sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Reutilização de pneus ajuda ambiente e reduz custos da indústria


Edição do dia 01/11/2012 Jornal da Globo
02/11/2012 01h20 - Atualizado em 02/11/2012 01h20


Um dos principais destinos são as usinas para produção de asfalto.
Também usados nas cimenteiras, pneus são ótimos combustíveis.

André TrigueiroSão Paulo, SP
Pneu velho no Brasil, quem diria, passou a ser disputado por importantes setores da economia. No primeiro semestre deste ano, quase 463 mil toneladas de pneus, que seriam descartados como lixo, foram transformados em matéria-prima ou energia.
Um dos principais destinos foram as usinas. Quando entra pneu velho na mistura, o produto final chama-se asfalto borracha. Na armazenagem do cimento asfáltico, a temperatura média da mistura é de 175°C. “É para que ele tenha uma viscosidade adequada, que ele fique semilíquido, para poder envolver os materiais”, afirma Paulo Rosa Machado Filho, assistente de projetos especiais da Ecovias.
Não é um piche convencional, parece um grande pedaço de borracha. É a matéria-prima do asfalto borracha. “Ele não tende a trincar. Demora muito mais psra trincar do que um asfalto que não pode se esticar dessa maneira”, diz Machado Filho.
O piche com pneu velho derretido é misturado com pedras. Da usina, que fica no estado de São Paulo, saem 500 toneladas por dia de asfalto borracha.
Desde o início do funcionamento da usina, há sete anos, já foram produzidas 750 mil toneladas de asfalto borracha. Essa produção assegurou uma destinação inteligente para 400 mil pneus velhos.
“A principal vantagem é a durabilidade, porque nós temos uma expectativa de que seja 40% mais do que o asfalto comum. Além disso, provoca um ruído menor na rodovia, menos spray, que é aquela água que levanta dos pneus quando chove, além do ruído também ser menor. Outra vantagem muito grande é em relação ao tempo de intervenção. Porque, quanto mais você demora para interferir na pista, você está interferindo menos na vida do usuário da rodovia”, explica Machado Filho.
Uma nova geração de asfalto borracha está sendo testada em laboratório. A ideia é reduzir ao máximo o uso de calor na hora de aplicar o asfalto nas rodovias. Com menos calor, utiliza-se menos energia e há menos custos.
A reportagem acompanhou o recapeamento de um trecho do sistema Anchieta-Imigrantes, onde 70% das pistas já foram cobertas com asfalto borracha. Vem aumentando ano a ano a quantidade de trechos cobertos de asfalto borracha no sistema. A meta é que, até 2015, não haja mais asfalto convencional nessas estradas.
São 600 pneus velhos para cada quilômetro de estrada asfaltada. Dá para imaginar quantos pneus seriam necessários para cobrir todos os buracos das estradas brasileiras? Segundo o Ibama, se todos os pneus coletados no primeiro semestre deste ano fossem transformados em asfalto, seria possível pavimentar 34.800 quilômetros de estradas, o equivalente a quase nove vezes a distância que separa São Paulo de Manaus.
Há outras empresas que vem usando ainda mais pneus velhos do que as usinas de asfalto: são as cimenteiras. No Brasil, 64% de todos os pneus coletados têm como destino os fornos das fábricas de cimento.
Para cozinhar a matéria prima a temperaturas que chegam a 1.500°C, é preciso muita energia a um custo cada vez mais alto. A melhor opção é queimar pneu velho. “É importante porque eles deixam de utilizar um combustível fóssil e acabam reutilizando um pneu que, para eles, são entregues a custo zero. Então, tem um valor energético mais baixo, eles ganham um valor energético que eles teriam de comprar”, diz César Faccio, gerente geral da Reciclanip.
Os pneus usados nos fornos das cimenteiras são ótimos combustíveis. Queimam rápido e mantêm a temperatura interna elevada. Ao contrário do asfalto, que só aproveita a borracha do pneu, as cimenteiras aproveitam tudo, inclusive a malha de aço que vem junto com as carcaças.
Em uma cimenteira em Santos, no litoral paulista, 19 milhões de pneus são transformados em energia a cada ano. Existem hoje, no país, 743 pontos de coleta de pneus velhos. Ainda há muito que fazer, mas, desde que o Programa Nacional de Coleta e Destinação de Pneus Inservíveis foi criado há 13 anos, foram retirados da natureza 424 milhões de carcaças. Se esses pneus fossem colocados lado a lado, dariam seis voltas na linha do Equador.
Quem tem carro transporta no mínimo cinco pneus, contando com o estepe. Então, na hora de descartar o pneu velho, pense se você deseja fazer parte do problema ou da solução.
 

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Serra elege postes

Por Sérgio Malbergier
Os políticos costumam ser julgados por suas vitórias eleitorais. Mas, no caso de José Serra, as derrotas são muito mais interessantes. A de 2002, para Lula, marcou a chegada do PT ao poder central no Brasil. A de 2010, para Dilma, renovou o projeto de poder petista e reduziu a oposição ao que ela é hoje. A de 2012, para Haddad, estabeleceu uma cabeça de ponte no coração do poder tucano.
E o que acontece em São Paulo não fica em São Paulo.
A vitória petista na capital do capital foi ainda a melhor notícia que o partido poderia ter depois do julgamento do mensalão, passível de ser embalada como uma resposta dos eleitores da cidade mais inteligente do país aos implacáveis veredictos de corrupção do STF. E uma resposta qualificada, já que a vitória de Haddad é atribuída a Lula, presidente do país na época do mensalão.
Em "Entreatos", o revelador documentário de João Moreira Salles sobre a campanha presidencial de 2002, Lula explica assim sua primeira vitória sobre Serra: "Ninguém tem a base de apoio no Brasil, o alicerce que eu tenho. Tenho grande parte da Igreja Católica, os estudantes, a CUT, é muita coisa, ninguém tem isso, teve isso".
De fato, era uma base impressionante. E ela só cresceu desde então.
Apesar de seu verniz de esquerda, o PT conseguiu espertamente capitalizar os benefícios que o capitalismo trouxe ao país, o último e maior deles, pleno emprego com renda recorde em plena crise global.
Essa emergência de dezenas de milhões de brasileiros ao mercado consumidor é um fenômeno de longa duração com efeitos multidimensionais. O PT é o partido que melhor conseguiu até aqui se atrelar a ele. E assim vai longe.
Haddad, por exemplo, é muito diferente do petista "histórico" que metia medo na antiga classe média conservadora. O futuro prefeito é de classe média alta, empreendedor, descontaminado de ideologias e radicalismos do século passado. Escolhido a dedo e no dedaço por Lula, renova o partido no caminho certo.
Serra, diante dessa avalanche, até que travou um bom combate. Mas ele parece estar com frequência no lugar errado na hora errada. Elegendo os postes de Lula.
Sérgio Malbergier
Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos "Dinheiro" (2004-2010) e "Mundo" (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve às quintas no site da Folha.

Quadrilha criou igreja em São Paulo para sonegar impostos e lavar dinheiro


FAUSTO MACEDO - O Estado de S.Paulo
A Polícia Federal deflagrou ontem em São Paulo a Operação Lava-Rápido para desarticular organização criminosa especializada em crimes contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e subtração de procedimentos fiscais da Secretaria da Fazenda estadual.
Segundo a PF, o inquérito teve início em março passado após a constatação de que "uma pequena igreja" havia movimentado em suas contas quase R$ 400 milhões em operações financeiras. A igreja usada para a fraude só existia no papel, ou seja, tinha registros nos cadastros do Fisco apenas para acobertar as atividades ilícitas de empresas do grupo. Não havia templo nem fiéis.
A PF cumpriu 6 mandados de prisão e 12 de busca e apreensão nas cidades de São Paulo, Atibaia e Valinhos. A operação foi desencadeada com autorização da 2.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, especializada em ações contra crimes financeiros.
Busca. A PF cumpriu mandado de busca e apreensão no edifício-sede da Secretaria da Fazenda do Estado. A equipe da PF, composta por um delegado, um escrivão e dois agentes, investigava suspeitas de colaboração de três funcionárias administrativas no desvio de processos.
A Fazenda destacou dois membros da Corregedoria da Fiscalização Tributária (Corcat) para acompanhar os agentes federais e dar todo apoio à ação. "Os agentes da PF efetuaram busca nas estações de trabalho das funcionárias e apreenderam material que será analisado na investigação", informou a Fazenda.
Cinquenta policiais federais vasculharam também escritórios comerciais, empresas e endereços residenciais. A Secretaria da Fazenda foi decisiva para o êxito da operação, informou a PF. Entre os presos estão um ex-agente fiscal da Fazenda estadual e quatro servidores da pasta que recebiam comissões por "serviços prestados" à quadrilha em valores que variavam de R$ 500 mil a R$ 1 milhão.
Um empresário foi preso em flagrante por posse ilegal de armas. Ele já estava com sua prisão preventiva decretada pela Justiça Federal. Os investigados responderão, de acordo com suas atuações, pelos crimes contra o sistema financeiro, subtração de processos, corrupção ativa e passiva, tráfico de influência, lavagem de dinheiro, quadrilha, falsidade ideológica e sonegação fiscal, cujas penas somadas podem atingir 28 anos de prisão.
Os servidores davam sumiço em processos tributários e excluíam os dados do sistema informatizado. Quando os processos eram volumosos demais, faziam a retirada "em pedaços", transportando os papéis em mochilas e bolsas.
Em partes. "Os documentos eram levados em partes e entregues aos chefes da quadrilha que os entregavam para os empresários envolvidos", relata o delegado Isalino Giacomet, da Delegacia de Combate a Crimes Financeiros (Delefin).
Giacomet assinala que a "igreja" era uma empresa que jamais teve existência física. "A associação religiosa foi criada por gozar de imunidade tributária, o que diminuiria as probabilidades de fiscalização, na visão dos integrantes do grupo."
Empresas de fachada faziam parte de um esquema para sonegação fiscal e evasão de divisas que contava com dois modos de atuação. No primeiro, empresas de fachada eram criadas para que atuassem ficticiamente, recebendo recursos de empresas reais e depois remetendo os valores para o exterior por meio de doleiros. Essas empresas de fachada eram utilizadas por um período curto para "melhor desviar a atenção da fiscalização". No segundo modo, o grupo servia empresas devedoras do Fisco estadual. Essas empresas já haviam sido autuadas ou haviam tido seus recursos administrativos julgados improcedentes.