quarta-feira, 30 de abril de 2025

STF homenageia o trabalhador brasileiro, Conrado Hübner Mendes, FSP

 Nesse 1º de maio de 2025, trabalhador, o STF gostaria de lembrar o que fez por você nos últimos anos.

A Constituição de 1988 garantiu, no artigo 7º, direitos como salário mínimo, férias, décimo terceiro, licença-maternidade, proteção contra acidentes, proibição da discriminação. Decorrem da pedra fundamental do direito do trabalho: a relação de emprego, que supõe subordinação e continuidade.

Para esvaziar a Constituição sem mudar o texto da Constituição, o tribunal premiou você, trabalhador, com a eliminação gradual de garantias elementares da sua vida econômica. E incentiva fraudes ao conceito de "relação de emprego".

A imagem mostra o Palácio da Alvorada, que é a residência oficial do Presidente do Brasil, em Brasília. Na frente do palácio, há um vendedor com um carrinho de bebidas e artesanatos, sob um guarda-sol azul. O céu está parcialmente nublado, com algumas nuvens brancas. O espaço ao redor é amplo, com piso de pedras e algumas árvores ao fundo.
Sede do STF no dia de reabertura do Ano Judiciário, em Brasília - Pedro Ladeira - 1.fev.2024/Folhapress

No seu dia, trabalhador, vale recordar dez prêmios que lhe foram concedidos:

1. O STF inventou a prevalência da negociação sobre a lei. Patrão e empregado podem entrar num "acordo" contra a lei. Permitiu que esse acordo assimétrico tenha tratamento de contrato civil qualquer. A lei trabalhista torna-se facultativa.

2. Inventou também a prevalência do contrato sobre a realidade. Se o trabalhador assinou um papel, mas na realidade realiza atividades diferentes do combinado, prevalece o que estava escrito.

3. O STF ampliou conceito de terceirização previsto na reforma trabalhista. A lei definia requisitos como a autonomia na prestação de serviços terceirizados. Foram abolidos.

4. O STF equiparou terceirização, em que ainda restam ao trabalhador certos direitos, a pejotização, na qual o trabalhador vira uma empresa. E eliminou a isonomia entre trabalhadores terceirizados e empregados.

5. O STF atribuiu aos terceirizados do serviço público o ônus de provar que a administração pública não fiscalizou empresas contratadas.

6. Rumo à era pré-moderna, o STF permite ao direito civil regular relações de trabalho. E veja só: com a proposta de reforma do Código Civil, essa relação pode perder até a proteção do contrato civil (como o equilíbrio do contrato, a boa-fé e a premissa de cooperação entre as partes), e se tornar uma figura nova, o "contrato empresarial".

Agora você é empresário, trabalhador. Suas relações são de igual para igual.

7. O STF liberou grandes corporações como Uber e IFood para contratar esse empresário de si mesmo sem responsabilidade trabalhista ou previdenciária.

8. A Justiça do Trabalho tornou-se, por arte do STF, Justiça a ser combatida, não aperfeiçoada. E o STF, sua instância revisora, mesmo que não haja controvérsia constitucional.

9. Se almeja reconhecer vínculo empregatício, trabalhador, a porta da Justiça do Trabalho foi fechada.

10. Para a mulher trabalhadora-empresária, o STF acabou de lhe tirar proteção à maternidade e contra o assédio. Relação horizontal, afinal, não tem assédio.

Todas as estratégias empresariais de fuga do direito do trabalho foram validadas pelo STF. E, para deixar mais claro de que lado está, ministros do tribunal frequentam reuniões lobísticas com empresas dispostas a patrocinar encontros dentro ou fora do país.

Enquanto isso, o ministro do STF, esse empreendedor individual das decisões monocráticas, dos pedidos de vista, desimpedido de julgar causas de seus parentes-advogados, desapegado do decoro e dos rituais de imparcialidade, rejeita toda regulação de seu regime de trabalho. Um emprego sem igual.

Apagão na Europa foi gigantesco teste para uma sociedade dependente de tudo o que faltou, Rui Tavares, FSP

 Na manhã de segunda-feira (29), eu estava na cidade de Palmela em uma reunião com a Comissão de Trabalhadores da AutoEuropa, uma das mais importantes fábricas da Volkswagen no continente europeu, responsável por mais de 1,6% do PIB português. No meio da conversa, a luz falhou. Primeiro achamos que o evento era local, depois soubemos que Lisboa e Porto também estavam sem eletricidade. E afinal era todo o Portugal continental. E também a Espanha inteira, e uma parte da França.

Por acaso, a fábrica não estava em atividade plena. Se estivesse, as perdas teriam sido de vários milhões de euros durante as doze horas do apagão. O mesmo vale para todas as empresas e atividades econômicas que foram afetadas numa península de mais de 50 milhões de habitantes, altamente integrada na economia da União Europeia.

Uma pessoa está caminhando à noite em uma calçada iluminada por uma lanterna. A pessoa usa um casaco escuro e jeans, segurando a coleira de um cachorro que está ao seu lado. O ambiente ao redor é escuro, com algumas árvores visíveis e edifícios ao fundo, mas a iluminação da lanterna destaca a área onde estão.
Uma mulher usa a lanterna do celular enquanto passeia com cachorro durante apagão em Vigo, Espanha - Miguel Riopa/28.abr.25/AFP

Felizmente, o apagão, cujas causas são ainda desconhecidas à hora a que escrevo, não provocou vítimas. Mas foi um gigantesco teste prático sobre o que acontece a uma sociedade altamente dependente de energia, comunicações e tecnologia quando tudo isso falta. O resultado desse teste é que a sociedade civil se comportou com civismo e coesão. Mas as coisas poderiam facilmente ter sido muito piores.

Numa Europa nervosa com as possibilidades de eventos climáticos extremos, desinformação, pandemias, sabotagens ou guerras híbridas, o debate sobre como preparar as nossas sociedades para estas situações é muito recente.

No fim do ano passado, foi apresentado às instituições europeias o chamado Relatório Niinistö, de autoria de um ex-presidente finlandês, que faz as primeiras sugestões práticas sobre planejamento, preparação e prontidão à escala europeia (com o fantasma de Vladimir Putin no horizonte, e agora de Donald Trump, é claro). A resposta dada pelo relatório é que as sociedades são mais resilientes quando há uma divisão de tarefas entre a população e as autoridades.

Uma das recomendações, por exemplo, é que todas as famílias tenham em casa víveres, água, rádios e outros produtos necessários à sobrevivência durante pelo menos três dias, até que as autoridades tenham lidado com a emergência em questão, antes que se possam ocupar dos indivíduos que não sejam vulneráveis.

A ideia de "kits de sobrevivência europeus" foi bastante criticada por quem acha que se trata de puro alarmismo. Mas a verdade é que na segunda teriam sido úteis a portugueses e espanhóis. E se a crise tivesse durado mais, eles teriam sido cruciais.

Mas a aquisição e manutenção desse tipo de materiais não é igual na Escandinávia, onde o poder de compra é alto, e na Península Ibérica, onde muitas famílias não têm disponibilidade financeira para enfrentar imprevistos. Se as autoridades querem que a sociedade civil seja resiliente, vai ser preciso prever o armazenamento e distribuição desses kits a quem mais deles necessita.

integração europeia não é apenas um chavão. Ela é cada vez mais real, década após década, tema após tema. Na Escandinávia, as boas práticas incluem a distribuição de milhões de livros de instruções de sobrevivência por todas as casas. Depois do susto desta semana, não surpreenderá que os ibéricos queiram também ser um pouco mais escandinavos.