O paulistano não percebeu, mas foi dada a largada para mais uma eleição de prefeito de São Paulo. É a oitava desde a redemocratização, e a primeira sem favoritos nem estrelas. Em quase três décadas, nunca houve uma eleição majoritária na cidade sem Suplicys, Malufes e Serras. E a renovação não fica por aí. É uma disputa sem outros caciques. Os candidatos são todos índios - uns menos anônimos do que outros, é fato, mas nenhum comanda uma tribo própria.
E os 20% de Celso Russomanno (PP), ou os 15% de Netinho de Paula (PC do B) na mais recente pesquisa Datafolha? Essas taxas entram mais na categoria recall do que na de intenção de voto. São um apelo desesperado do eleitor à própria memória diante de uma lista de ilustres desconhecidos. Dá até para imaginar o entrevistado pensando: "Ah, desse eu já ouvi falar".
Quando o pesquisador aparece com uma pergunta que o entrevistado não sabe responder, muitos respondem mesmo assim - seja para agradar o entrevistador, seja por vergonha de admitir ignorância. Cabe a quem analisa o resultado discernir o que é voto firme de simples efeito lembrança. O eleitor responde a pesquisas com a memória, mas vota com outras partes do cérebro.
O dado mais relevante da pesquisa Datafolha é que nenhum pré-candidato é citado espontaneamente por mais do que 1% ou 2% dos paulistanos. Os nomes mais ditos de pronto são os de Marta Suplicy (PT), com 8% de citações espontâneas, e o do prefeito Gilberto Kassab (PSD), com 3%. Graças à Lula e à legislação, ambos estão fora do páreo.
No cenário aplainado pelo anonimato coletivo dos prefeituráveis, outras forças, que não o carisma pessoal, comandarão a eleição. A atual geração de eleitores paulistanos verá a primeira campanha que não é uma disputa de personalidades. Sem intimidade com os candidatos, o voto não deverá ser apenas na pessoa física. Afinidades e antipatias pessoais serão secundárias no processo.
Quais vetores levarão o eleitor a confirmar este ou aquele nome na urna eletrônica, então?
Em regra, o prefeito de turno é um forte cabo eleitoral. Não é o caso de Kassab. Com apenas 20% de "ótimo" e "bom" contra 40% de "ruim" e "péssimo", o prefeito paulistano transfere mais ônus do que bônus para seu candidato. A curva de popularidade de Kassab é um espelho invertido do seu primeiro mandato. A recuperação de 2006 a 2008 virou franca decadência nos últimos três anos. Nada indica reversão dessa tendência. O trânsito está cada vez pior, não há melhorias sensíveis na saúde nem na educação.
Na eleição passada, o prefeito candidato à reeleição vinha em ascensão e usou a propaganda eleitoral para melhorar ainda mais a imagem de sua gestão. Desta vez, nem muito tempo de TV o candidato de Kassab terá. Se a Justiça não mudar as regras, o nome do PSD ficará no bloco dos nanicos. Só lhe sobra o dinheiro, que é suficiente para atrair políticos para uma nova sigla, mas não compra, nem metaforicamente, os votos necessários para eleger o prefeito num colégio eleitoral de mais de 7 milhões de almas.
Apesar do esforço comovente do governador Geraldo Alckmin (PSDB) no sentido oposto, a gestão de Kassab tem tudo para ser a Geni da campanha eleitoral de 2012. Essa é a primeira desvantagem dos pré-candidatos tucanos. Enquanto seus adversários estão livres para criticar um prefeito cada vez mais impopular, os quatro são pressionados pelo governador a pegar leve com o possível futuro aliado.
A segunda desvantagem é que enquanto outros partidos trabalham há meses para dar visibilidade aos seus respectivos candidatos quase anônimos, o PSDB patina para escolher o seu entre nomes que oscilam de 2% a 6% na pesquisa estimulada do Datafolha. Tempo é voto nesta eleição.
Antecipando que a sucessão paulistana seria a mais simbólica entre todos os 5.565 pleitos de 2012, e que a disputa se daria entre desconhecidos, Lula atropelou o PT e impingiu Fernando Haddad ao partido. O ministro da Educação não passa de 4% na estimulada, mas terá o ex-presidente e Dilma Rousseff como padrinhos. Mais importante, conta com o apoio da máquina eleitoral petista.
Desde 1988, o candidato a prefeito do PT sempre foi um dos dois primeiros colocados na eleição paulistana. Por esse retrospecto, Haddad só precisa se fazer conhecido entre militantes e simpatizantes do partido para chegar ao 2.º turno. A questão é: quem mobilizará o antipetismo e ocupará a outra vaga no turno final? Tucanos, egressos do malufismo ou surgirá uma quarta força política na cidade?
A resposta passa pelo clima geral da opinião pública no momento da eleição (e, portanto, pelo ritmo do consumo/economia), pelo bom aproveitamento do palanque digital (TV + internet), pela impopularidade de Kassab e por um fator ainda pouco lembrado, mas muito importante: o efeito abandono.
Cresce a percepção entre paulistanos de que Kassab largou a cidade para se dedicar à política comezinha. O trauma se soma à renúncia de José Serra para disputar o governo paulista em 2006, menos de dois anos após ter sido eleito prefeito. A Prefeitura de São Paulo virou escada eleitoral. O cargo de prefeito perdeu importância, e a gestão da cidade ficou em segundo plano.
Ganhará votos em 2012 o candidato que conseguir convencer o eleitor que administrar São Paulo é seu maior objetivo na vida, e que se dedicar à cidade lhe é mais importante do que disputar outras eleições. O paulistano é bem capaz de eleger um síndico.
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