DIEGO ZANCHETTA - O ESTADO DE S. PAULO
06 Dezembro 2014 | 17h 02
Eles reclamam do fim das vagas para carros, dos riscos para a segurança e da falta de planejamento
"Eu surtei quando vi a faixa da Prefeitura”, afirma a médica Célia Funari, de 47 anos. A indignação começou depois da circulação de um comunicado do governo municipal aos moradores do Jardim Paulista, no final de novembro, sobre a chegada de uma ciclovia na Rua Honduras, travessa residencial com casas de alto padrão na zona sul de São Paulo. Moradora na rua, Célia mandou carta aos vizinhos pedindo apoio contra a iniciativa. Em dois dias, ganhou adesão em massa.
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Resistência igual à da Rua Honduras também é observada em outras regiões nobres da capital. Moradores dessas áreas estão indo ao Ministério Público Estadual (MPE) e até a delegacias registrar queixa contra a pintura das faixas sem consulta prévia.
No Alto da Boa Vista, também na zona sul, moradores foram à Promotoria de Habitação contra a ciclovia na Rua Fernandes Moreira. Em Higienópolis, na região central, o Conselho de Segurança (Conseg) registrou boletim de ocorrência e ameaça mover ação contra a futura ciclovia de 5 quilômetros que vai passar embaixo do Minhocão, prevista para o ano que vem.
Esses moradores argumentam que nenhuma intervenção pode ser feita nos bairros residenciais sem a aprovação dos proprietários de imóveis da via afetada. Eles afirmam que os bairros residenciais estão protegidos pelo novo Plano Diretor, aprovado em julho.
Erros. Um inquérito foi aberto pela promotora Camila Mansour Magalhães da Silveira para investigar erros na criação das faixas. Mas, para o governo, as regras de tombamento desses bairros residenciais valem apenas para imóveis e calçadas, e não para o viário urbano, administrado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).
“Ninguém nos perguntou nada. Simplesmente chegaram e colocaram a faixa. Se eu fizer um jantar e quiser receber meus amigos, onde eles vão parar? Na casa do (prefeito) Haddad?”, questiona a médica que articulou o movimento contra a ciclovia na Rua Honduras. Ela e os vizinhos reclamam da iniciativa do governo, mas ressaltam não serem contra os ciclistas.
“Não passa ninguém de bicicleta na rua. O movimento de carros é muito grande, é até um risco para os ciclistas. Ninguém é contra ciclovia, mas o ponto aqui é o seguinte: ninguém anda de bicicletas e não existe essa demanda”, frisa a economista Ana Brescia, de 49 anos. Para Ivany Zarzur, de 70 anos, a ciclovia não pode existir na Rua Honduras. “Aqui é zona 1 (estritamente residencial), não pode ter essa bagunça. Não temos estrutura. Na Europa as ciclovias são nas calçadas. Aqui as pessoas ainda não têm educação”, pontua Ivany.
Privilégio. Administradora da Sociedade Amigos dos Jardins, Dora Livolsi, de 67 anos, defende que pagadores de um Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) tão alto (média de R$ 10 mil por ano), como os da Rua Honduras, precisam ter algum privilégio. “Eles não podem perder o direito de estacionar os carros nas ruas. E a ciclovia vai atrair assaltantes”, afirma Dora, que defende a criação de uma ciclorrota no bairro, sem a pintura de faixas. “Até uma Zona Azul seria melhor.”
Alguns moradores da Rua Honduras também temem assaltos por causa da faixa. “Quem anda de bicicleta não presta, hoje nós sabemos disso. São pessoas não qualificadas. Então vamos ficar sujeitos a esses riscos aqui?”, questiona o aposentado Francisco Augusto da Costa Porto, de 74 anos.
As ciclovias começaram a chegar às zonas residenciais no final de setembro. No Alto da Boa Vista, na zona sul, moradores tentaram, durante um mês, audiência com o governo para reclamar da via exclusiva da Rua Fernandes Moreira. Sem serem atendidos, foram ao MP. Eles reclamam principalmente do fim das vagas de estacionamento. O local também costuma alagar durante as chuvas de verão.
“Nós demos outras quatro opções em vias paralelas. A faixa aqui é muito estreita”, afirma a moradora Renata D’Angelo, de 41 anos. Ela também faz questão de ressaltar que não é contra a pintura de faixas para ciclistas no seu bairro. “Eu sou ciclista também. O que nós tentamos mostrar à Prefeitura, e não conseguimos ser atendidos, por isso fomos ao Ministério Público, é o risco que essa ciclovia oferece aos usuários.”
Com o mesmo argumento de que a ciclovia não é segura, moradores da Alameda Guatás, no Planalto Paulista, outra área estritamente residencial na zona sul, pedem mudança no traçado da faixa, inaugurada em outubro. “A ciclovia, do nada, termina e vira uma faixa de ônibus. E quem está na bicicleta nem percebe isso”, reclama o estudante de Publicidade Alberto Rodrigues, de 19 anos, morador do Planalto Paulista e usuário da faixa. / COLABOROU RAFAEL ITALIANI
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