terça-feira, 21 de julho de 2015

A vez dos oligarcas - ELIO GASPARI


O GLOBO -19/07

Merval Pereira disse tudo quando deu o título de “A vez dos oligarcas” à coluna em que tratou da diligência da Polícia Federal nas casas e escritórios de políticos envolvidos na Lava-Jato. Da Casa da Dinda do senador Fernando Collor saíram uma Lamborghini, uma Ferrari e um Porsche. A frota do ex-presidente deve à Viúva R$ 343 mil de IPVA, e o sócio do posto de gasolina de Maceió em cujo nome está o Porsche nunca ouviu falar dele. Os brinquedos do senador sexagenário deram cores cinematográficas à operação policial, mas no centro do problema estão as informações dadas pelo empreiteiro Ricardo Pessoa e pelo operador Alberto Youssef à Lava-Jato. Eles teriam pagado R$ 29 milhões a Collor em troca de favores na Petrobras.

O senador foi à tribuna e acusou a Polícia Federal de ter sido truculenta, extrapolando “todos os limites” da legalidade (as diligências foram autorizadas por três ministros do Supremo Tribunal Federal).

Chegando a vez dos oligarcas, começava o espetáculo da reação da oligarquia. Collor é um ex-presidente da República, filho de senador, neto de ministro. Na mesma diligência, a PF foi à casa do senador Fernando Bezerra Coelho, no Recife. Polícia na casa de um Coelho foi coisa nunca vista. FBC foi ministro da doutora Dilma, é pai de deputado, sobrinho de ex-governador, neto do coronel Quelê, condestável de Petrolina, onde o sobrenome da família honra o aeroporto, o estádio, um parque, um bairro e uma orquestra.

Noves fora a reação de Collor, o presidente do Senado, Renan Calheiros, ex-vice-presidente da Petroquisa, ministro da Justiça de FHC e pai de Renan Filho, atual governador de Alagoas, disse que a ação da Polícia Federal “beira a intimidação”. Renan é investigado pelo Supremo. Além disso, rola no tribunal um processo em que é acusado de pagar mesada à mãe de uma filha extraconjugal com dinheiro da empreiteira Mendes Junior.

Coube ao vice-presidente Michel Temer o brilho do rubi da coroa da rainha da Inglaterra. Ele disse que “temos que buscar no país uma certa tranquilidade institucional porque essas coisas estão, digamos assim, abalando um pouco a natural tranquilidade que sempre permeou a atividade do povo brasileiro”. A pedra da coroa da rainha não é rubi, mas um espinélio, e a frase de Temer, digamos assim, não quer dizer nada. Que “coisas”? A Lava-Jato, a diligência autorizada pelos ministros do Supremo, ou as petrorroubalheiras? Soltou o enigma e viajou com a família para Nova York.

Renan Calheiros disse também que a democracia está em jogo. Falso. Ela vai bem, obrigado. O que está em jogo é a definição do alcance das leis.

O esperneio oligárquico, bem como as ameaças de Eduardo Cunha, revelam a tática de fim do mundo. Articulam o fim dos tempos, interessados em criar uma crise institucional cujo propósito exclusivo é abafar a Lava-Jato. Lastimavelmente, a doutora Dilma não conseguiu se tornar um fator de estímulo aos procuradores e magistrados. Ficou neutra contra. Podendo ser parte da solução, pedala como parte do problema.

O golpe do parlamentarismo

A repórter Raquel Ulhoa avisou: arma-se no Congresso um golpe para mutilar a Presidência da República estabelecendo um regime parlamentarista. Numa ponta dessa conversa, para logo, já se viu o senador Renan Calheiros. Noutra, defendendo a ideia para mais adiante, entrou o deputado Eduardo Cunha. Pairando sobre ambos há uma parte do tucanato, desencantada com as bandeiras do impedimento, das contas do TCU e dos processos do Tribunal Superior Eleitoral.

A manobra depende da existência de um clima de inquietação, com a economia em queda e o desemprego em alta. Disso, a doutora vem cuidando. Para piorar, o Congresso aprova maluquices que agravam as dificuldades. O caldo entornará com as manifestações de agosto (desprezando-se a possibilidade de surgimento de manifestantes contra golpes, ladroagens e truques dos suspeitos de sempre).

O parlamentarismo pode ser instituído com a aprovação por maioria de três quintos das duas Casas do Congresso, em duas votações. São necessários 51 dos 81 senadores e 308 dos 513 deputados. Isso só se consegue com uma crise do tamanho da de 1961, quando o país esteve à beira da guerra civil, e aprovou-se uma emenda parlamentarista, mutilando o mandato de João Goulart.

É muito comum ouvir-se falar em “golpe paraguaio” ou “golpe boliviano”. A manobra criaria o “golpe brasileiro”, superando de longe os dois outros. O parlamentarismo foi rejeitado pela população em dois plebiscitos, sempre por larga maioria. O primeiro deu-se em 1963, e o segundo, em 1993. Nele, o regime parlamentar teve 16,5 milhões de votos, contra 37,2 milhões dados ao presidencialismo. O restabelecimento da monarquia teve 6,8 milhões.

De acordo com o processo legislativo e a Constituição, seria mais fácil revogar a Lei Áurea, sancionada a partir de um simples projeto de lei votado pelos deputados e senadores. Ela nunca foi submetida a um referendo, quanto mais a dois. A velha e boa plutocracia nacional deve reconhecer que essa mágica é impossível, mas ela haveria de lhe fazer o gosto.

A ruína do Inca

As convicções partidárias do ministro Arthur Chioro conseguiram o que a ditadura nem tentou: degradar o Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro.

Os generais mantiveram na direção do serviço Moacir Santos Silva, o médico de Jango. Com Chioro, um sindicato de servidores públicos federais na Saúde ganhou uma sala no Inca, enquanto cinco das 11 salas de cirurgia estão fechadas por falta de anestesistas.

A média de espera para uma cirurgia, que já foi de 20 dias, está em dois meses, tempo suficiente para tornar inútil o procedimento.

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota, rompeu com o governo da doutora Dilma e passou a acreditar em tudo o que dizem contra ela.

O cretino só não conseguiu resolver um problema. Ela, como ele, defende a normalidade constitucional e o respeito ao mandato saído das urnas no ano passado.

Eremildo é um idiota, capaz de trocar seis por meia dúzia, mas nunca trocou seis por quatro.

Má notícia

O ministro Joaquim Levy ainda não fez nada errado, mas, pelas artes da política, ficou menor do que estava quando assumiu o cargo.

Está mais para Mário Henrique Simonsen, que demorou para mostrar que era capaz de pedir o boné, do que para Pedro Malan, que encolhia os bonés dos outros.

Estou fora

No dia do fatídico jantar da doutora com José Eduardo Cardozo e o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, na cidade do Porto, Teori Zavascki estava no mesmo hotel, pois compareceria ao mesmo evento que juntaria o colega e o ministro da Justiça

Se tivesse sido convidado, não iria. Se o convidaram, não foi.

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