sexta-feira, 3 de março de 2023

Governo Bolsonaro vendeu 54 ativos da Petrobras em quatro anos, FSP

 

SÃO PAULO

Petrobras negociou 70 de seus ativos nos últimos oito anos e alcançou a marca de R$ 281 bilhões arrecadados com eles. Desse número, 54 ativos foram vendidos nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), somando R$ 175 bilhões, o equivalente a 62,28% do valor total.

O montante é 40% maior do que a soma dos ativos negociados durante os mandatos de Michel Temer (MDB, R$ 77 bilhões) e Dilma Rousseff (PT, R$ 28,7 bilhões).

Na quarta-feira (1º), Ministério de Minas e Energia solicitou à Petrobras a suspensão das alienações de ativos por 90 dias, em razão da reavaliação da Política Energética Nacional atualmente em curso.

Os dados são de levantamento realizado pelo Observatório Social do Petróleo, que é ligado à FNP (Federação Nacional dos Petroleiros), e se referem ao período de janeiro de 2015, quando foi implementado o plano de desinvestimento da estatal, até 31 de dezembro de 2022.

Tanques de armazenamento da Petrobras em Brasília
Tanques de armazenamento da Petrobras em Brasília - Ueslei Marcelino-17.jun.2022/Reuters

O levantamento se baseia no Relatório Petrobras Desempenho Financeiro 4º Trimestre de 2022, divulgado na quarta-feira (1º), e inclui venda de ativos e ações, com atualização dos números conforme a variação da taxa de câmbio para a conversão da moeda e a inflação do período.

A pesquisa mostra que o primeiro ano do governo Bolsonaro, em 2019, registrou R$ 70 bilhões em venda de ativos da Petrobras, a maior soma obtida no período. A cifra representa 25% do acumulado nos últimos oito anos.

A maior fatia desse valor foi proveniente da venda da TAG (Transportadora Associada de Gás), rede de gasodutos do Norte e Nordeste, subsidiária da Petrobras, por mais de R$ 42 bilhões —o ativo mais caro desse período analisado.

"O Ministério de Minas e Energia solicitou a suspensão das alienações de ativos da Petrobras por 90 dias. A reavaliação da Política Energética Nacional em curso no governo atual deve, corretamente, rever a política de desinvestimento e toda sanha privatizadora dos últimos governos", diz Tiago Silveira, economista do Observatório Social do Petróleo e do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps).

Na quarta-feira (1º), a Petrobras fechou 2022 com o maior lucro anual da história das empresas brasileiras: R$ 188,3 bilhões, alta de 76,6% em relação ao resultado de 2021, que havia sido o maior já anunciado pela estatal.

Com o lucro recorde, a empresa teria que distribuir mais R$ 35,8 bilhões em dividendos, mas a nova gestão propôs a retenção de R$ 6,5 bilhões em uma reserva estatutária, que será avaliada pelos acionistas em assembleia.


Rodrigo Zeidan Muitos, mas muito Mais Médicos, FSP

 O Brasil precisa de mais médicos (e dentistas e enfermeiros) para ontem. Tentamos suprir essa deficiência com o programa Mais Médicos, um passo adiante, mas insuficiente para suprir os problemas de oferta de profissionais médicos no interior brasileiro. O Médicos pelo Brasil, do governo anterior, foi um fracasso e deixou centenas de cidades a descoberto.

Temos uma gigantesca desigualdade na distribuição de profissionais de saúde pelo país. Formandos buscam especialidades bem pagas em centros urbanos. Não faltam médicos no Rio de Janeiro, em Porto Alegre ou Manaus. Mas, para atrair profissionais, prefeituras e governos do interior têm que pagar muito bem, o que cria uma situação crítica: as cidades mais pobres pagam muito mais por profissionais de saúde.

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Após saída de médicos cubanos, enfermeiros em ambulâncias passaram a fazer atendimento a doentes mais graves no povoado do Tingui, na Bahia - Adriano Vizoni - 27.nov.2018/Folhapress

Em 2009, o irmão de uma ex-namorada ganhava mais de R$ 20 mil por mês como dentista terceirizado em uma cidade do interior do Amapá. Hoje, na cidade de Amapá (MA), dos 550 funcionários da prefeitura, os 5 maiores salários são os 5 médicos com carteira assinada pela cidade (entre R$ 10 mil e R$ 13 mil por mês). Em sexto lugar, vem o prefeito. Devem ser muitos os outros profissionais de saúde como terceirizados, ganhando até mais que isso (o PIB per capita anual da cidade é de R$ 7.900).

Cada um dos 7.000 cidadãos da cidade merece ser bem tratado pelo Estado, mas estamos longe de fazê-lo de forma eficiente. E não, a solução não é reduzir remuneração de profissionais à força —se com esses valores não temos profissionais suficientes no interior, abaixá-los à força só iria piorar o problema.

Esse não é um problema somente brasileiro. Dos 18 mil médicos da Dinamarca, 2.000 são estrangeiros. E, enquanto o país não tem acordos formais com um país como Cuba, a ideia é similar. Médico formado na Índia? Por favor, venha para a Dinamarca por um certo número de anos e depois volte para casa.

Aliás, organizações de pacientes estão pressionando o governo para deixar ainda mais médicos e enfermeiros estrangeiros trabalhar no país, já que o sistema de saúde está assoberbado. Como no Brasil, as associações de médicos tentam barrar a entrada de potenciais competidores.

O programa Mais Médicos estava longe de ser bem desenhado. O mais importante seria incentivar que médicos estrangeiros quisessem morar no Brasil permanentemente. Dar-se ao trabalho de treinar e ajudar milhares de profissionais a criar laços com o país e depois não entregar cidadania? Não somos a Dinamarca, onde há até xenofobia em políticas públicas. Temos profissionais em todos os confins do mundo, muitas vezes mais bem treinados que no Brasil, que estariam dispostos a viver por um bom tempo juntando dinheiro no interior brasileiro.

Trazer profissionais de saúde com contratos de 5 a 7 anos, com cidadania no final, seria uma excelente saída para aumentar a oferta de profissionais de saúde no Brasil. Se há uma coisa que fazemos bem é integrar estrangeiros no nosso tecido social. Não precisamos fazer isso com o governo cubano, embora haja excelentes profissionais no país. A ideia é mesmo roubar "cérebros" do exterior. Nada de expulsar quem gostar do país.

Médicos sírios? Venezuelanos? Ucranianos? Venham todos. Dentistas? Enfermeiros? Venham também. Não precisamos de Mais Médicos, e sim de Muitos Mais Profissionais de Saúde. E um SUS melhor. Para ontem.

Despedida, Cristina Serra, FSP

 


Comecei a escrever na página A2 da Folha em janeiro de 2020, coincidindo com os anos mais tormentosos da vida brasileira desde a volta da democracia, na década de 1980. Eu sabia que passava a ocupar um espaço prestigiado e de grande repercussão, mas o que veio a seguir ultrapassou minhas melhores expectativas.

O encontro com os leitores foi uma oportunidade privilegiada de receber críticas e contribuições valiosas que enriqueceram minhas reflexões sobre o Brasil e, sobretudo, me ajudaram a continuar navegando na tempestade furiosa que se abateu sobre nós nos últimos quatro anos.

A jornalista Cristina Serra durante a Flip 2019, em Paraty - Eduardo Anizelli - 13.jul.19/Folhapress

Foi uma troca tão proveitosa que, por sugestão de alguns leitores, dela nasceu o livro "Nós, Sobreviventes do Ódio" (ed. Máquina de Livros), seleção de artigos aqui publicados. A coincidência, acidental, do lançamento com minha despedida não deixa de ser a melhor forma de agradecer a todos que me acompanharam até aqui.

O livro é também um reconhecimento à relação de lealdade e confiança construída com a Folha. Nesse espaço, me permiti refletir sobre o papel do jornalismo nestes anos conturbados, tendo feito críticas, inclusive, ao próprio jornal. Devo dizer que a Folha as recebeu reafirmando seu compromisso irretocável com a autonomia dos colunistas.

Tive ainda o prazer de participar da comissão julgadora do Prêmio Folha de Jornalismo 2022, tarefa de enorme responsabilidade diante da excelência dos concorrentes. A soma dessas experiências me proporcionou um reencontro com a garota que fez vestibular para jornalismo no já longínquo 1979, acreditando na profissão como uma ferramenta para a edificação e o aperfeiçoamento permanente da democracia.

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A reconstrução do país vai nos tomar muito tempo e esforço. A extrema direita constitui, hoje, força catalisadora de ódios no Brasil. Despeço-me para assumir novos desafios, sempre na trincheira pela democracia. Muitíssimo obrigada a todos e vamos em frente!