sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Inglês consome alecrim da Etiópia; ativismo ambiental é para brasileiro ver, Marcos Nogueira FSP

 Inventei de fazer uma feijoada aqui em Londres. Uma feijoada sem concessões. Sou desses.

Parecia, à primeira vista, uma tarefa quase impossível. Acabou sendo bem mais fácil do que eu imaginava —precisei me render apenas a adaptações mínimas.

Trouxe na mala a farinha de mandioca flocada e a linguiça defumada. O resto foi comprado nos mercados étnicos do bairro.

Walthamstow é um subúrbio com perfil populacional interessante. Enquanto a galera hipster chega para colonizar uma área com aluguel menos caro, comunidades de imigrantes resistem.

Aqui tem turcos, árabes de diversas origens, indianos, caribenhos, africanos e uma presença bastante visível de pessoas do Leste Europeu. Tamanha mistureba faz compras num mercado com nome autoexplicativo: International Supermarket.

Lá eu comprei costela defumada e bacon poloneses, além de feijão-preto de uma marca inglesa para consumidores turcos. Achei pé de porco defumado, made in Romênia, numa mercearia; num açougue, também romeno, peguei orelha e rabo frescos.

A couve, ou algo parecido com isso, veio da Escócia. Consegui carne-seca num mercadinho brasileiro e, para ajudar na digestão de tanta gordura, algumas laranjas das Ilhas Canárias.

Aqui é possível cozinhar qualquer prato, desde que se pague o frete dos ingredientes. Tem tão pouca coisa produzida localmente que elas são anunciadas com alarde no mercado: porco inglês, batata-inglesa, leite inglês.

Ingleses, alemães e norte-americanos vivem numa bolha de prosperidade em que as coisas parecem cair do céu. Eles comemoram a baixíssima emissão de poluentes no trânsito enquanto esburacam a Bolívia e o vale do Jequitinhonha para obter o lítio da bateria do carro elétrico.

Fique agora com uma receitinha simples e saborosa: o vinagrete de banana que fiz para acompanhar a feijoada londrina.

Prato com vinagrete de banana
O vinagrete de banana que acompanhou a feijoada - Marcos Nogueira/Folhapress

VINAGRETE DE BANANA

Rendimento: 4 porções

Dificuldade: fácil

Tempo de preparo: 3 a 5 minutos

Ingredientes

3 bananas-prata ou nanica, não muito maduras

½ cebola roxa

2 talos de cebolinha

Pimenta dedo-de-moça (ou outra mais forte) a gosto

Suco de 1 limão

1 colher (sopa) de azeite

Sal a gosto

Modo de fazer

Pique bem a banana, a cebola, cebolinha e a pimenta. Junte rapidamente o suco de limão para que a banana não escureça. Tempere com azeite e sal e misture. Sirva à temperatura ambiente.

Mauro Calliari -Túnel da Sena Madureira, parque Jurubatuba, Raposo Tavares: quando o transporte destrói lugares, FSP

 Findas as eleições, parecia que as cadeiradas e brincadeiras da 5ª série poderiam dar lugar a conversas de adultos. A julgar por alguns projetos em andamento, a gestão municipal e estadual têm muito a fazer se quiserem aumentar a qualidade da discussão de ideias.

Três novos projetos de mobilidade explicitam a falta de visão de cidade:

São soluções para problemas de mobilidade que desconsideram soluções urbanísticas.

Dão prioridade absoluta para os automóveis, sem considerar alternativas de transporte público ou mobilidade ativa.

Implicam perdas de áreas verdes;

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E, em nenhum deles, houve a preocupação de se comunicar com as pessoas que serão impactadas.

Túnel da Sena Madureira

Em troca de evitar o cruzamento com a Domingos de Moraes, um túnel irá destruir 85 casas. Os mais de 200 moradores nunca receberam informação sobre o projeto até virem o primeiro trator; 165 árvores serão cortadas e um córrego já foi cimentado, apesar de fazerem parte dos "corredores verdes", priorizados no Planpavel, um documento da própria prefeitura.

Prolongamento da marginal ao lado do rio Jurubatuba

Em 2023, a Prefeitura lançou uma licitação para prolongar a Marginal Pinheiros. A nova pista vai ocupar o último pedaço vazio ao lado do rio Jurubatuba, com mais de 6 km de extensão.

Eu visitei o lugar e fiquei espantado com o verde e o silêncio, só cortado pelo trem do outro lado do rio. No lugar de um parque linear gigante, veremos faixas de concreto, que provavelmente estarão congestionadas logo.

Anos atrás, técnicos da prefeitura escreveram uma nota técnica que dizia: "A ausência de vias marginais expressas neste território é uma grande (e última) oportunidade de garantir que a cidade se relacione com seus rios". E, ato contínuo, propõe a continuação da marginal, rebatizada de "via parque".

Nova Raposo Tavares

Já critiquei o projeto, tocado pelo governo estadual, numa coluna anterior. Trata-se de alargar e facilitar acessos da estrada na chegada a São Paulo. Como nos outros projetos, não houve discussão sobre transportes alternativos, nem sobre o impacto dos novos túneis e pontes, da derrubada de árvores e da destruição dos bairros.

Novas soluções para novos tempos

É claro que há que se discutir os problemas de mobilidade. A Raposo está congestionada, a zona sul precisa de acessos, etc etc.

Mas onde está a integração entre os projetos de mobilidade e os de urbanismo? Por que o transporte público é sempre a última opção? Por que os projetos são lançados sem discussão e sem comunicação? Como usar melhor os mais de R$ 2 bilhões de verba municipal previstos? Só como exemplo: eles seriam suficientes para comprar mil ônibus elétricos e ainda multiplicar por dez a verba anual de reforma de calçadas.

Já vimos o que acontece quando a passagem de automóveis se torna a única prioridade. Os viadutos do Parque Dom Pedro, o Minhocão e as marginais desfiguram para sempre os lugares onde passam. Na cidade onde tudo é passagem, não há permanência.