domingo, 2 de março de 2025

OESP As 7 ‘regras pétreas’ de Leandro Karnal para se preparar para o fluxo da vida, Leandro Karnal

 Por Leandro Karnal

Considero-as pétreas: constituídas por rochas. Porém, você sabe, querida leitora e estimado leitor, que a água mole sobre a matéria resistente consegue, com o tempo, a mudança. Analise de acordo com seu bom senso.

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1.

Em toda casa, há (ou haverá) avós e pais doentes. Alguém vai se dedicar mais aos parentes fracos. A pessoa que priorizar o amparo vai culpar os que cuidaram pouco. E, de longe, os mais felizes serão os indiferentes absolutos que apresentam densa agenda de viagens mesmo com algum genitor no hospital. Os “indiferentes” são os que causam mais ódio e mais inveja em todo mundo. Superam qualquer culpa e, para piorar, em algumas famílias, são os mais estimados pelos avós fracos e pais claudicantes. Quem cuida pode tornar-se pesado e ressentido. Quem se afasta vive a leveza que causa estranhamento e raiva.

2.

Quando alguém pedir opinião sincera sobre filhos, não se esqueça de elogiar. Se a pessoa disser que você é parente, irmão, amigo íntimo e deseja saber a verdade, nada mais que a verdade: louve dobrado! Em caso de insistência, emocione-se e aplauda. Regra imutável: não existe pai ou mãe que, de fato, deseje saber de terceiros a verdade que já habita o coração de quem é o rebento. Ninguém! Nunca analise criticamente filho alheio. Em caso de vontade incontrolável, escreva em uma lista os horrores do infante e, depois, queime (o papel, não a criança). Não conte a terceiros. Jamais escorregue: o filho alheio é perfeito, lindo, educado, brilhante e uma pessoa do bem. Porém, se o seu desejo de criticar for incontrolável, o único jeito é ter um filho e descobrir que, enfim, você foi o primeiro ser humano da história a conceber um indivíduo perfeito. Ou não...

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3.

Você sofre menos e diminui seu “índice de inconveniência” quando reduz a expectativa sobre o outro. Adote o seguinte lema: “Isso é o máximo que ela ou ele conseguem fazer”. Não precisa gostar ou amar o bolo, o texto, a conversa, a festa ou a decoração. Basta pensar na “regra do máximo”. Aceite – os padrões de exigência que habitam seu córtex cerebral podem ser distintos da régua alheia. E, onde você for ruim, o outro pode ser muito melhor. A norma aumenta sua felicidade. Você faz um churrasco maravilhoso? Asse e coma. Pronto! Foi alimentar-se em outro lar? Surge o “máximo”. Aceite. Isso inclui a tolerância de o ato alheio ser superior ao seu. Exemplo? Alguém que considera o Natal a celebração mais importante da vida, enquanto, para você, resume-se a um jantar em família. O máximo alheio pode estar acima ou abaixo do seu. Pare de comparar. Viva! Relaxe.

4.

Família é herpes: incurável, pode voltar a qualquer momento quando a resistência baixa. Evite brigar de frente. Controle-se. Engula! Se insuportável, fique isolado um tempo. Não adianta atacar diretamente um irmão: vocês se encontrarão de novo. Não é um inimigo de rede social, é alguém do seu tronco genético. Não se pode bloquear mãe. Os filhos dos seus pais possuem cônjuge ou filhos: considere-os parte deles. Releia a regra dois. Discordou? Manifeste-se de forma muito moderada. Não resolveu? Afaste-se com sutileza. Não insulte, não grite, não agrida. Vocês estarão juntos em breve. O clima será ruim. Regra: ninguém amará todas as pessoas da sua família da mesma maneira. Algumas, inclusive, serão detestadas. Basta não enunciar. Confie neste cronista: melhor evitar o contato do que discutir. Você pode romper com amigos, não pode romper com mãe ou pai. Cuspidas na geração acima retornam como chuva de raiva sobre você. Aceite.

Pessoas usam celular em foto de 2020
Pessoas usam celular em foto de 2020 Foto: Tiago Queiroz/Estadão

5.

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Providenciou uma política saudável de reservar uma parte do seu dinheiro? Decidiu criar um fundo de emergências? Parabéns! Excelente! Saiba que todo fundo criado traz a emergência em si. É uma relação de causa e consequência. Guardou dinheiro para uma dificuldade? Ela surgirá do nada, consumindo aquela verba extra. Existe até uma consequência um pouco homicida: se depositar em um investimento um montante para a possibilidade de enterro de um parente idoso, você praticamente está matando sua avó, por exemplo. Existe uma prática mágica que preserva mais seu capital: diga que é para comemorar uma grande conquista da família, uma felicidade única. Isso dá maior prazo para a rentabilidade beneficiá-lo.

6.

Todo evento tem um “mas”. O jantar estava ótimo, mas... O casamento foi perfeito, mas... Meus colegas são bons, mas... A ausência de uma adversativa, por mínima que seja, só existe por falta de exame mais aprofundado. Algo sempre dará errado ou, ao menos, terá menor brilho. Saber que existirá um porém ajuda a encarar a decepção. Enfatize o que deu certo para sofrer menos. Você também é cheio de “mas”.

7.

Regra nova: você verá o tempo acelerar-se ao pegar o celular. Olhe apenas uma mensagem, por um minuto. O relógio se apressa. O celular é uma máquina do tempo, faz tudo ser muito mais dinâmico e abre um portal inescapável.

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São sete regras pétreas. Descubra as suas e adapte as minhas ao seu gosto e possibilidade. Prepare-se, com antecedência, para o fluxo da vida. Boa semana, com esperança!

Conta da popularidade erodida foi para o colo de Lula, Elio Gaspari, FSP

 Lula está com a popularidade erodida enquanto oito governadores vão bem. Um deles, Ronaldo Caiado, de Goiás, tem 86% de aprovação em seu estado e é candidato à Presidência.

Desde que o jacaré abriu a boca, surgiram inúmeras explicações, todas baseadas na realidade. Há mais uma: foi para Lula a conta de um governo travado, no qual ele ungiu dois superministros: Rui Costa, da Casa Civil, e Fernando Haddad, da Fazenda.

Deixando-se de lado o fato de que os dois não se bicam, Haddad ficou com as boas notícias da economia, passando adiante o espinho da carestia. Foi hábil, mas ela iria para outro colo e está no de Lula.

Com Rui Costa aconteceu o contrário. Ele aceitou a função de bedel do ministério, que lhe foi dada por Lula logo no início do governo.

Na imagem, duas figuras estão sentadas em uma mesa durante uma reunião. À esquerda, um homem de cabelo grisalho e barba, vestido com um terno cinza e gravata, segura um microfone. À direita, um homem com cabelo curto e terno escuro, usando uma gravata rosa, parece estar ouvindo atentamente. Ao fundo, estão visíveis as bandeiras do Brasil e do estado da Bahia.
O presidente Lula ao lado ministro Rui Costa (Casa Civil) durante reunião no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 03.out.2024/Folhapress

Ambos sonharam que a Casa Civil afunilaria o estudo das "ideias geniais" dos ministros. Isso só deu certo no governo do general Emílio Médici (1969-1974). A partir de 2024, resultou na transformação de Rui Costa em gerente da trava. A PEC da Segurança Pública travou? A criação da Autoridade Climática atolou? Tudo culpa do gaveteiro da Casa Civil.

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Quase todos os ministros garantem que têm ideias paradas na Casa Civil. Em alguns casos, Rui Costa teve ou tem pouco a ver com a trava.

A PEC da segurança não andou porque o ministro Ricardo Lewandowski acreditou em sonhos petistas. A Autoridade Climática está atolada porque Lula não quer encrenca com a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente.

Lula não é Médici, Haddad não é Delfim Netto, e Rui Costa não é Leitão de Abreu, chefe da Casa Civil do general. E, mesmo se fossem, o Brasil de 2025 não é a ditadura dos anos 70.

A conta foi para o colo de Lula porque não tinha para onde ir.

ADVOGADOS E ENGENHEIROS

Censo de 2022 revelou que o Brasil tinha 2,5 milhões de advogados e 518 mil engenheiros. Somando-se os 553,5 mil médicos aos engenheiros, vê-se que existem dois advogados para cada um desses profissionais. Poucas estatísticas retratam tão bem um país que anda para trás.

A China tem 6,7 milhões de jovens em cursos de engenharia. Esse número supera os 4 milhões de brasileiros que têm diploma de curso superior. A China tem 1,4 bilhão de habitantes contra 211 milhões de brasileiros, mesmo assim, o sinal permanece, com os chineses andando para a frente.

Para piorar, o Censo mostrou que o Brasil tem 4 milhões de formados em gestão e administração. Isso se explica por diversos fatores, desde o custo das faculdades até os salários para quem sai da faculdade. Esses gestores e administradores cuidam de empresas numa economia que anda de lado.

Vale a pena olhar para trás.

Em 1886, na Alemanha, Karl Benz patenteou um veículo movido a gasolina. Nos Estados Unidos, o engenheiro Nikola Tesla obteve sua primeira patente e dois anos depois registrou seu motor de corrente elétrica alternada.

Em Pindorama, esse mesmo ano seria conhecido pelo vigor dos debates pela Abolição.

Nele, o advogado Inácio Martins apresentou um projeto que proibia o açoitamento de negros escravizados. Na sua discussão, apareceu o telegrama de um juiz do Vale do Paraíba que informava:

A cada um dos escravos condenados a 300 açoites, foram aplicados 50 de cada vez, nos dias em que se achavam em condições de sofrê-los sem perigo.

Segundo a opinião de dois médicos, estes açoites não concorreram absolutamente para a morte dos dois escravos. Tal é também o juízo das pessoas que viram o bom estado deles antes e por ocasião de serem entregues aos enviados de Valle. (Valle era um fazendeiro, dono dos negros.)

Grandes abolicionistas como Joaquim Nabuco e Luís Gama eram advogados. O Brasil andava para trás porque os projetos e as ideias de engenheiros como André Rebouças ficavam no papel.

Ronaldo Lemos - Quem não mesmeriza fica para trás, FSP

 No século 18, o austríaco Franz Mesmer propôs a teoria do "magnetismo animal". Ele acreditava que uma força invisível fluía entre os seres, sendo capaz de curar ou causar doenças. Para manipular essa força, ele aplicava ímãs e imposição de mãos. Usava também uma banheira em cujo redor até 12 pessoas se sentavam segurando uma haste de ferro.

Nas sessões, muita gente entrava em surto, com tremores, risos descontrolados, choros, convulsões ou euforia. Curiosamente, as práticas levavam a melhoras nos pacientes. A ponto de em 1784 uma comissão formada por Lavoisier e Benjamin Franklin ter sido formada para avaliar a questão. A conclusão foi que não havia bases científicas para o "magnetismo animal". Mas os efeitos terapêuticos eram reais.

Mesmer passou a ocupar um lugar curioso. Para uns, pioneiro, para outros, charlatão. Ganhou até palavra própria: mesmerizar, sinônimo de "causar grande fascínio".

A imagem mostra uma grande multidão reunida em um evento festivo ao ar livre. As pessoas estão vestidas de forma colorida e alegre, algumas usando acessórios como leques e orelhas de coelho. A cena é iluminada por luz natural, com sombras projetadas, criando um contraste entre as áreas iluminadas e as mais escuras. A atmosfera é vibrante e cheia de energia.
O bloco de carnaval Minhoqueens, em São Paulo; as dinâmicas de contágio social se provam reais e demandam "mesmerizar"

Corte para 2018. Uma influenciadora britânica chamada Evie Meg alcança milhões de seguidores. Seu perfil chamado This Trippy Hippie retrata sua vida com síndrome de Tourette e outras condições neurológicas. Uma de suas características são tiques que ela repete nas postagens. Dentre eles, gritar palavras inesperadas (como "feijões"), fazer estalos com a língua, movimentos repentinos dos braços, bater no peito e piscar repetidamente.

Corte para 2021. Clínicas psiquiátricas no mundo todo começam a notar um aumento incomum de tiques incontroláveis entre adolescentes de vários países. Entre os sintomas, está estalar a língua, bater no peito e gritar "feijões". Equipes médicas no Canadá, na França e na Alemanha concluem que o "paciente zero" é Evie Meg. Alguns batizam os portadores de tiques de "evies". Até na remota ilha de Santa Helena uma evie é diagnosticada (a garota não parava de gritar "feijões").

Os médicos concluem que se trata de uma nova "doença psicogênica de massa" (MPI). Sua forma de contágio não é o ar, a saliva nem o toque. É a internet. O magnetismo animal pode não existir. Mas o contágio social existe. Evie Meg não é única. O influenciador alemão Jan Zimmermann é outro caso semelhante. O contágio social existe e pode sim acontecer pela internet. Mesmer usava rituais elaborados e objetos como ímãs, limalha de ferro e espelhos para "influenciar". Apesar de o magnetismo animal que ele propôs não parar de pé, ele detectou e instrumentalizou algo totalmente real. Merece respeito.

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As repercussões dessa dinâmica de contágio são profundas. Têm desdobramentos não somente fisiológicos mas políticos e ideológicos. Em grande medida, fazer política no mundo de hoje é desencadear dinâmicas de contágio. Em outras palavras, mesmerizar. Quem não mesmeriza é mesmerizado. Parafraseando Oswald: Lei do homem, versão 4.0: só o mesmerismo nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Já o magnetismo animal talvez também exista. É só observar a beleza do Carnaval no Brasil!

Já era – Apelar politicamente para a razão

Já é – Apelar politicamente para a emoção

Já vem – Apelar politicamente para o subconsciente ("mesmerizar")