Coluna Econômica - 26/12/2011, por Luis Nassif
Do ponto de vista histórico, 2011 representa o final de um ciclo que se inicia com a eleição de Tancredo e passa pelos governos Collor, FHC e se completa com o governo Lula.
Nesse período, o país superou uma inflação crônica, um desequilíbrio fiscal renitente e, sob as luzes de uma Constituição histórica, entrou definitivamente na modernidade. Massificou modernas ferramentas de gestão, assumiu a inovação como valor maior, consolidou um mercado de capitais pujante e políticas sociais inclusivas, que permitiram ingressar definitivamente na era da democracia de massa.
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Nessa longa travessia, o grande desafio era manter coeso o tecido político, exposto a modelos tortos de financiamento de campanha, a um federalismo algo manco e a uma mídia no eixo Rio-São Paulo-Brasília em um processo insano de mostrar músculos através da derrubada de presidentes – derrubou Collor, tentou com FHC e Lula.
A habilidade política de FHC e Lula foi fundamental para completar o ciclo. Coube a FHC criar a tecnologia política do presidencialismo de coalizão, domando o fisiologismo com algumas concessões, em troca de espaço para consolidar políticas.
Depois das cabeçadas do primeiro governo, Lula incorporou as lições e deu partida para o mais relevante desafio político do século: a incorporação de milhões de pessoas ao mercado de consumo e mercado político e a administração dos conflitos inevitáveis nesses momentos de tensão.
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No século 19, foi a criação desse mercado de consumo popular que permitiu aos EUA se preparem para se tornar a mais importante economia do planeta. Mas custou a guerra da Secessão.
Na Europa dos anos 20, o rápido processo de urbanização criou curtos circuitos enormes, que acabaram resultando na psicologia de massa do fascismo.
No Brasil, todo processo de inclusão em regime democrático resultou em crises continuadas: no início da República, nos anos 20, no período 1950-1965.
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A recuperação do salário mínimo na Previdência e o Bolsa Família ajudaram a deflagrar o mais abrangente movimento de inclusão social do país, de uma dimensão inédita, com repercussão nas novas classes sociais, no desenvolvimento regional, na escala de produção das empresas. No bojo dessa revolução, grandes empresas brasileiras tornaram-se multinacionais, a diplomacia comercial avançou sobre o Oriente Médio, África, América do Sul.
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O grande mérito de Lula foi ter feito um pacto abrangente, tanto no plano político quanto econômico. Entregou o Ministério da Agricultura para homens do setor, o Banco Central para o mercado, vários ministérios sociais para os movimentos populares, o BNDES para as grandes empresas brasileiras, o Sebrae para as pequenas.
Houve um custo alto, especialmente na manutenção de taxas de juros escandalosamente elevadas. Mas, graças a essa estratégia, Lula logrou chegar ao final do mandato completando o ciclo de inclusão com o país em paz, unido.
O ponto final nesse período e o início do novo ciclo dependeria fundamentalmente de como se daria a sucessão de Lula.
Ao completar o primeiro ano de governo com os índices atuais de aprovação, Dilma Rousseff confirma que Lula acertou sua última aposta.
Os próximos desafios
Até agora, Dilma mostrou ser capaz de consolidar o modelo Lula, de criação de um forte mercado de consumo interno. É bom, mas é pouco. Para inaugurar oficialmente a próxima etapa do país, terá que promover um salto qualitativo no planejamento estratégico do país, conduzir uma reforma política à altura dos novos tempos, preparar o Estado brasileiro para o grande processo de consolidação do novo desenvolvimentismo.
O desafio do câmbio e juros
No política econômica, Dilma terá que ser mais ousada no desmonte da armadilha juros-. O BC deu início a um desmonte lento e gradual, que passa pela redução da taxa Selic e algumas medidas visando impedir a apreciação cambial. No máximo pretende-se um câmbio menos apreciado, mas ainda em níveis que impedem um salto de competitividade da produção brasileira. Cada dia de câmbio apreciado é um dia a menos na entrada na nova etapa.
A criação de uma nova oposição
O fim político de José Serra abre espaço para a reconstrução da oposição, ponto central para a alternância democrática. O importante é que movimentos de oposição e situação não se situarão em polos opostos. Hoje em dia há consenso sobre a importância da responsabilidade fiscal, do controle da inflação, da busca do desenvolvimento e, acima de tudo, dos compromissos sociais de eliminação da pobreza.
Se Serra tivesse vencido - 1
O maior risco que a democracia brasileiro enfrentou, desde a redemocratização, foi a eventualidade da eleição de José Serra. Nenhum outro candidato do PSDB – Geraldo Alckmin, Aécio Neves – ou do PT representaria risco de desestabilização política. Serra, sim. Ao contrário de FHC e Lula, tem um estilo autoritário, vingativo, incapaz de conviver com o contraditório e incapaz de administrar realidades complexas, como um país.
Se Serra tivesse vencido – 2
A revelação de seu estilo subterrâneo, de recorrer a brigadas de arapongas, levantando dossiês contra adversários e aliados – Paulo Renato de Souza, Aécio Neves – comprovam que, eleito, Serra lançaria o país em uma crise política interminável. Pior: as revelações do livro “A Privataria Tucana” mostram que seria um presidente extremamente vulnerável, facilmente exposto a um processo de impeachment.
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