PAULO RABELLO DE CASTRO
O palestrante indiano daquela noite discorreu sobre o desafio das empresas privadas indianas diante da globalização e da competição com a China, tema dos mais importantes para qualquer um que pense em desenvolvimento. Fechou sua fala aos empresários, reunidos no clube de negócios do WTC, na capital paulista, com uma pergunta: “E vocês, brasileiros, que não têm uma China como vizinha, qual é o senso de urgência que os mobiliza a tentar tornar seu país melhor e mais eficiente?”.
A pergunta incômoda era de Ravi Ramamurti, professor emérito da Universidade Northeastern. Ele tentava projetar o futuro de seu país, mostrando que a economia da Índia seria, antes de 2040, a terceira maior do mundo, logo depois da China e dos Estados Unidos, deixando para trás europeus e outros asiáticos. O questionamento sobre o senso de urgência e o rumo do Brasil ficou sem resposta até que o homenageado da noite, o vice-presidente José Alencar, recebeu a palavra.
Digno, com sua voz grave, mas com pensamentos modulados por uma temperança bem mineira, que suavizava o aço rígido de suas convicções, Alencar foi buscar no íntimo de suas vivências um depoimento sobre o futuro do Brasil. Como resposta resumida, foi a melhor que já ouvi sobre nosso verdadeiro potencial, mais uma vez valorizado pelos estrangeiros, capazes de encontrar em nós virtudes que, inclusive, nem sabemos se temos.
Alencar fez três observações fundamentais. O Brasil é um país rico, um diferencial a mais na comparação mundial. Primeiro, por seus recursos. Não só os naturais, como a abundante terra arável, água como ninguém e sol forte a ponto de propiciar mais de uma safra por ano, mas principalmente por outro tipo, o recurso humano, o povo brasileiro. Trata-se de gente capaz de aprender rápido, inovar e improvisar e que agora também se educa e aprende a ter disciplina no trabalho. Logo em seguida – lembrou Alencar ao indiano –, pelas empresas brasileiras e seus empreendedores, por sua persistente disposição para crescer e lucrar. Tanto o Brasil como a Índia, durante algum tempo, satanizaram o ganho empresarial, chamado Lucro, como se ele fosse medida de exploração do trabalho, e não a fonte de novos empregos, quando bem reinvestido. No passado, endeusamos os gastos públicos sem retorno, as bondades casuísticas feitas com o sacrifício dos impostos pagos por todos. Mas a Índia e o Brasil finalmente estão aprendendo que a fonte do progresso social, do verdadeiro desenvolvimento, é o lucro, e não o prejuízo, o paternalismo ou a repartição da pobreza. Desperdícios custam para toda a sociedade, enquanto a produção eficiente gera riqueza e oportunidades de ascensão coletiva. Está aí a classe C para mostrar isso.
As empresas são “bens da comunidade”. Os governos
não deveriam tentar substituir empresários
Finalmente, a terceira observação, de profundidade filosófica. As empresas são “bens da comunidade”, de que cuidam seus donos, não importando se é um indivíduo ou se são dezenas de milhares de acionistas reunidos numa sociedade anônima, pois um dos maiores interesses do empresário é ver sua iniciativa engrandecida, mesmo quando ele não estiver mais lá. Os governos não deveriam tentar substituir os empresários, que são muitos e cada vez mais bem preparados no Brasil. O papel econômico dos governos é desobstruir o caminho para o progresso do Brasil, com cinco ações: remover a ignorância, a falta de saúde e saneamento, a precariedade da infraestrutura e as políticas antagônicas ao crescimento, como juros altos demais e impostos irracionais. No Brasil, cabe aos governos tocar esse “Quinteto do Desenvolvimento”.
Nosso senso de urgência deveria nos levar a buscar quem coordene esse notável time de empresários e trabalhadores. Na democracia, como nos lembrava Alencar, reside nosso trunfo final, nossa arma competitiva em relação a outras potências que não permitem a liberdade de expressão nem são verdadeiras economias de mercado.
É tempo de refletirmos sobre a mensagem desse grande brasileiro que jamais desiste.
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