quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Condição de vida é ruim para 76% da população urbana do País, OESP





Novo levantamento do IBGE mostra em que situação vivem os brasileiros nas áreas urbanas do País e escancara desigualdade social










Roberta Jansen, O Estado de S.Paulo
20 Dezembro 2017 | 11h02
RIO – O IBGE divulgou nesta quarta-feira, 20, um retrato das condições de vida nas cidades brasileiras. Três em cada quatro pessoas não vivem em situação adequada no País. Se a renda é alta, falta saneamento básico, por exemplo.
Se há acesso a bens de consumo, como máquina de lavar, falta escolaridade, em outros casos. Ou falta tudo. A pesquisa classificou onze tipos de condições de vida, de A (a melhor) até a K (a pior).


Desigualdade - BRasil
Vista geral da favela de Paraisópolis, no bairro Morumbi, na zona sul de São Paulo, rodeada por prédios de alto padrão. Foto: Nilton Fukuda/Estadão
O resultado do estudo escancara a desigualdade brasileira. A cidade que tem a maior parcela da população vivendo nas melhores condições é Brasília – 11,2% do total. O Nordeste está na outra ponta: 59,9% dos habitantes vivem nas piores condições.
São Paulo está no meio do caminho: apenas 2,8% vivem muito bem, mas em compensação não há ninguém morando de forma mais precária, segundo os critérios do estudo. 
A nova publicação do IBGE classificou onze tipos de condições de vida a partir da análise de diversos critérios, como moradia, saneamento, escolaridade, rendimento e acesso a bens de consumo e internet em concentrações urbanas onde viviam 96,2 milhões de pessoas (metade da população brasileira) em 2010.
Na região Sul, está a maior parcela da população urbana (72,2%) em boas e médias condições de vida; enquanto as piores condições foram identificadas, no Nordeste (59,9%) e no Norte (56,3%). De forma geral, três quartos da população urbana (76,1%) não têm boas condições de vida nas cidades.
Embora não tenha acesso ao novo estudo do IBGE, o cearense José Barbosa de Araújo, de 61 anos, compreende bem o que os números querem dizer. Basta olhar para a casa de apenas um cômodo, localizada na área central de Fortaleza, onde ele vive com a mulher. Geladeira, armário, cama, fogão estão lado a lado no imóvel de um cômodo. Nada de máquina de lavar, nem computador. “Estou me virando desse jeito há 16 anos”, diz o vigia. 
Fortaleza está entre as cidades que concentram um porcentual considerável da população na pior categoria, a K: 0,6%, de acordo com o IBGE. Mas há situações mais dramáticas. O destaque negativo vai para São Luis (MA), com 15,8% da população vivendo nas piores condições, seguido de Boa Vista. São Paulo e Rio, por exemplo, não têm moradores enquadrados nessa categoria. 
De acordo com o novo levantamento, apenas 23,9% das pessoas que moram em cidades têm boas condições de vida (ou seja, foram classificados nas categorias A, B, C e D). E essas “boas condições” sequer estão presentes na maioria dos conglomerados urbanos.
A cidade com o maior porcentual de pessoas na categoria A é, disparado, Brasília. Depois vem Belo Horizonte, Rio, São Paulo, Florianópolis, Vitória, Porto Alegre, Campinas, Salvador, Fortaleza e Curitiba. E é só.
Ou seja, a grande maioria das cidades brasileiras simplesmente não tem um porcentual significativo de pessoas vivendo nas melhores condições. “As categorias A e B estão muito relacionadas ao poder aquisitivo mesmo”, diz o geógrafo do IBGE Maurício Gonçalves e Silva.
“Isso não quer dizer que não existam pessoas com rendimentos altos em outros lugares, mas sim que esse porcentual não é suficiente para saturar aquela área, ou seja, para caracterizar aquela parte da cidade como A ou B.” Na análise do especialista, a identificação desses padrões pode ser crucial para o planejamento urbano. / COLABOROU CARMEM POMPEU, ESPECIAL PARA O ESTADO

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Gilmar diz que TSE vai discutir limites para autofinanciamento de candidatos, OESP

BRASÍLIA - O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, afirmou que a corte deve discutir nesta segunda-feira, 18, os limites do autofinanciamento de campanhas em 2018.

Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal
Gilmar disse que irá verificar condições e que já havia pessoas no TSE que achavam que é necessário haver limite para doador comum. Foto: Carlos Moura/STF
Como mostrou o Estado, o TSE vai realizar nesta segunda uma sessão extraordinária para definir as resoluções que nortearão as eleições do ano que vem. O tema, no entanto, não estava nas minutas obtidas pela reportagem.
“Vamos verificar e ver como vamos encaminhar. Já havia, no TSE, gente que achava que tinha que ser o mesmo limite do doador comum”, disse Gilmar.
Na semana passada, o Congresso derrubou um veto do presidente Michel Temer sobre reforma eleitoral e proibiu os candidatos de doarem às suas campanhas o valor que quisessem.
Pelo entendimento dos parlamentares, os candidatos poderão colocar o mesmo valor fixado para as doações de pessoas físicas: 10% do rendimento bruto do doador do ano anterior à eleição. 
Técnicos do Congresso, no entanto, avaliam que a falta de um trecho específico para o autofinanciamento pode gerar maior insegurança jurídica. Com a regulamentação do TSE, essa dúvida deve ser dirimida.
Como se viu nas eleições 2016, o financiamento irrestrito beneficiou nomes como João Doria (PSDB), eleito prefeito em São Paulo. Ele doou a si mesmo R$ 4,4 milhões, o que representou 35% dos R$ 12,4 milhões arrecadados pela sua campanha. Por causa disso, a falta de limites ao autofinanciamento foi chamada de "emenda Doria". 
Propaganda. Como mostrou o Estado, o TSE promoveu audiências públicas para ouvir as propostas de grupos de trabalho na formulação das resoluções, que estão sendo fechadas pelo atual vice-presidente da Corte Eleitoral, ministro Luiz Fux. O jornal obteve acesso à última versão da minuta que trata sobre propaganda eleitoral, ainda sujeita a ajustes finais antes de ser levada ao plenário.
Para preservar a liberdade de expressão e evitar censura, o texto prevê que as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet “serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral”.
A minuta também determina que, salvo em circunstâncias excepcionais, a ordem judicial estipulará “prazo razoável”, não inferior a 24 horas, para a remoção do conteúdo, além de conter especificamente o link da página que sairá do ar. A propaganda na internet é permitida a partir do dia 16 de agosto do ano eleitoral.
Um grupo de trabalho que acompanhou as discussões propôs ao TSE a possibilidade de se retirar conteúdos postados por perfis falsos, ainda que as informações divulgadas sejam verdadeiras. A última versão da minuta não incorporou essa sugestão.
Para um ministro ouvido reservadamente pela reportagem, um robô - programas usados para multiplicar mensagens na internet - não tem legitimidade para impulsionar notícia nenhuma, seja ela falsa ou verdadeira.
Outra sugestão não incorporada foi a de proibir, em qualquer hipótese, a suspensão de funcionamento do aplicativo WhatsApp por violações à legislação eleitoral. Esses temas, no entanto, ainda poderão ser discutidos pelo plenário da Corte - as resoluções estão sujeitas a alterações até março do ano que vem. Procurado pela reportagem, o WhatsApp informou que não se pronunciaria.
O texto ainda fixa que o conteúdo “impulsionado” na internet deverá ser devidamente identificado aos internautas, com o CNPJ ou o CPF do responsável, além da expressão “propaganda eleitoral”.
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domingo, 17 de dezembro de 2017

O tempo perdido - GUSTAVO FRANCO ESTADÃO/O GLOBO - 26/11



O papel-moeda está em vias de extinção e o Rio se dedica a criar empregos de cobrador


Há algo de podre no modo como o Brasil trata o desperdício de tempo. 

Pouca gente se dá conta que, quando se mede a prosperidade nacional através do PIB, estamos falando de um fluxo de valor adicionado durante determinado período de tempo, geralmente um ano. 

Sabemos que a renda per capita do brasileiro foi de R$ 30,4 mil no ano de 2016, o que equivale a cerca de 25% da renda per capita americana. Isso é o mesmo que dizer que, em média, um americano produz quatro vezes mais que um brasileiro durante um ano. O Brasil parece não se preocupar muito com o tempo perdido ou com a produtividade, a julgar pelo noticiário recente. 

No município do Rio de Janeiro, por exemplo, a Assembleia aprovou o fim da dupla função do motorista de ônibus, com isso revivendo a figura do cobrador (isso foi aprovado com 40 votos a favor e um solitário voto contrário do vereador Leandro Lyra, do Partido Novo). Os autores do projeto estimam que 5 mil empregos serão criados pela medida.

O papel-moeda está em vias de extinção e o Rio de Janeiro se dedica a criar empregos de cobrador, o que é mais ou menos como proibir o Uber para atender aos taxistas, ou proteger indústrias que eram “nascentes” cinquenta anos atrás.

A lógica torta dessas medidas é semelhante à de uma ideia antiga e errada, pela qual a redução da jornada de trabalho faz aumentar o emprego (ou elevar o salário, via remuneração de horas extras). Na verdade, a redução na jornada funciona exatamente como uma redução de produtividade (um ano passa a ter menos horas trabalhadas, portanto, menos produção, como se tivéssemos mais feriados). E, se as horas são mantidas e apenas se tornam mais caras, é como se o governo criasse um imposto sobre o emprego, o que obviamente diminui a produção.

Nossa legislação trabalhista não tem como foco a produtividade, e por isso cria muitas distorções, que é preciso urgentemente rever. O tempo está passando, a China e a Coreia estão crescendo, e o Brasil está ficando para trás.

O tempo perdido também tomou conta da legislação tributária de forma devastadora. No ranking de ambiente de negócios feito pelo Banco Mundial, o Brasil ocupa a posição 125 em 190 países, um vexame. Pior ainda: em um dos quesitos dessa avaliação, o dos impostos, o Brasil está na posição 184 em 190 países e não é por que a carga tributária seja tão alta, mas por que uma empresa de 60 empregados gasta em média 1.958 horas (81,5 dias) anuais para pagar os tributos e cumprir as obrigações acessórias. 

Não há nada parecido com isso em nenhuma parte do planeta. É a Copa do Mundo em matéria de tempo desperdiçado.

Para completar o quadro, o Banco Mundial publicou dias atrás um relatório histórico sobre um assunto que interessa a todos: o gasto público.

O relatório identifica inúmeras “ineficiências”, que alguns descreveriam como “absurdos”, a soma das quais ultrapassando 7% do PIB, podendo chegar a 8,5%. Em dinheiro de hoje estamos falando de R$ 400 bilhões de potenciais economias decorrentes de cortes e reformas associadas a essas ineficiências.

A cifra é assustadora, mas não surpreendente, pois é da mesma ordem de grandeza da deterioração no superávit primário ocorrida na vigência da “Nova Matriz”. O que me preocupa é o conselho do Banco Mundial, cauteloso como sói acontecer com organizações multilaterais, pelo qual essas economias devam ser buscadas gradualmente até 2026.

Da parte deles, esta exasperante falta de pressa, na verdade, é pura delicadeza. Nós é que devemos nos perguntar por que, afinal, devemos tomar 10 anos para acabar com R$ 400 bilhões mal gastos? 

Os sentimentos nacionais com relação aos taxistas e cobradores, bem como para os detentores de privilégios e sinecuras identificados pelo Banco Mundial são muito confusos, incluindo o medo e a compaixão. Mas a principal razão de nossa apatia diante das dores do progresso parece mesmo ter a ver com um traço do caráter nacional que Machado de Assis atribuiu ao Conselheiro Aires: “Tinha o coração disposto a aceitar tudo, não por inclinação à harmonia, senão por tédio à controvérsia”.

EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA RIO BRAVO INVESTIMENTOS.