domingo, 17 de junho de 2012

No Brasil falta planejamento na questão das emissões de CO2


O Globo
Com o início da conferência Rio +20 e toda a discussão acerca das emissões dos gases geradores de efeito estufa, salta aos olhos a falta de planejamento e de uma política nacional de emissão de CO2 na determinação das diretrizes da política energética brasileira.
No setor elétrico, a questão ambiental tem sido decisiva para a determinação da viabilidade dos projetos de geração de energia. Um bom exemplo é a preferência pela construção de usinas hidroelétricas a fio d´água, que causa menos impacto ambiental, mas possui menor volume de energia assegurado, podendo ficar meses sem gerar energia, como é o caso da usina de Belo Monte. Além da diminuição dos reservatórios, o Plano Nacional de Expansão de Energia (PDE) não contempla a introdução de novas usinas térmicas, já a partir de 2014, mesmo aquelas cujo combustível é o gás natural, considerado o combustível de transição para uma economia verde. Apesar das grandes reservas de carvão que o país possui na região Sul, as usinas a carvão, cuja tecnologia já permite níveis de emissão de CO2 bem mais baixos, são demonizadas pela empresa do governo responsável pelo planejamento do setor energético. Como resultado da radicalização da questão ambiental no setor elétrico, o Brasil acaba não aproveitando sua diversidade de fontes primárias de energia nem a sua dispersão regional.
Já no setor de combustíveis, a questão da emissão de CO2 não é levada em consideração pelas políticas governamentais. A política de preços de combustíveis subsidia a gasolina e o diesel, incentivando o seu consumo, em substituição aos combustíveis verdes como o etanol e o biodiesel. De fato, em 2011, o consumo de gasolina cresceu 19%, enquanto o etanol apresentou queda de 28%. Desde o anúncio da descoberta do pré-sal, os esforços se voltaram para a viabilização da extração do combustível fóssil e o projeto “Arábia Saudita Verde” foi abandonado. Assim, também nos combustíveis, o Brasil abre mão de seus potenciais, no caso a vantagem comparativa para se tornar uma potência mundial na produção de combustíveis renováveis.
Em plena Rio+20, o Brasil apresenta uma matriz energética bem confusa do ponto de vista ambiental. Enquanto 88% da matriz elétrica é composta de fontes renováveis, na de combustíveis 81% é de fontes fosseis. Na matriz de energia como um todo, a predominância é dos fósseis, com 56%. Parece até que temos dois governos definindo a politica ambiental no setor de energia. Um bastante radical e totalmente verde que não admite nenhuma energia que emita CO2 na geração elétrica e outro sem nenhuma preocupação ambiental no momento que define a politica de combustíveis e que gosta mesmo é de sujar as mãos com óleo.

Com biodigestor modular, Unioeste consegue sua primeira carta patente


A Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) conseguiu sua primeira carta patente. O produto patenteado é o “Biodigestor modular para a produção de biogás, biofertilizante e bio-ração”, que foi licenciado para uma empresa de Recife, a Pernambuco Biosolos, que já trabalha com lixo. O pedido da carta patente foi feito em 2004. 
A partir de apenas um projeto, o Pró-Natureza Limpa, coordenado pelo professor Camilo Mendoza Morejon, a instituição tem mais oito pedidos em tramitação. Destes, cinco já têm seus produtos em negociação para transferência de tecnologia nos moldes da Lei de Inovação. 
O biodigestor transforma resíduos orgânicos em produtos de valor agregado nas formas gasosa, líquida e sólida, todos com mercado garantido, o que viabiliza o empreendimento comercial. 
Segundo o professor Mendoza Morejon, diferente de outros biodigestores, este não consome muita água, já que não a usa para transportar o lixo, e não precisa ser instalado em terreno com declive – portanto não polui rios vizinhos, o que acontece com frequência. Como é modular, se ajusta ao tamanho dos municípios e aproveita 100% do lixo que recebe, sem deixar resíduos. 
“Trabalhamos com um modelo de gestão que considera o lixo como investimento e não custo, como hoje é encarado pelas prefeituras”, explica o professor Morejon. Sua equipe fez pesquisa no município de Toledo, no Oeste do Paraná, e obteve números que podem ser aplicados a outras cidades: do total de resíduos sólidos (71,3 toneladas) gerados pela população de 120 mil habitantes, 69% correspondem a resíduos orgânicos, 23% são recicláveis e 8% são compostos por rejeitos. 
Atualmente, pelo menos 70 toneladas (98%) são destinadas ao aterro sanitário. Com o biodigestor modular e o uso do lixo reciclável, restariam apenas os 8% de rejeitos. E nem isso é problema para a equipe da Unioeste. Em parceria com a empresa Inomaq, de Toledo, a equipe está desenvolvendo tecnologia para tratamento da parcela de rejeito doméstico, lixo hospitalar e vários tipos de resíduos industriais. Com isso, o professor calcula que apenas 5,7 toneladas acabariam no aterro sanitário. 
Até para as prefeituras, que gastam com o lixo em média 61% do que arrecadam com o IPTU, sua principal fonte de renda, o problema também pode ser fator de investimento. O professor avalia que até o aterro sanitário, embora aceito e incentivado por lei, traz problemas a longo prazo. No modelo de gestão que propõe, a coleta seletiva e a implantação do biodigestor viabilizariam o empreendimento industrial. De quebra, ainda ganha o meio ambiente. 
LEI DA INOVAÇÃO - Lembrando a recente declaração da presidente Dilma Rousseff, de que o Brasil vai priorizar o registro de patentes como meta de avaliação científica (o modelo atual é focado na publicação de artigos), o professor Morejon aponta um movimento grande no Estado de apoio à inovação, de incentivo a parcerias com empresas privadas para que as pesquisas e processos desenvolvidos nas universidades cheguem ao mercado. 
Ele cita a aplicação prática dos outros projetos que estão em processo de transferência de tecnologia – um sistema de purificação de biogás, que separa o gás carbônico; um desumidificador de biogás, um sistema de transporte e outro para preaquecimento do produto. “O que interessa é que o nosso esforço intelectual produza benefícios para a sociedade”, comenta. 
Mas como conseguir em outros municípios que a população separe, além do reciclável, também o lixo orgânico? Morejon diz não acreditar que seja possível em função da consciência ambiental, nem pela imposição de uma lei. Para ele, a solução seria um incentivo, que pode ser até em dinheiro. A empresa coletora define um preço para o lixo, o que apenas se viabilizaria com a atribuição de um valor comercial ao resíduo orgânico. 
Com a tecnologia desenvolvida na Unioeste, que transforma o lixo orgânico em produto de valor agregado, empresas podem ser atraídas em função da expectativa de retorno. E ainda pagaria à prefeitura para obter a concessão do lixo. Como vantagem acessória, este tipo de empreendimento gera empregos que não exigem qualificação, exatamente o que o Brasil está precisando neste momento. 
Isso permite outro cálculo ao professor Camilo Morejon, que também é chefe da Divisão de Propriedade Intelectual da Unioeste. Quanto à concretização da inovação, que é fazer com que o resultado da atividade intelectual ganhe o mercado, a Unioeste possui eficiência de 73%, isto é: “73% dos produtos tecnológicos, com pedido de patente, estão atingindo o objeto maior da Lei de Inovação, que é viabilizar a inserção dos resultados da atividade intelectual no mercado”.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Vexame ambiental


Xico Graziano
Que Código Florestal, nada. O grande fiasco brasileiro na Rio+20 se esconde no etanol. O país que ensinou ao mundo como trocar a gasolina fóssil pelo álcool renovável engata marcha ré na utilização do combustível limpo. Um vexame ambiental.
Pode-se comprovar facilmente esse retrocesso na bioenergia. Em 2011, o consumo dos combustíveis derivados de petróleo - gasolina principalmente - cresceu 19%, enquanto o uso do etanol nos veículos despencou 29%. Não precisa dizer mais nada. Anda na contramão da história a matriz energética dos transportes no Brasil.
Aconteceu que os consumidores reagiram ao desequilíbrio de preços a favor da gasolina. Duas razões básicas explicam a mudança do mercado. Primeiro, o governo federal tem reduzido o encargo da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a gasolina, taxa que nos últimos anos recuou de 14% para 2,6%. Em consequência, acabaram praticamente equiparados os custos tributários de ambos os combustíveis. Uma política moderna de sustentabilidade, como buscada em todo o mundo, procederia ao contrário, ou seja, reduziria a carga tributária sobre o biocombustível, não sobre o derivado de petróleo.
Trata-se, obviamente, de uma decisão política, arcada pelo governo federal desde 2002. Com a redução da referida taxa, a Petrobrás, que normalmente deveria ter elevado o preço dos derivados de petróleo para manter sua competitividade global, se compensa pela perda de rentabilidade recolhendo menos imposto ao governo. Tudo dissimulado. Conta paga pela sociedade.
Em segundo lugar, a gasolina barata segura, obviamente, o preço do etanol na bomba, roubando margem dos produtores. Pouco lucrativa, a atividade alcooleira vê sua matéria-prima se direcionar para a fabricação de açúcar, movimento que se observa há tempos nas usinas. Bastante rentável no mercado internacional, o açúcar estimula a pauta das exportações. Resultado: a oferta de etanol se retrai, tendendo a elevar seu preço no posto de combustível, espantando a freguesia. Elementar.
O Brasil produziu cerca de 28 bilhões de litros de etanol nesta última safra (2010/2011). Nos EUA o volume já ultrapassou 50 bilhões de litros. Incrível. O país que inventou o Proálcool, obtido a partir da cana-de-açúcar, está tomando poeira dos gringos, que destinam 40% de sua safra de milho para a fermentação alcoólica. Mais ainda. A necessidade de manutenção de estoques confiáveis começou a exigir volumosas importações de etanol. Sabem de quem? Dos norte-americanos, claro. No ano passado, o Brasil comprou acima de 1,1 bilhão de litros de etanol dos EUA. Acredite se quiser.
Não é à toa que paira desilusão no setor sucroalcooleiro. Estimulados pela agenda da economia verde, nos transportes viabilizada definitivamente com a geração dos motoresflex fuel, inéditos e fortes grupos, nacionais e multinacionais, entraram na atividade. Anunciaram planos formidáveis que, após quatro anos, micaram, roubando o fôlego do parque alcooleiro. Notícia ruim chega dos canaviais. E quem pensa que é chororô de usineiro se engana feio. Corretores garantem que 20% das usinas do Centro-Sul estão à venda. Sem comprador. As chamadas greenfields, novas plantas a serem construídas, em vários Estados, ficaram no papel. O pouco dinamismo existente advém da ampliação e modernização de fábricas já instaladas. Passos de tartaruga no etanol.
Milhares de estudiosos, ambientalistas e jornalistas se encontrarão logo mais na Rio+20. O governo brasileiro fará ginástica para justificar o inexplicável. Enquanto as nações se debruçam para encontrar soluções capazes de esverdear sua (suja) matriz energética, por aqui se desperdiça uma oportunidade de ouro, retrocedendo no uso do combustível renovável.
Os produtores de cana-de-açúcar e os usineiros de etanol, por sua vez, lançaram por aqui o Movimento Mais Etanol, querendo influenciar a mídia e sensibilizar o governo para sua agenda. Eles se propõem a dobrar de tamanho até 2020 - o que, ademais, geraria 350 mil empregos diretos -, mas precisam viabilizar uma estratégia de política pública que devolva ao etanol a competitividade roubada pelo controle dos preços da gasolina. Basta, de cara, reduzir a carga tributária sobre o biocombustível.
Gasolina barata e etanol caro acabam criando um círculo vicioso contra o meio ambiente, prejudicando a saúde pública. Segundo a Agência de Proteção Ambiental norte-americana (EPA, na sigla em inglês), o etanol derivado da cana-de-açúcar pode ajudar a reduzir até 91% o efeito estufa da Terra, quando comparado com as emissões advindas da queima de gasolina. Mas, curiosamente, o ambientalismo pouca bola dá para essa tragédia da poluição urbana. O foco de sua ferrenha atuação, conforme se verificou na questão do novo Código Florestal, mira no assunto da biodiversidade. Contra o desmatamento.
A intolerância dos ambientalistas agride os agricultores, como se do campo partisse todo o mal contra a natureza. Citadinos, eles poupam as desgraças ecológicas provocadas pela urbanização, a começar pelos escapamentos veiculares. Novos estímulos públicos ao setor automobilístico favoreceram agora as montadoras. Nenhum compromisso ambiental se firmou. Pouco importa, tristemente, aos radicais verdes.
Tal miopia do movimento ambiental, infelizmente, ajudará o governo a esconder, na Rio+20, o retrocesso na agenda do etanol. Seria interessante, aliás, como subproduto da reunião, discutir para onde caminha o ambientalismo brasileiro.
A incrível capacidade fotossintética do Brasil garante enorme vantagem na produção de biocombustível, energia renovável misturada com geração de empregos. Desprezá-la significa maltratar o etanol, um filho da Pátria.
* AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DE AGRICULTURA E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. E-MAIL:XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR