quarta-feira, 14 de abril de 2010

A China e a “primarização” das exportações brasileiras

por Cláudia Trevisan
Seção: ECONOMIA\ Estadão
14.abril.2010 00:41:38



A explosão da demanda chinesa por commodities na última década foi o que transformou o país asiático em um fator crucial para a economia brasileira. Também foi a principal razão para o processo de “primarização” da pauta de exportações nacionais no mesmo período, com a expansão do peso dos produtos básicos e o encolhimento da parcela representada por bens industrializados, que possuem maior valor agregado.
Há dez anos, quando a China começou a entrar no radar dos embarques brasileiros, a exportação de bens básicos respondia por 22,79% do total, enquanto a participação de manufaturados e semimanufaturados estava em 59,07% e 15,52%, respectivamente, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. As estatísticas relativas ao ano 2000 mostram que a China aparecia em 12º lugar na lista dos principais destinos das exportações brasileiras. O país asiático saltou para a sexta posição no ano seguinte, consolidou-se no terceiro lugar a partir de 2005 e chegou à liderança em 2009.
A meteórica ascensão foi acompanhada do aumento do peso das commodities nos embarques brasileiros. Em 2007, ano anterior à eclosão da crise mundial, o percentual de bens básicos aumentou para 32,12% e os relativos a manufaturados e semimanufaturados caíram para 52,2% e 13,57%, respectivamente.
Se forem considerados os números do ano passado, influenciados pela retração da demanda norte-americana, a fatia dos bens primários é ainda maior: 40,50%, quase o dobro do patamar existente no ano 2000, e próximo dos 44,02% obtidos pelos manufaturados.
Isso não significa que a venda de bens industrializados diminuiu, mas sim que ela aumentou em ritmo bem menor que a de produtos básicos, principalmente minério de ferro, soja e petróleo _sem considerar o cenário atípico de 2009. A expansão do peso das commodities reflete também a forte alta de seus preços no mercado internacional em razão do aumento da demanda chinesa nos últimos anos.
A diversificação da pauta das exportações brasileiras é um dos pontos principais do Plano de Ação Conjunto para o período 2010-2014 que os presidentes Hu Jintao e Luiz Inácio Lula da Silva vão assinar em Brasília na sexta-feira, durante a segunda visita oficial do dirigente chinês ao país.
No ano 2000, o principal produto de exportação do Brasil foram aviões, com vendas de US$ 3,054 bilhões, valor quase idêntico aos US$ 3,048 bilhões movimentados por minério de ferro, que aparecia em segundo lugar. Sete anos depois, os embarques de minério de ferro haviam se multiplicado por três, para US$ 10,56 bilhões, enquanto a venda de aviões subiu 54,5%, para US$ 4,72 bilhões, o que colocou o produto em quarto lugar no ranking, atrás de minério, petróleo e soja, que se transformaram nos principais produtos de exportação.
A ascensão do minério de ferro à condição de principal estrela das exportações brasileiras acompanha o processo de transformação da China no maior fabricante de aço do mundo, responsável por quase metade da produção global. Os dirigentes chineses consideram estratégico ter uma indústria siderúrgica forte para alimentar o ritmo anual de crescimento de 10% do país e suprir a demanda do movimento de urbanização, pelo qual milhões de chineses se mudam do campo para as cidades. O aço é a principal sustentação desse processo, utilizado na construção, em obras de infraestrutura e na fabricação de bens de consumo duráveis, como carros e eletrodomésticos.
A China se transformou no maior fabricante de aço do mundo em 1996, com produção de 101,24 milhões de toneladas, mas foi na década seguinte que seu peso no setor aumentou de maneira desproporcional. Oito anos depois de ter se tornado o líder mundial, a China dobrou sua produção anual, para 222,4 milhões de toneladas em 2003, segundo dados da World Steel Association.
O volume dobrou de novo em apenas quatro anos e chegou a 490 milhões de toneladas em 2007. No ano passado, a China produziu 567,84 milhões de toneladas, o equivalente a 46,5% do total mundial _o Brasil fabricou 33,7 milhões de toneladas em 2008. A quantidade de aço que sai das siderúrgicas chinesas supera a soma do que é fabricado pelos oito países que aparecem em seguida no ranking da World Steel Association.
Para produzir todo esse aço, a China precisa de quantidades crescentes de minério de ferro, sua principal matéria-prima. Essa foi a razão pela qual o país se tornou o cliente número um da brasileira Vale, que é a maior produtora de minério de ferro do mundo. No ano 2000, esse item representava 5,53% das exportações nacionais. O percentual subiu para 6,57% em 2007, 8,36% no ano seguinte e chegou a 8,66% em 2009. A soja participava com 3,97% nos embarques brasileiros em 2000, índice que subiu para 4,18% em 2007, 5,53% em 2008 e 7,47% no ano passado. No movimento contrário, o peso dos aviões saiu de 5,54% para 2,94% em 2007. No ano passado, sob efeito da crise, o percentual encolheu ainda mais, para 2,52%.
(Este texto foi publicado domingo no Estadão)
Tags: Aviões, Brasil, China, Exportações, Minério de Ferro, Produtos básicos, Soja
comentários (32) | comente


32 ComentáriosComente também
14/04/2010 - 10:05
Enviado por: Cyber
Este texto me faz lembrar que continuamos a ser uma colônia extrativista. Gostaria que fosse bem diferente, mas os números mostram isto. Ao invés de aumentarmos a exportação de produtos de alto valor agregado, afinal a tonelada de um avião pode chegar a valer alguns milhões de US$, aumentamos a exportação de minério de ferro, que vale alguns centavos de US$. Minério este que compramos de volta na forma de eletrônicos e eletrodomésticos, baratos sim, mas nos quais o valor agregado foi multiplicado por pelo menos 1 milhão (considerando o peso final em ferro).
Produto chinês, de uma forma geral, é considerado de baixa qualidade. Assim era o produto japonês na década de 1950-60, no final na década de 1970 ao contrário já era garantia de qualidade. Ao meu ver, a China vai pelo mesmo caminho, eles estão aprendendo e rápido. A população do Japão nunca passou de 150 milhões, os chineses já são mais de 1,3 bilhões.

Nenhum comentário: