quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Márcio França é alvo de operação da Polícia Civil em SP, FSP

 Rogério Pagnan

SÃO PAULO

A Polícia Civil de São Paulo cumpre na manhã desta quarta-feira (5) uma série de mandados judiciais de busca e apreensão em endereços ligados ao ex-governador de São Paulo Márcio França (PSB), em uma investigação que apura um suposto esquema criminoso de desvio de recursos da área da saúde.

O irmão do ex-governador, o médico Cláudio França, é outro alvo da operação que está sendo desencadeada em ao menos 30 locais da capital, litoral e interior em endereços da família França e, também, de ex-funcionários de organizações sociais, empresários e médicos.

A investigação apura peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro. A operação é acompanhada pelo Ministério Público e representantes da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Segundo os policiais, no suposto esquema as organizações sociais (as chamadas OSs) seriam usadas para desvios de recursos mediante contratos superfaturados para gestão de unidades de saúde destinadas ao atendimento da população pobre.

O ex-governador Márcio França que é alvo de operação da Polícia Civil nesta manhã de quarta (5) sob a suspeita de participar de esquema na saúde - Bruno Santos/Folhapress

Policiais ouvidos pela Folha dizem que há gravações de conversas de Cláudio França e de um suposto testa de ferro utilizado para captação de recursos. Nos diálogos, eles discutiriam a porcentagem destinada a cada um dos integrantes do grupo.

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As investigações que colocam Márcio França sob suspeita de participação em uma organização criminosa são um desdobramento da operação Raio-X, desencadeada em setembro de 2020, quando foram expedidos pela Justiça 64 mandados de prisão temporária e 237 mandados de busca e apreensão.

Há a suspeita de que o grupo desviou mais de R$ 500 milhões dos cofres públicos. Até agora, 48 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público e, dessas, 19 foram condenadas pela Justiça.

O esquema, conforme informado à época, estendia a cidades paulistas e de outros estados como Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Pará. Neste estado, o próprio governador Helder Barbalho (MDB) estava entre os investigados e foi um dos alvos de operação desencadeada pela Polícia Federal naquele ano.

Na ocasião, foram apreendidos 20 veículos, três aeronaves e R$ 1,2 milhão em dinheiro. O mais importante para investigação foram os computadores confiscados, com os quais os policiais conseguiram apurar as movimentações financeiras e, também, os caminhos que levaram à família França.

Entre alvos dos mandados de busca em 2020 estava um funcionário do gabinete do vereador Eliseu Gabriel, do PSB, mesmo partido de França. As buscas foram realizadas em salas da Câmara Municipal de São Paulo. O parlamentar não era investigado.

Apontado como chefe do esquema inicial, o médico Cleudson Garcia Montali, de Birigui, foi condenado a 104 anos de prisão por uma série de irregularidades nos contratos com equipamentos de saúde de 27 cidades, incluindo Santas Casas. Ele também foi condenado a ressarcir os cofres públicos em R$ 947 mil.

Para a polícia, a família França e Montali estão ligados nesse esquema.

Márcio França posa para foto com prefeito e empresário
Então vice-governador Márcio França (PSB) participa de jantar oferecido por médico Cleudson Garcia Montali (à dir), condenado por chefiar esquema criminoso - 11/05/2017 - Prefeitura de Birigui

Em dezembro de 2018, às vésperas de deixar o Palácio dos Bandeirantes, o então governador Márcio França aliviou uma punição administrativa de Montali. O pessebista foi derrotado naquele ano em disputa em segundo turno com o tucano João Doria.

O médico, então diretor regional de saúde, havia sido punido com demissão "a bem do serviço público" por irregularidades consideradas graves pelo próprio governo, investigação aberta a reboque do Ministério Público.

Entre as irregularidades apontadas, Montali teria contratado, como coordenador médico da Santa Casa de Araçatuba, uma clínica da qual era sócio e, ainda, cobrado por serviços não prestados. Para o governo, o contrato dele "foi manejado como sofisticado instrumento de apropriação de recursos públicos".

De demissão, França abrandou a pena para suspensão dos trabalhos por 30 dias. Esse mesmo pedido (para redução da pena) havia sido negado pelo então governador Geraldo Alckmin (PSDB) em dezembro de 2015.

Em 2020, quando era candidato a prefeito de São Paulo, França negou irregularidades e afirmou ter seguido pareceres internos que consideravam ser a decisão mais justa a tomar.

Dias antes dessa decisão, conforme ele mesmo confirmar, França havia viajado de avião para o interior de São Paulo junto com Montali.

Em maio de 2017, França, como vice-governador e secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado, viajou para Birigui onde, segundo a prefeitura, ele visitou a Santa Casa local e, também, participou de um jantar promovido pelo médico Montali.

França é um dos pré-candidatos ao governo paulista e, segundo números do Datafolha, oscila entre 13% e 19% das intenções de voto, em terceiro ou segundo na disputa, atrás de Alckmin e Fernando Haddad (PT), mas à frente de Rodrigo Garcia (PSDB), candidato de Doria à sucessão

No período em que França foi vice-governador, entidade ligada a Cláudio França, o Instituto Sócrates Guanaes, uma entidade sem fins lucrativos, foi contratada pelo estado para administrar os hospitais regionais de Itanhaém e de Registro.

O contrato do hospital de Itanhaém, de R$ 290,7 milhões, foi assinado em junho de 2017 por um período de cinco anos. Em 2018, Cláudio foi nomeado assessor técnico do hospital.

O contrato do hospital de Registro, de R$ 539,4 milhões, é de 4 abril de 2018 e também válido por cinco anos. Ambas as contratações foram realizadas sem licitação. As organizações interessadas em fazer a gestão dos hospitais foram convidadas por meio de um processo chamado "convocação pública".

Na época, França negou irregularidade.

Folha tenta contato com as defesas da família França.

terça-feira, 4 de janeiro de 2022

ESPER KALLÁS O experimento ômicron, FSP

 Sem deixar de lamentar o enorme sofrimento causado pela pandemia de Covid-19, e por nosso despreparo diante dela, nos deparamos com a extraordinária trajetória do vírus Sars-CoV-2.

Ao tentar se estabelecer como um vírus perene nos humanos, seu novo hospedeiro desde o fim de 2019, vem se adaptando para cada vez cumprir melhor este papel. No início, transitou livremente, em
solo virgem, pela ausência de defesa natural preexistente nas pessoas.

Com o tempo, desenvolveu e fixou pequenas alterações em sua sequência genética: as mutações. A grande maioria destas não resulta em vantagens para o vírus, mas algumas ajudam em sua disseminação. Quando isso acontece, a nova variante consegue se espalhar.

O ano de 2022 chegou com a dúvida de como a variante ômicron atingirá o planeta
O ano de 2022 chegou com a dúvida de como a variante ômicron atingirá o planeta - Roberto Schmidt - 31.dez.21/AFP

Qual característica favorece uma variante? Sua maior capacidade de se multiplicar e, consequentemente, ser transmitida, a coloca em vantagem na "corrida", fazendo que prevaleça sobre as demais.

Tem sido assim até agora. O vírus vem sofrendo adaptações desde o início da pandemia, permitindo o surgimento de variantes com capacidade crescente de transmissão. Depois do vírus original, que causou a primeira onda, apareceu a variante alfa, que se alastrou rapidamente.

No Brasil, provavelmente a partir da região Norte, a gama se estendeu para o restante do país, deslocando as variantes anteriores. Mas foi a variante delta que demonstrou ser capaz de substituir todas as anteriores, tornando-se responsável por mais de 95% dos casos de Covid-19 no mundo todo.

Enquanto ainda nos assombra a potência de disseminação da variante delta, a ômicron, com número inédito de mutações, vem demonstrar que a adaptação do vírus pode ir além, adicionando capacidade de transmissão sem precedentes.

A nova variante está substituindo a delta a passos ligeiros. Além disso, acumulam-se evidências de que se trata de uma variante menos agressiva, especialmente em vacinados.

Poderia, a rápida disseminação da ômicron, substituir as variantes mais agressivas e letais ou somente acobertará por um tempo a disseminação da delta? Poderia servir de um estímulo à defesa, como uma vacina de vírus "enfraquecido", ajudando a controlar a pandemia?

As avaliações cuidadosas, principalmente sobre casos de internações e mortes relacionadas à Covid-19, trarão respostas. E aqui cabe lamentar a incapacidade atual do Ministério da Saúde em compilar e disponibilizar dados, fazendo o país navegar no escuro.

Em outros países, a ômicron causa ciclo explosivo de transmissão, de aproximadamente dois meses. Entretanto, a velocidade e o preço que cobrará em internações e mortes pode variar, especialmente pela percentagem de vacinados na população.

É fundamental que todos encarem a ômicron com o máximo de cautela. A história ensina a não subestimar a natureza que, frequentemente, reserva surpresas. Basta lembrar da epidemia de Zika em 2015. O que parecia ser uma doença febril banal, revelou-se devastadora para muitos bebês nascidos de gestantes infectadas.

Estudar com profundidade o que está se passando é a única alternativa aceitável.

Verificar o comportamento da nova variante, buscando soluções mesmo que possam parecer desnecessárias.

Afinal, é para aliviar o sofrimento humano, salvar vidas e prolongá-las com qualidade que as ciências biomédicas têm buscado contrapor a seleção natural Darwiniana.

Tomara que em 2022 os brasileiros reconheçam os investimentos em educação, ciência e saúde como prioritários. Assim, em importante ano eleitoral, todos podem cobrá-los de candidatos a gestores.

Só assim o Brasil terá um presente e um futuro melhores.