quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

57 municípios concentravam cerca de 50% do PIB do país em 2012, diz IBGE (não lido)


5,8% das cidades respondiam por 75% do PIB; seis capitais somavam 25%.
Participação das capitais (33,4%) foi a menor da série, iniciada em 1999.

Do G1, no Rio
A renda de 57 municípios dos 5.565 brasileiros concentrava cerca de metade de todas as riquezas do país em 2012. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados nesta quinta-feira (11), apenas seis capitais produziram, somadas, 25% do Produto Interno Bruto (PIB) de todo o país naquele ano.
São Paulo, que se manteve como o município que gerou mais renda no Brasil, teve a participação reduzida de 11,6% (em 2011) para 11,4% do PIB nacional. A capital paulista é seguida do Rio de Janeiro, com 5%, Brasília, 3,9%, Curitiba (1,3%), Belo Horizonte (1,3%) e Manaus (1,1%). Com 25% da renda, estes municípios representavam 13,6% da população do país.
De acordo com o IBGE, a diminuição na participação do PIB em São Paulo foi provocada principalmente pelo baixo desempenho da indústria de transformação. Em cinco anos, a perda chegava a 0,4 ponto percentual.
“Todos os seis municípios eram capitais e tradicionalmente identificados como concentradores da atividade de serviços – intermediação financeira, comércio e administração pública, exceto Manaus, cuja economia tinha equilíbrio entre as atividades de indústria (transformação) e serviços”, pontuou o IBGE.
Municípios        PosiçãoPIB / valores correntes
(em R$ mil)
São Paulo  (SP)R$ 499.375.401                                
Rio de Janeiro (RJ)R$ 220.924.561
Brasília (DF)R$ 171.235.534
Curitiba (PR)R$ 59.151.308
Belo Horizonte (MG)R$ 49.824.579
Manaus (AM)R$ 49.824.579
Porto Alegre (RS)R$ 48.002.209
Campos do Goytacazes (RJ)R$ 45.129.215
Guarulhos (SP)R$ 44.670.723
Fortaleza (CE)10ºR$ 43.402.190
Participação das capitais
No entanto, de acordo com o órgão, a participação das 27 capitais no país respondeu por 33,4% do PIB e voltou a ter o menor resultado desde o início da série, em 1999, quando era de 38,7%. Em 2011, as capitais detinham 33,7% da renda nacional, ante uma fatia de 34% em 2010.
Santa Catarina foi a única capital fora da primeira posição em seu estado. Itajaí ocupava a primeira posição com 11,1%, seguida de Joinville, 10,3%.
Goiânia e Aracajú subiram uma posição no ranking das capitais, de 0,67% para 0,69% e 0,22% nos dois anos, respectivamente, em relação ao ano anterior. As duas cidades ultrapassaram Vitória (de 0,68% para 0,65%) e Porto Velho (de 0,23% para 0,22%).
Dependência e autonomia
Na comparação de cada capital com o PIB dos estados, Santa Catarina se destaca como o estado mais autônomo, tendo Florianópolis contribuído, em 2012, com apenas 7,1% do PIB estadual. Em 2011, a capital detinha 6,8%.
Em 2012, as regiões Norte e Nordeste continuaram se caracterizando por uma dependência dos estados em relação às capitais, sendo a principal verificada no Amazonas: Manaus contribuiu com 77,7% do PIB estadual, apontou o IBGE.
Destaques fora das capitais
Excluindo-se as capitais, 11 municípios tiveram destaque em 2011 por gerar, individualmente, mais de 0,5% do PIB nacional, agregando 8,7% da renda do país.
Essas cidades com grande integração entre indústria e serviços eram: Campos dos Goytacazes (RJ), 1%, Guarulhos (SP) 1%, Campinas (SP), 1%, Osasco (SP), 0,9%, Santos (SP), 0,9%, São Bernardo do Campo (SP), 0,8%, Barueri (SP), 0,8%, Betim (MG), 0,6%, São José dos Campos (SP), 0,6%, Duque de Caxias (RJ), 0,6%, e Jundiaí (SP), 0,5%.
“O referido indicador para o Brasil mostrou que, em 2012, a média dos 10% dos municípios com maior PIB gerou 95,5 vezes mais renda do que a média dos 60% dos municípios com menor PIB”, analisou o IBGE.
MunicípiosPosiçãoPIB per capita
Presidente Kennedy (ES)R$ 551.967,24
Louveira (SP)R$ 285.619,15
Confins (MG)R$ 270.512,88
Triunfo (RS)R$ 230.483,69
Quissamã (RJ)R$ 230.344,73
São Gonçalo do Rio
Abaixo (MG)
R$ 227.885,15
Anchieta (ES)R$ 207.431,28
Porto Real (RJ)R$ 174.372,58
Araporã (MG)R$ 173.235,94
Campos de Júlio (MT)10ºR$ 167.736,94
PIB per capita
O município de Presidente Kennedy, no Espírito Santo, se manteve como o maior PIB per capita do país – produto interno bruto dividido pela quantidade de habitantes – em 2012, com R$ 511.967,24. O menor foi Curralinho, no Pará, com R$ 2.720,32. O PIB per capita brasileiro naquele ano foi de R$ 22.645,86.
“É relevante salientar que nem toda a renda gerada no município é apropriada por sua população residente, uma vez que a geração de renda e o consumo não são necessariamente realizados em um mesmo município”, ressaltou o IBGE.
Mais de 30% dos municípios do Estado do Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso e Rio Grande do Sul apresentaram PIBs per capita superiores ao nacional, enquanto nenhum município do Acre e Roraima mostrou essa característica.
Industria extrativa se destacou
Os municípios cujas economias estavam relacionadas às commodities minerais tiveram ganho de participação superior aos daqueles com indústria diversificada. “Os preços da indústria extrativa apresentaram crescimento significativo em 2012”, ressaltou o IBGE.
Em Campos dos Goytacazes, a participação no PIB nacional passou de 0,9% em 2011 para 1% em 2012, seguido de Cabo Frio (de 0,23% para 0,28%), Rio das Ostras (de 0,22% para 0,26%), Macaé (de 0,30% para 0,33%) – todos no Rio de Janeiro – e Presidente Kennedy (de 0,10% para 0,12%), no Espírito Santo.
O estado com maior variação positiva na indústria foi o Rio de janeiro (1,9 ponto percentual), em comparação com 2011, impulsionado pela extrativa mineral. A indústria extrativa gerou 4,3% do valor bruto. Em 2011, o setor gerava 4,1%. A variação positiva, segundo o IBGE, ocorreu devido à variação dos preços, 11,7%. Em termos reais, ocorreu queda de 1,1%.
A indústria em geral tanto em volume quanto em preços passou de 27,5% para 26% no valor adicionado bruto do pais. “Esse fato foi reflexo do fraco desempenho da indústria de transformação, tanto em volume (-2,4%) como em preços (-4,1%)”, analisou o órgão.
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Cidades com menores PIBs per capitaValores correntes
Curralinho (PA)R$ 2.720,32
Bacuri (MA)R$ 2.727,16
Novo Triunfo (BA)R$ 2.767,52
Bagre (PA)R$ 2.772,54
São Vicente Ferrer (MA)R$ 2.980,79
Fartura do Piauí (PI)R$ 3.107,68
Bujaru (PA)R$ 3.165,59
Curralinhos (PI)R$ 3.178,01
Muaná (PA)R$ 3.181,10
Timbiras (MA)R$ 3.186,38
Setor de serviços cresceu
O setor de serviços cresceu, em termos nominais, 8,1%, e apresentou crescimento real de 1,9%. Esse segmento passou a representar 68,7% dos valor adicionado bruto total em 2012 e foi beneficiado, segundo o IBGE, pelo aumento da massa salarial, expansão de crédito ao consumo, e desemprego baixo.
Apenas dois setores apresentaram quedas suaves: serviços de informação (devido ao efeito preço) e intermediação financeira (seguros, previdência e relacionados).
Suaves movimentos negativos foram verificados em todos os segmentos desse setor no Rio de janeiro (-0,2 pontos percentuais), com exceção de administração, saúde e educação públicas e seguridade social e educação e saúde mercantis. Minas Gerais apresentou ganhos em todos os segmentos do setor (0,2 pontos percentuais), exceto serviços de informação e demais serviços.
Menores PIBsValores correntes
(em R$ mil)
Santo Antônio dos Milagres (PI)R$ 8.343
Miguel Leão (PI)R$ 9.179
São Félix do Tocantins (TO)R$ 10.411
São Miguel da Baixa Grande (PI)R$ 10.627  
Aroeiras do Itaim (PI)R$ 10.677
São Luis do Piauí (PI)R$ 10.684
Tamboril do Piauí (PI)R$ 10.941
Viçosa (RN)R$ 10.980
Olho D'Água do Piauí (PI)R$ 11.005
Anhanguera (GO)R$ 11.070
Agropecuária
O crescimento nominal do valor adicionado bruto da agropecuária (2,8%), no ano de 2012, refletiu principalmente a elevação dos preços. O valor bruto da produção agrícola alcançou R$ 204 bilhões em 2012, um crescimento de 4,3% em relação ao ano anterior.
Entre os alimentos que mais tiveram incrementos no valor de produção destacaram-se milho e feijão (ambos cresceram 20,7%, algodão herbáceo (11,8%) e mandioca (10,5%).
As maiores variações positivas na distribuição estadual do valor adicionado bruto da agropecuária ocorreram em Mato Grosso (2,4 pontos percentuais), Goiás e Paraná (0,9 ponto percentual). Santa Catarina (1,2), São Paulo (1,1) e Minas Gerais (0,9) apresentaram as maiores variações negativas.
PIB cresceu 1%
Em 2012, o Produto Interno Bruto (PIB) a preços de mercado cresceu 6% nominalmente e 1% em termos reais, em comparação com o ano anterior, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em valores correntes, o resultado alcançado foi de R$ 4.392,10 bilhões.
A expansão do PIB foi resultado do crescimento de 0,9% do valor adicionado bruto a preços básicos e do aumento de 1,6% nos impostos, líquidos de subsídios, sobre produtos.
Desigualdade
O índice de Gini (medida de desigualdade de distribuição de renda) para o PIB em 2012 foi de 0,86% enquanto para o valor adicionado bruto da agropecuária, indústria e serviços foi de 0,61%, 0,90% e 0,86%, respetivamente. Segundo o IBGE, esses coeficientes se mantiveram praticamente inalterados desde 2004.

Pessoas estão mais ricas, mas vida hoje é mais pobre', diz filósofo


A vida virou uma carreira. As pessoas estão focadas o tempo todo no seu sucesso profissional. É preciso ganhar o máximo de dinheiro, ter uma família, casa grande -tudo junto. Consumismo, individualismo, carreirismo. A vida contemporânea, apesar dos avanços materiais, é mais pobre.
O diagnóstico é do filósofo canadense Barry Stroud, 79, professor da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA). Autor de obras sobre David Hume (1711-1776) e Ludwig Wittgenstein (1889-1951), sua especialidade é o ceticismo como filosofia -basicamente o oposto do que ocorre hoje com o pensamento dominante nos EUA e mundo afora.
Leitor de romances policiais e adepto de caminhadas, Stroud observa com pessimismo a rotina moderna de hiperconexão, que leva à dispersão e à falta de tempo para a reflexão. Aponta para a superficialidade dos jovens superricos, que só sabem comprar carros e barcos. E ataca o crescente poder das finanças.
Divulgação
O filósofo canadense Barry Stroud, professor da Universidade da Califórnia
O filósofo canadense Barry Stroud, professor da Universidade da Califórnia
Nesta entrevista, concedida em Campos do Jordão, onde participou do 16º congresso da Associação Nacional de Pós-Graduação de Filosofia, ele critica a universidade e os filósofos. Ela virou uma corporação. Eles estão se especializando em demasia, tendem a lidar com um universo estreito. "É como uma visão dentro de um túnel", afirma.
Seu livro "Engagement and Metaphysical Dissatisfaction" está em fase de tradução no Brasil (ainda sem prazo para a edição) e há planos de versão para o seu clássico "The Significance of Philosophical Scepticism".
*
Folha - Qual sua visão do momento atual?
Barry Stroud - Sociedades divididas do ponto de vista econômico estão se dirigindo para extremos. Os ricos estão ficando mais ricos, enquanto os pobres mais pobres. É o que está acontecendo nos EUA e na Europa. O que mudou nos últimos 20 anos é o tremendo poder das finanças, que funcionam um pouco como uma jogatina. O grande produtor de riqueza nesses países não é o real produtor de bens. Há poucas razões para achar que isso não vai continuar, pois falta regulamentação nesses mercados.
Como esse quadro se reflete na maneira como as pessoas pensam no mundo?
Encoraja as pessoas que não têm muito a tentar viver o tipo de vida que eles acham que aqueles que ganham muito dinheiro têm. É focar em ganhar vantagem. Consumismo e individualismo. A pressão para o avanço profissional e o sucesso é muito profunda, principalmente na cultura norte-americana. Sou professor em uma das melhores universidades do mundo. Ensino filosofia, área que não significa ficar rico. Mesmo meus melhores alunos são forçados a pensar neles como iniciantes de uma carreira profissional, são focados no carreirismo em detrimento do verdadeiro assunto de seu estudo. Mesmo entre professores isso ocorre e é terrível. Há uma grande profissionalização na sociedade. Não quero dizer que as pessoas não estejam fazendo trabalhos sérios em suas áreas, na ciência, por exemplo. Mas o que as pessoas que estão fazendo isso pensam de suas vidas? Elas pensam nas suas carreiras profissionais.
Após a Segunda Guerra Mundial o pensamento dominante era diferente. É correto dizer que havia mais solidariedade?
Sim. Muitas pessoas que não eram de classe média prosperaram. Foram consumistas de certa forma, mas havia a ideia de fazer tudo aquilo em conjunto; houve movimentos e avanços sociais. Havia pessoas ricas, mas não tantas comparado ao que existe hoje. Existia mais igualdade, melhor distribuição de riqueza. Mas, nos anos 1960, começou a destruição gradual dos sindicatos afetando os movimentos de classe média que tinham sido inspiradores. Quando comecei a lecionar em Berkeley, grupos iam para o Sul dos EUA para apoiar os negros, ocorriam protestos contra a guerra do Vietnã, havia uma oposição generalizada mobilizando a classe média. Não sei se alguma coisa parecida poderia acontecer agora.
Por quê? O que mudou?
Mais pessoas estão mais preocupadas em olhar para si mesmas. Não estão inclinadas a se engajar em movimento sociais. O Occupy Wall Street foi uma tentativa, mas não havia um alvo reconhecível. Pedir para o mercado financeiro parar o que eles estão fazendo? Eles não param porque há manifestação. É muito difícil achar um tema que possa se transformar em um movimento social forte nos EUA. Eu estava em Berkeley quando do movimento pela liberdade de expressão. Em 1968, durante a guerra do Vietnã, houve protestos enormes, a polícia jogou gás lacrimogêneo, foi uma guerra. Isso é nostalgia. É difícil imaginar isso nos dias de hoje. Estudantes protestam contra isso ou aquilo, mas geralmente são temas locais.
Qual a influência da situação econômica mundial no ceticismo, que é o seu objeto de estudo?
Ceticismo é uma palavra que aparece na vida cotidiana. Não se toma nada como garantido. Na filosofia, tem um significado mais especifico, que não está desconectado do sentido popular do termo.
A ideia, originária dos gregos, era olhar com cuidado para as coisas. Na Grécia, havia os que pensavam que existia uma única maneira de viver -dentro de uma forma muito racional e organizada. Era preciso achar esses princípios e segui-los para ter uma vida de sucesso. Os céticos defendiam a ideia de que não há de fato esses princípios, que são, na maior parte, defensivos. Diziam que alcançavam uma vida diferente daquela forma racional e ordeira. Que isso lhes dava uma certa paz e satisfação que não era atingível em outra concepção de vida -que sempre estabelece que é preciso viver assim ou assado.
Hoje há revistas populares de ceticismo que geralmente são antirreligiosas. Não é disso que se trata o ceticismo no terreno da filosofia. O ceticismo como forma de vida não toma as coisas como garantidas, não há procura de princípios para formas de vida. Falando assim, parece um discurso dos anos 1960. Você vai com o fluxo das coisas. Em certo sentido, o profissionalismo na atual vida norte-americana é o oposto do ceticismo. Hoje o que vigora é o princípio de que o que se deve tentar fazer na vida é ganhar o máximo de dinheiro. Ficar rico, ter uma família, uma casa grande, tudo junto. É a ideia de que a vida é uma carreira, esse é o objetivo. O Brasil é provavelmente o maior lugar para viver a vida que eu conheço. Aqui mais filósofos e historiadores estão interessados em conhecer o ceticismo.
Como se encaixa nesse pensamento dominante a ideia do empreendedorismo?
É o objetivo definitivo do norte-americano: ser um empreendedor. Isso envolve risco e ousadia e é inatingível para a maioria das pessoas. Bill Gates teve ideias brilhantes quando era estudante em Harvard. Não se importou em concluir a faculdade; saiu para colocar suas ideias em prática. Aí surge o pensamento de que não é preciso ter educação. Mas quantas pessoas são como ele? O empreendedorismo é parte disso tudo. Agora está no setor financeiro. Você tem que ser um executivo rico de um fundo como prova o sucesso. É o empreendedorismo financeiro no lugar do empreendedorismo de negócios produtivos.
Existe também a ideia de que o indivíduo é o único responsável pelos seus fracassos, sem considerar a situação social, econômica e política, certo?
Exato. Essa é a mentalidade norte-americana. É o que falam para as pessoas pobres, com baixa escolaridade, muitas vezes negros e hispânicos. Que é responsabilidade delas. Vejam o que eu fiz!
Houve alguma mudança nessa mentalidade após a crise?
Difícil dizer. As pessoas com muito dinheiro não podem dizer que sofreram muito com a recessão de 2008 porque os seus bancos foram resgatados com o dinheiro público. Muitas pessoas perderam seu dinheiro, suas casas e ficaram desempregadas. Estão desesperadas. Como seria possível colocar essas pessoas juntas? Qual seria o foco? De outro lado, há pessoas prosperando nos EUA. É o que se vê nos filmes, que apresentam o modelo para se viver. Olhe para essa casa!
Como o sr. analisa o movimento filosófico pelo mundo?
A filosofia, que é um vasto campo com uma longa história, também está ficando muito profissionalizada. Envolve temas como conhecimento, natureza das coisas, modos de viver, organização da sociedade, política. A filosofia que está sendo feita em universidades quem mais pagaria para ver filósofos filosofarem? seguiu os princípios de organização das ciências. E as ciências tomaram o caminho da especialização. Pessoas trabalham nessa pequena parte da física ou nessa pequena parte do cérebro. Avanços são obtidos assim. Não acho que isso funcione tão bem na filosofia. Professores organizam suas carreiras para produzir o máximo que puderem para demonstrar que são muito ativas. É como a filosofia e outras humanidades estão funcionando. As pessoas escolhem uma pequena área para trabalhar. Um fica especializado em Jane Austen e escreve livros sobre ela. A profissionalização é boa, mas leva a estreitar os assuntos. Pior: as pessoas ficam nesses universos estreitos e não precisam saber de mais nada para fazer o que fazem. É como uma visão dentro de um túnel.
O problema está nas universidades?
Estou na mesma universidade há mais de 50 anos. Foi o único emprego que eu tive. Vi que ela mudou tremendamente. Virou uma corporação. A GM é uma corporação e faz carros. O que a universidade faz? Na universidade, estudantes entram e saem, mas o foco é na corporação, não naquele produto. Mas temos que ter estudantes com sucesso. O que são eles? São aqueles que passam pela universidade e pegam bons empregos, pois obtêm conhecimento técnico. A universidade tem cada vez mais a função de ser um lugar por onde os alunos passam quatro anos para entrar no mercado de trabalho.
Mas os alunos não estão aprendendo?
Sim. Porque muitos sabem o que eles querem saber quando terminarem o curso. Estão aprendendo habilidades. Isso se enquadra no carreirismo. Não é que tenha havido um tempo em que não havia o carreirismo. Mas hoje parece que ele é a única coisa.
Filósofos ganham dinheiro nos EUA?
Na universidade o salário é bom. Não há praticamente outros lugares para trabalhar como filosofo. A lógica, um segmento da filosofia, fez parte da revolução dos computadores. Alguns de meus alunos de lógica, nos anos 1960, foram por esse caminho, não como filósofos, e fizeram muito dinheiro. Foram parcialmente fundadores da revolução dos computadores. Nesse sentido, aquele foi um bom tempo para ser filosofo.
O fato de as pessoas hoje estarem sempre conectadas muda a forma de pensar?
Drasticamente. A atenção das pessoas é menor hoje, elas leem menos. Quase nenhum dos meus colegas lê livros em papel. Suponho que muitos dos meus alunos nunca tenham segurando um livro. As pessoas leem na tela. Outro dia um colega me disse que ninguém lê livros se pode dar um Google. É perturbador. Além disso, o foco é na cultura visual. Na filosofia, as pessoas dão palestras com Power Point. Não uso isso.
Em geral, há menos tempo para a reflexão?
Sim. As pessoas gastam tempo nenhum em reflexão. Raramente se vê pessoas sozinhas andando sem estar com fones de ouvido, telefones. Vejo isso da janela do meu escritório no campus. Conto quantos estão sozinhos sem falar ao telefone. O número é muito pequeno.
O sr. está otimista ou pessimista?
Sou pessimista. As pessoas vivem melhor do que há 50 anos. Os negros, apesar de ainda estarem pior do que os brancos, vivem melhor. Mas, na vida contemporânea nos EUA, a maioria das pessoas têm vidas menos ricas do que as que viviam confortavelmente há 50 anos. Suas vidas são menos ricas -não economicamente. As pessoas pensam em preencher suas vidas com coisas, não têm interesses variados, veem TV -que é terrível. Ler livros, ver pinturas, escutar música olhar a paisagem, caminhar pela natureza -tudo isso trazia uma vida mais rica do que ficar em frente à TV, falar ao celular, entrar em redes sociais. A amizade mudou. Hoje é clicar no computador. Amizade não é mais uma coisa rica, de falar, olhar e fazer coisas junto.
Minha filha trabalhou numa empresa de desenvolvimento de programas de computador. Muitos de seus colegas têm em torno de 20 anos e ganham muito dinheiro. Perguntei a ela o que eles fazem com tanto dinheiro. Ela me disse: apenas compraram o que seriam brinquedos. Mas brinquedos grandes: vários carros, barco, sem falar nas traquitanas tecnológicas. Trabalham muito; não têm tempo para viajar. São apenas crianças grandes com a chance de fazer o que quiserem. E o que eles fazem é comprar objetos. É uma vida superficial. 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Moradores de áreas nobres da capital acionam MP contra ciclovias de Haddad


DIEGO ZANCHETTA - O ESTADO DE S. PAULO
06 Dezembro 2014 | 17h 02

Eles reclamam do fim das vagas para carros, dos riscos para a segurança e da falta de planejamento

"Eu surtei quando vi a faixa da Prefeitura”, afirma a médica Célia Funari, de 47 anos. A indignação começou depois da circulação de um comunicado do governo municipal aos moradores do Jardim Paulista, no final de novembro, sobre a chegada de uma ciclovia na Rua Honduras, travessa residencial com casas de alto padrão na zona sul de São Paulo. Moradora na rua, Célia mandou carta aos vizinhos pedindo apoio contra a iniciativa. Em dois dias, ganhou adesão em massa.
Resistência igual à da Rua Honduras também é observada em outras regiões nobres da capital. Moradores dessas áreas estão indo ao Ministério Público Estadual (MPE) e até a delegacias registrar queixa contra a pintura das faixas sem consulta prévia.
No Alto da Boa Vista, também na zona sul, moradores foram à Promotoria de Habitação contra a ciclovia na Rua Fernandes Moreira. Em Higienópolis, na região central, o Conselho de Segurança (Conseg) registrou boletim de ocorrência e ameaça mover ação contra a futura ciclovia de 5 quilômetros que vai passar embaixo do Minhocão, prevista para o ano que vem.
Esses moradores argumentam que nenhuma intervenção pode ser feita nos bairros residenciais sem a aprovação dos proprietários de imóveis da via afetada. Eles afirmam que os bairros residenciais estão protegidos pelo novo Plano Diretor, aprovado em julho.
Erros. Um inquérito foi aberto pela promotora Camila Mansour Magalhães da Silveira para investigar erros na criação das faixas. Mas, para o governo, as regras de tombamento desses bairros residenciais valem apenas para imóveis e calçadas, e não para o viário urbano, administrado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). 
“Ninguém nos perguntou nada. Simplesmente chegaram e colocaram a faixa. Se eu fizer um jantar e quiser receber meus amigos, onde eles vão parar? Na casa do (prefeito) Haddad?”, questiona a médica que articulou o movimento contra a ciclovia na Rua Honduras. Ela e os vizinhos reclamam da iniciativa do governo, mas ressaltam não serem contra os ciclistas. 
“Não passa ninguém de bicicleta na rua. O movimento de carros é muito grande, é até um risco para os ciclistas. Ninguém é contra ciclovia, mas o ponto aqui é o seguinte: ninguém anda de bicicletas e não existe essa demanda”, frisa a economista Ana Brescia, de 49 anos. Para Ivany Zarzur, de 70 anos, a ciclovia não pode existir na Rua Honduras. “Aqui é zona 1 (estritamente residencial), não pode ter essa bagunça. Não temos estrutura. Na Europa as ciclovias são nas calçadas. Aqui as pessoas ainda não têm educação”, pontua Ivany. 
Sergio Castro/Estadão
Na Rua Honduras, vizinhos são contra faixa para bikes


Privilégio. Administradora da Sociedade Amigos dos Jardins, Dora Livolsi, de 67 anos, defende que pagadores de um Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) tão alto (média de R$ 10 mil por ano), como os da Rua Honduras, precisam ter algum privilégio. “Eles não podem perder o direito de estacionar os carros nas ruas. E a ciclovia vai atrair assaltantes”, afirma Dora, que defende a criação de uma ciclorrota no bairro, sem a pintura de faixas. “Até uma Zona Azul seria melhor.”
Alguns moradores da Rua Honduras também temem assaltos por causa da faixa. “Quem anda de bicicleta não presta, hoje nós sabemos disso. São pessoas não qualificadas. Então vamos ficar sujeitos a esses riscos aqui?”, questiona o aposentado Francisco Augusto da Costa Porto, de 74 anos.
As ciclovias começaram a chegar às zonas residenciais no final de setembro. No Alto da Boa Vista, na zona sul, moradores tentaram, durante um mês, audiência com o governo para reclamar da via exclusiva da Rua Fernandes Moreira. Sem serem atendidos, foram ao MP. Eles reclamam principalmente do fim das vagas de estacionamento. O local também costuma alagar durante as chuvas de verão.
“Nós demos outras quatro opções em vias paralelas. A faixa aqui é muito estreita”, afirma a moradora Renata D’Angelo, de 41 anos. Ela também faz questão de ressaltar que não é contra a pintura de faixas para ciclistas no seu bairro. “Eu sou ciclista também. O que nós tentamos mostrar à Prefeitura, e não conseguimos ser atendidos, por isso fomos ao Ministério Público, é o risco que essa ciclovia oferece aos usuários.”
Com o mesmo argumento de que a ciclovia não é segura, moradores da Alameda Guatás, no Planalto Paulista, outra área estritamente residencial na zona sul, pedem mudança no traçado da faixa, inaugurada em outubro. “A ciclovia, do nada, termina e vira uma faixa de ônibus. E quem está na bicicleta nem percebe isso”, reclama o estudante de Publicidade Alberto Rodrigues, de 19 anos, morador do Planalto Paulista e usuário da faixa. / COLABOROU RAFAEL ITALIANI