terça-feira, 25 de junho de 2024

Queremos diálogo mais fluido e organizado com Haddad, diz presidente do Grupo FarmaBrasil, FSP

 

BRASÍLIA

Após a rejeição da MP (medida provisória) que alterava as regras de compensação de créditos do PIS/Cofins, o presidente do Grupo FarmaBrasil, Reginaldo Arcuri, defende em entrevista à Folha que o governo crie um canal de diálogo estruturado, fluido e organizado com o setor produtivo para discutir o equilíbrio do Orçamento e o corte de gastos.

"Não há nada que substitua o diálogo", diz. O grupo representa a indústria farmacêutica de pesquisa e de capital nacional. O executivo afirma que o setor gostaria de ter esse canal diálogo com o ministro Fernando Haddad (Fazenda).

"Uma coisa é você receber o setor privado, produtivo, a indústria, ou o agro e tal, para tratar de um problema ou o setor levar uma sugestão. Outra coisa é você ter um mecanismo, de tanto em tanto tempo, para sentar e discutir organizadamente, por exemplo, o Orçamento fiscal da União", sugere.

retrato colorido com homem de terno e gravata, calvo de óculos e barba.
Presidente do Grupo FarmaBrasil, Reginaldo Arcuri - Keiny Andrade - 22.fev.2010/Folhapress

Arcuri avalia ser muito complicado alterar os pisos constitucionais da saúde e da educação, algo estudado no governo. "É possível trabalhar tentando achar a melhor solução, desde que você não rompa o princípio constitucional: todos os brasileiros têm direito a uma saúde pública universal e gratuita", ressalta.

Qual o impacto da rejeição da MP do PIS/Cofins?
É meio uma obviedade, mas é necessário se repetir sempre. Não há nada que substitua o diálogo. Ainda mais quando se trata de questões que afetam o conjunto da estrutura do país. É claro que tem todo o processo vinculado à manutenção da higidez fiscal, mas por outro lado não se consegue gerar tributos se não tiver o setor produtivo produzindo. É necessário ter um diálogo muito maior. Não é que não haja, pelo menos que eu saiba. É muito mais uma questão, primeiro, de método e, segundo, de constância.

É o caso da MP do PIS/Cofins?
Essa MP atingia as empresas do setor farmacêutico de maneira diferente, dependendo do modelo de negócio de cada uma. Por causa disso, tudo depende de um diálogo permanente e estruturado. Tem que descer a detalhes para saber se o que está se pretendendo arrecadar tem correspondência com as possibilidades do setor privado.

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Como fazer isso?
O governo tem que estruturar um pouco melhor isso. Por isso, digo que tem que ter método. Tá bom, precisamos fazer modificações na circunstância fiscal do país, sempre buscando equilíbrio. Mas há várias formas de você buscar equilíbrio. É sempre um equilíbrio dinâmico.

Como é que compatibiliza a busca desse equilíbrio dinâmico com o diálogo?
Tem que ter sistemas para fazer isso. Mas essa parte fiscal, eu acho que tinha que ter uma outra estrutura. Temos as confederações nacionais, que aliás foram as que atuaram no caso da MP 1227 [para a rejeição]. A CNI [Confederação Nacional da Indústria] se articulou com a CNA [da Agricultura] e a CNC [do Comércio], inclusive, o Alban [Ricardo Alban, presidente da CNI] foi conversar direto com o presidente Lula. Repito, tem que ter uma coisa mais formal, mais estruturada. Essas são as formas que o setor privado se organiza para ser representado. O governo tem que ter uma coisa equivalente a isso.

Um canal melhor de diálogo?
Mais fluido e organizado. Vamos discutir o equilíbrio do Orçamento? Perfeitamente. E quais são as bases? Quais são os números do governo? Quais são as propostas? Como é que articula isso com o setor privado? É possível fazer? De que forma?

Empresários argumentam que a equipe do ministro Haddad não tem o mesmo canal de diálogo que tem com o mercado financeiro. Por que o senhor acha que isso acontece?
Não posso responder por ele. Gostaríamos de ter um canal. Uma coisa é você receber o setor privado, produtivo, a indústria ou o agro para tratar de um problema ou o setor vai levar uma sugestão. Outra, é você ter um mecanismo, de tanto em tanto tempo, para sentar e discutir organizadamente. Por exemplo, o Orçamento fiscal da União.

Mas o setor produtivo quer discutir as questões fiscais?
Tudo. Questões fiscais tanto de aumento de arrecadação, quanto de cortes, e a discussão da alocação dos recursos. Qual é o problema? Nenhum. Não vai ter que discutir uma hora? Seja diretamente ou via Legislativo. Se o diálogo vai existir, é muito melhor organizar isso, sistematizar, para ter soluções melhores e mais consistentes.

O sr. observa na política econômica um certo esgotamento da agenda de aumento de arrecadação? Calcula-se que o governo precisará de pelo menos R$ 50 bilhões de receitas para o Orçamento de 2025.
O que se esgarçou não foi a ideia de discutir aumento de arrecadação, alocação de recursos, corte de gastos. O que se esgarçou foi, exatamente, mandar coisas para que isso aconteça sem diálogo. Não há disposição de simplesmente aceitar qualquer coisa sem que haja uma discussão prévia muito mais densa.

Mas em matéria tributária, não dá para o governo antecipar que vai ter uma medida de aumento da carga tributária. As empresas se movimentam para barrar. Foi o caso do aumento do IPI de cigarros…
Não acho que seja assim. O que não pode anunciar é câmbio. Isso realmente não tem jeito, dizer ‘vou mexer no câmbio'. Mas as outras coisas, não há nenhum problema maior. Essa coisa ‘ah, as pessoas foram lá defender os seus interesses’, vão defender antes, durante e depois que as medidas forem exaradas.

Dá para voltar com a MP sobre novas bases?
Não me arrisco a dizer isso. É muito difícil para eu fazer uma afirmativa tão forte assim.

O presidente Lula também estava meio afastado do diálogo com o setor produtivo? Ele não viu o alcance da MP?
Não posso arriscar uma opinião sobre o que ele achou ou não achou. Mas é fundamental o presidente estar acompanhando permanentemente, não episodicamente.

O presidente da CNI em entrevista recente à Folha alertou sobre o risco de retirada de benefícios para a indústria e já disse que faltava diálogo da equipe econômica com o setor produtivo.
O meu ponto de vista é que não falta necessariamente comunicação em termos quantitativos: ‘Ah, quantas vezes recebeu?’. É qualitativo. Tudo tem que ser avaliado e verificado, se os objetivos estão sendo alcançados. Agora, a ideia de fazer alguns ajustes fiscais para que determinados setores da economia, da indústria, do agro, tenham uma resposta mais rápida, é a base do que qualquer sociedade precisa.

Qual é o problema, então?
Como equilibrar. No setor farmacêutico, estamos precisando muito que a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] funcione. Precisamos de um pouco mais de gente. Para ela funcionar a todo vapor, precisa mais. Vamos dizer que fosse um pouco mais de 100, 200 funcionários, mas também precisa de uns R$ 30 milhões a R$ 50 milhões para a estrutura de TI da Anvisa.

Qual o risco para o setor?
Fizemos a conta de quantos medicamentos entraram [em pedidos à Anvisa] e estão parados. Dá R$ 17 bilhões parados dentro da Anvisa.

O sr. está dizendo que não basta cortar gastos porque pode estrangular órgãos como a Anvisa?Exatamente.

Como avalia a proposta de mudar o piso da saúde e educação?
É muito complicado. Que tem que aprimorar a gestão, sim. Um país como o Brasil, com 210 milhões de pessoas, tem que ter uma ancoragem para a saúde e educação muito firmes. É muito difícil você dizer simplesmente que vai desvincular sem uma análise muito complexa, que tem que ser feita com muita calma. Agora, é possível trabalhar tentando achar a melhor solução, desde que você não rompa o princípio constitucional: todos os brasileiros têm direito a uma saúde pública universal e gratuita.

Como viu a decisão do Banco Central de interromper a queda dos juros?
Embora eu entenda o papel institucional do BC como guardião da meta de inflação, é muito frustrante para o setor produtivo o fim do ciclo de queda.


RAIO X
Reginaldo Arcuri, 69
É desde 2011 presidente-executivo do Grupo FarmaBrasil, associação da indústria farmacêutica de pesquisa e de capital nacional, que reúne as empresas Aché, Althaia, Apsen, Biolab, Biomm, Bionovis, Blanver, EMS, Eurofarma, Hebron, Hypera Farma, Libbs e ReceptaBio. Foi presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) de 2007 a 2011.

Ex-Rota indicado a vice de Nunes reage a fogo amigo e diz que imagem negativa com pobres é narrativa, FSP

 24.jun.2024 às 18h58

SÃO PAULO

Três dias após ser anunciado para a vice da chapa de Ricardo Nunes (MDB) nas eleições de 2024, o ex-comandante da Rota Ricardo Mello Araújo (PL) buscou rebater nesta segunda-feira (24) fogo amigo que o acusa de dificultar a campanha à reeleição do prefeito de São Paulo na periferia.

Postagem de Mello Araújo resgata uma ação social feita por ele quando estava à frente da Ceagesp, durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), e se refere ao que chama de narrativas.

"Vamos lembrar, principalmente para aqueles que falam que tenho problemas com a população mais carente, para aqueles que criam narrativas", escreveu.

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O prefeito Ricardo Nunes com o indicado a vice, Ricardo Mello Araújo - Rafaela Araújo - 14.jun.24/Folhapress

No vídeo, uma mulher agradece a Mello Araújo pela entrega de alimentos para uma comunidade que sofreu um incêndio, em Ermelino Matarazzo, periferia da zona leste de São Paulo.

"Agradeço ao presidente Bolsonaro, à família Ceagesp, aos permissionários em uma época em que fazíamos a diferença em nosso país. Fizemos diversas ações como esta, sempre visando ajudar ao próximo", acrescentou o policial.

Um seguidor respondeu à postagem: "O sistema não quer o senhor como vice-prefeito, se mantenha forte e resiliente!".

As críticas ao policial da reserva partem de aliados de Nunes que, nos bastidores, levantam frase sobre abordagens na periferia e sua passagem pelo batalhão policial conhecido pela letalidade como fatores que podem respingar na imagem do prefeito.

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O clima no entorno do pré-candidato à reeleição é de velório diante da indicação do policial militar, visto como alguém que trará mais ônus do que bônus à campanha.

Para alguns, ainda é possível reverter até agosto a escolha, imposta pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, com endosso do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O nome do oficial havia sido levado pelo prefeito no começo do ano, mas a esperança da campanha era escolher um vice mais moderado.

Mello Araújo ganhou força apenas após a entrada do coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa pela Prefeitura de São Paulo, pois, até então, o prefeito havia se mantido como o único candidato associado ao campo da direita. Bolsonaro se manteve irredutível sobre o nome do ex-Rota, e o governador passou a endossar o padrinho político e tomar as rédeas da definição.

A confirmação da indicação a vice ocorreu na última sexta-feira (21), em anúncio feito por Tarcísio, ao lado do prefeito.

A reportagem conversou com diversos integrantes de partidos da coligação que citam, principalmente, um grande receio sobre o impacto da presença do coronel da reserva na periferia. Aliados se preocupam, inclusive, se o crime organizado permitirá que Mello Araújo faça campanha em certos locais dominados pelo tráfico.

Para criticar a chapa, a oposição usará uma declaração de Mello Araújo na qual defendeu a diferença de tratamento em abordagens policiais nos Jardins (área nobre de São Paulo) e na periferia.

"É uma outra realidade. São pessoas diferentes que transitam por lá. A forma dele abordar tem que ser diferente. Se ele [policial] for abordar uma pessoa [na periferia], da mesma forma que ele for abordar uma pessoa aqui nos Jardins [região nobre de São Paulo], ele vai ter dificuldade. Ele não vai ser respeitado", disse o ex-Rota ao UOL em 2017.

Outro receio é que a escolha leve o eleitor a associar a pauta da segurança pública a uma responsabilidade do prefeito, não do governador. Como mostrou o Datafolha, para 23% dos paulistanos, o maior problema da cidade é a segurança. Nunes quer evitar ser fustigado com base no tema.

Em seu primeiro evento público após o anúncio do coronel como seu vice, Nunes ouviu críticas à aliança, segundo a coluna Painel, da Folha.

Ele participou, no sábado (22), de inauguração de um campo de futebol na Vila dos Andrades, na zona norte da capital.

No palco, ao lado de Nunes, Guilherme Corrêa, líder comunitário e membro do movimento Salve Periférico, disse que viu no noticiário que Bolsonaro estava indicando Mello Araújo.

"Nós, que somos favela, não aceitamos mais armas na comunidade. A gente quer livros, Bíblia, pessoas com o olhar social. Favela é tudo menos arma. Favela não tem vagabundo", disse Corrêa.