Se fizesse isso, se houvesse interesse nisso, seguramente encontra
Do Sarney a Lina Vieira. Impressionante como a mídia não se respeita.
E como pretende pautar uma oposição sem rumo. É inacreditável que possamos nós estarmos envolvidos num autêntico disse-me-disse quase novelesco, o país voltado para saber se houve ou não houve uma ida ao Palácio do Planalto. Não estamos diante de qualquer escândalo. Afinal, até a senhora Lina Vieira disse que, no seu hipotético encontro com Dilma, não houve qualquer pressão para arquivar qualquer processo da família Sarney - e esta seria a manchete correta do dia seguinte à ida dela ao Senado. Mas não foi, naturalmente.
Querem, e apenas isso, tachar a ministra Dilma de mentirosa. Este é objetivo. Sabem que não a pegam em qualquer deslize. Sabem da
integridade da ministra. É preciso colocar algum defeito nela. Não
importa que tenham falsificado currículos policiais dela,
vergonhosamente. Tudo isso é aceitável pela mídia. Os fins, para ela, justificam os meios.
Será que a mídia vai atrás da notícia de que Alexandre Firmino de Melo Filho é marido de Lina? Será? Eu nem acredito. E será, ainda, que ele foi mesmo ministro interino de Integração Nacional de Fernando Henrique Cardoso, entre agosto de 1999 e julho de 2000? Era ele que cochichava aos ouvidos dela quando do depoimento no Senado? Se tudo isso for verdade, não fica tudo muito claro sobre o porquê de toda a movimentação política de dona Lina? Sei não, debaixo desse angu tem carne?
Mas, há, ainda, a CPI da Petrobras que, como se imaginava, está quase morrendo de inanição. Os tucanos não se conformam, E nem a mídia. Como é que a empresa tornou-se uma das gigantes do petróleo no mundo, especialmente agora sob o governo Lula e sob a direção de um baiano, o economista José Sérgio Gabrielli de Azevedo? Nós, os tucanos, pensam eles, fizemos das tripas coração para privatizá-la e torná-la mais eficiente, e os petistas mostram eficiência e ainda por cima descobrem o pré-sal. É demais para os tucanos e para a mídia, que contracenou alegremente com a farra das privatizações do tucanato.
Acompanho o ditado popular ?jabuti não sobe em árvore?. A CPI da Petrobras não surge apenas como elemento voltado para conturbar o processo das eleições. Inegavelmente isso conta. Mas o principal são os interesses profundos em torno do pré-sal. Foi isso ser anunciado com mais clareza e especialmente anunciada a pretensão do governo de construir um novo marco regulatório para gerir essa gigantesca reserva de petróleo, e veio então a idéia da CPI, entusiasticamente abraçada pela nossa mídia. Não importa que não houvesse qualquer fato determinado. Importava era colocá-la em marcha.
Curioso observar que a crise gestada pela mídia com a tríade
Sarney-Lina- Petrobras, surge precisamente no mesmo período daquela que explodiu em 2005. Eleições e mídia, tudo a ver. Por tudo isso é que digo que a mídia constitui-se num partido. Nos últimos anos, ela tem se comportado como a pauteira da oposição, que decididamente anda perdida. A mídia sempre alerta a oposição, dá palavras-de- ordem, tenta corrigir rumos.
De raspão, passo por Marina Silva. Ela sempre foi duramente atacada pela mídia enquanto estava no governo Lula. Sempre considerada um entrave ao desenvolvimento, ao progresso quando defendia e conseguia levar adiante suas políticas de desenvolvimento sustentável. De repente, os colunistas mais conservadores, as revistas mais reacionárias, passam a endeusá-la pelo simples fato de que ela saiu do PT. É a mídia e sua intervenção política. Marina, no entanto, para deixar claro, não tem nada com isso. Creio em suas intenções de intervenção política séria, fora do PT. Neste, teve uma excelente escola, que ela não nega.
Por tudo isso, considero essencial a realização da I Conferência
Nacional de Comunicação. Por tudo isso, tenho defendido com
insistência a necessidade de uma nova Lei de Imprensa. Por tudo isso, em defesa da sociedade, tenho defendido que volte a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista. Por tudo isso, tenho dito que a democratização profunda da sociedade brasileira depende da democratização da mídia, de sua regulamentação, de seu controle social. Ela não pode continuar como um cavalo desembestado, sem qualquer compromisso com os fatos, sem qualquer compromisso com os interesses das maiorias no Brasil.