sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Três temas da área de tecnologia na China para acompanhar em 2022, Tatiana Prazeres, FSP

 A China é um vasto laboratório tanto para novas tecnologias quanto para políticas e regulações nessa área. A seleção é difícil, mas aqui vão três temas a acompanhar em 2022, inclusive pelo potencial de repercussões internacionais.

1) Yuan digital ou remimbi (RMB) digital. A China é a primeira grande economia a adotar uma moeda digital emitida pela autoridade monetária do país (no caso, o Banco Central da China). E 2022 é o ano em que o governo pretende popularizar o yuan digital —usará, por exemplo, as Olimpíadas de Inverno em Pequim para isso.

Aplicativo oficial do governo chinês para a moeda digital do país ao lado de cédulas de yuan
Aplicativo oficial do governo chinês para a moeda digital do país ao lado de cédulas de yuan - Florence Lo/Reuters

Testes já estão em curso há um tempo. Em janeiro de 2021, a cidade de Shenzhen distribuiu para 100 mil habitantes, num sistema de loteria, pacotes vermelhos eletrônicos contendo 200 yuans (cerca de R$ 170) cada um. Para concorrer, era necessário instalar no celular a carteira do yuan digital.

Mais de 140 milhões de chineses já instalaram o app, o que fez dele o mais baixado na China nesta semana. O número, no entanto, representa uma fração dos usuários dos dois gigantes de pagamento móvel Tencent (com o WeChat Pay) e Alibaba (Alipay). Cada um tem cerca de 900 milhões de usuários no país. Pagamentos digitais são amplamente disseminados na China —e muitíssimo concentrados nessas duas empresas.

Além de atacar o duopólio privado, o yuan digital permitirá ao governo aumentar o controle sobre o sistema financeiro e facilitar o monitoramento de transações. Ele não será capaz de catapultar a internacionalização da moeda chinesa, como alguns imaginam, mas ainda assim o experimento de Pequim influenciará a atuação de outros bancos centrais.

2) Tecnologias verdes. A China continua sendo, de longe, o maior emissor global de CO₂, com cerca de um terço do total, mesmo produzindo aproximadamente 70% dos painéis solares do mundo e controlando 40% do mercado de turbinas eólicas. Em 2022, o país seguirá investindo e colhendo frutos associados à green tech, e novas tecnologias associadas à sustentabilidade serão viabilizadas pela expansão recente da rede 5G no país, por exemplo.

Tudo isso será necessário não apenas para que a China atinja suas metas de redução na emissão de CO₂. Para que o mundo faça a transição climática com a urgência necessária, é impossível fugir das tecnologias chinesas —e isso não deve mudar. O que ocorre no país em matéria de green tech importa muito para a contabilidade global de carbono.

3) Regulação sobre algoritmos e governança de inteligência artificial. Em março de 2022 entrarão em vigor regras sobre recomendações baseadas em algoritmos. Um dos objetivos é que essas recomendações sejam feitas de maneira mais transparente.

Quando, no ano passado, houve uma consulta pública sobre o assunto, circularam nas redes imagens de telas de celular indicando que empresas de transporte por aplicativo cobravam valores diferentes de usuários interessados no mesmo trajeto, no mesmo momento. Netizens reclamaram que informações do perfil de consumo dos usuários eram empregadas para, via algoritmo, definir os preços diferentes.

Além de coibir práticas que prejudicam o consumidor, as autoridades dizem querer combater fake news, proteger interesses dos idosos (contra fraudes online, por exemplo) e proibir algoritmos que viciem crianças em jogos eletrônicos ou aplicativos.

O governo também pretende "disseminar energia positiva" —o que deve incluir, além do controle, a promoção de conteúdo do seu interesse na rede. Independentemente da opinião que se tenha sobre ele, o experimento chinês, inclusive por ser pioneiro, terá repercussões no debate global sobre inteligência artificial.

O país que não lhe diz respeito, Ruy Castro, FSP

  EDIÇÃO IMPRESSA

Bahia, Minas Gerais e Goiás estão debaixo d’água. Para milhões de pessoas, a vida agora se resume ao que sobrou da lama, dos escombros de suas casas e dos cacos de seus sonhos. Nenhuma delas recebeu de Jair Bolsonaro uma palavra de solidariedade e conforto, muito menos promessa de ajuda. Suas tragédias não dizem respeito ao homem em quem muitas devem ter votado. Importante é o jet ski, as provocações e o voo em primeira classe para seus ministros.

A tragédia desses estados não se limitará às enormes perdas individuais, mas envolverá a saúde, a agricultura, a produção industrial, os serviços e a economia em geral, deles e de seus vizinhos. Bahia, Minas Gerais e Goiás são rotas de passagem e, por suas estradas, destruídas ou interditadas, milhares de caminhões deixarão de rodar pelos próximos meses. Esperam-se desemprego, revoltas de caminhoneiros e desabastecimento. Mas nada disso compete a Bolsonaro. Para ele, o problema é dos governadores e prefeitos —muitos dos quais igualmente trabalharam por sua eleição em 2018.

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O país voltou à casa dos milhares de contaminados diariamente pela Covid e, não importa quantos já tenham morrido, Bolsonaro acha pouco. Quanto a isso, ele pode ficar tranquilo —estamos na iminência de uma avalanche de casos, superlotação dos hospitais, falta de insumo para testes, profissionais da saúde desesperados pelas condições de trabalho e alto risco para as crianças, a quem ele sonega vacina, e para os pascácios que ele estimula a não se vacinarem.

Para Bolsonaro, não foi para cuidar disso que o elegeram. Elegeram-no para ele se reeleger. Desde que tomou posse, não passou um dia sem ter a reeleição como prioridade. Por reeleição entenda-se continuar na cadeira por quaisquer meios.

As desgraças acima lhe roubam votos em massa, mas Bolsonaro não se altera. Está confiante de que, se lhe faltar urna, as vacas fardadas que ele engorda e ordenha irão garanti-lo.