sábado, 2 de janeiro de 2016

O substituto da vida - RUY CASTRO FOLHA DE SP - 02/01


RIO DE JANEIRO - Quando meu instrumento de trabalho era a máquina de escrever, eu me sentava a ela, punha uma folha de papel no rolo, escrevia o que tinha de escrever, tirava o papel, lia o que escrevera, aplicava a caneta sobre os xxxxxxxx ou fazia eventuais emendas e, se fosse o caso, batia o texto a limpo. Relia-o para ver se era aquilo mesmo, fechava a máquina, entregava a matéria e ia à vida.

Se trabalhasse num jornal, isso incluiria discutir futebol com o pessoal da editoria de esporte, paquerar a diagramadora do caderno de turismo, ir à esquina comer um pastel ou dar uma fugida ao cinema à tarde –em 1968, escapei do "Correio da Manhã", na Lapa, para assistir à primeira sessão de "2001" no dia da estreia, em Copacabana, e voltei maravilhado à Redação para contar a José Lino Grünewald.

Se já trabalhasse em casa, ao terminar de escrever eu fechava a máquina e abria um livro, escutava um disco, dava um pulo rapidinho à praia, ia ao Centro da cidade varejar sebos ou fazia uma matinê com uma namorada. Só reabria a máquina no dia seguinte.

Hoje, diante do computador, termino de produzir um texto, vou à lista de mensagens para saber quem me escreveu, deleto mensagens inúteis, respondo às que precisam de resposta, eu próprio mando mensagens inúteis, entro em jornais e revistas online, interesso-me por várias matérias e vou abrindo-as uma a uma. Quando me dou conta, já é noite lá fora e não saí da frente da tela.

Com o smartphone seria pior ainda. Ele substituiu a caneta, o bloco, a agenda, o telefone, a banca de jornais, a máquina fotográfica, o álbum de fotos, a câmera de cinema, o DVD, o correio, a secretária eletrônica, o relógio de pulso, o despertador, o gravador, o rádio, a TV, o CD, a bússola, os mapas, a vida. É por isto que nem lhe chego perto –temo que ele me substitua também.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Após réveillon no Rio, mais de 3,3 mil garis trabalham na limpeza da cidade, OESP


Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) recolheu 694,2 toneladas de lixo em todos os pontos de festa após o réveillon no Rio de Janeiro

Após as comemorações de milhões durante o réveillon 2016 no Rio de Janeiro, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) começou a limpeza dos locais que sediaram eventos públicos às 6h de hoje. Na orla de Copacabana, na zona sul, palco da principal festa da cidade, os garis dividiram espaço com diversas pessoas que ainda habitavam as areias da praia à espera do nascer do sol. 
Após uma manhã inteira de trabalhos, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) recolheu 694,2 toneladas de lixo em todos os pontos de festa após o réveillon no Rio de Janeiro. Apenas na orla de Copacabana, na zona sul, onde cerca de dois milhões de pessoas celebraram a principal festa da cidade, foram removidas 363,5 toneladas.
Em Copacabana, dos resíduos recolhidos, 315,2 toneladas eram de lixo e outras 48,3 toneladas eram de itens potencialmente recicláveis. Nas praias da Barra da Tijuca e do Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste, foram removidas 115,8 toneladas ao todo.Já no Parque Madureira, na zona norte, onde cerca de 60 mil pessoas comemoraram o novo ano, foram removidas 7,8 toneladas. A operação ainda percorreu o Piscinão de Ramos (15,9 toneladas), a Penha (três toneladas), a Praia do Flamengo (25 toneladas) e a Ilha do Governador (20,4 toneladas).
Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) recolheu 694,2 toneladas de lixo em todos os pontos de festa após o réveillon no Rio de Janeiro
Companhia Municipal de Limpeza Urbana (Comlurb) recolheu 694,2 toneladas de lixo em todos os pontos de festa após o réveillon no Rio de Janeiro
O número geral de lixo recolhido este ano foi um pouco maior do que no réveillon 2015, quando a Comlurb recolheu 680 toneladas de lixo em todos os eventos, sendo 370 toneladas só na praia de Copacabana.
Segundo a Comlurb, foram mobilizados 3.358 garis (1.165 deles só em Copacabana) e 344 profissionais de limpeza para a operação. Apesar dos 1.455 contêineres instalados na cidade, houve muito trabalho para o recolhimento de garrafas, embalagens e outros itens. Para o apoio, foram disponibilizados ainda 247 veículos e equipamentos como caminhões, pás mecânicas, caminhões-pipa, varredeiras, sopradores, entre outros.
Em Copacabana, 120 garis que, pela primeira vez, fizeram a limpeza durante a festa colaboraram para agilizar o serviço da equipe da manhã. O resultado foram pistas e calçadas mais limpas logo ao amanhecer. Às 10h15, uma das pistas já havia sido liberada ao tráfego de veículos, enquanto a outra fica dedicada ao público (como ocorre aos domingos e feriados).
Porém, como muitas pessoas permaneceram na areia na área dos palcos, a limpeza por lá está sendo mais lenta. Garis estão tendo de trabalhar intensamente para compensar o serviço das pás mecânicas, que não estão operando para não oferecer risco à multidão.
No réveillon 2015, a Comlurb recolheu 680 toneladas de lixo em todos os eventos, sendo 370 toneladas só em Copacabana.
A Secretaria Municipal de Ordem Pública (Seop), que atuou com apoio de guardas municipais, também apertou a fiscalização a partir da madrugada de quinta-feira, 31. Apenas na orla de Copacabana, foram apreendidos com ambulantes não autorizados 5.970 bebidas diversas, 686 produtos de bazar, 477 peças de vestuário, 88 quilos de alimentos perecíveis, 64 botijões de gás, 134 cangas, 106 produtos eletrônicos, nove produtos de informática, 12 carroças, 12 acessórios de carroça, 66 cadeiras, dez carrinhos de transporte de mercadorias, três barris de chope, três mesas, uma estufa para salgados, uma caixa de isopor e uma churrasqueira. 
A fiscalização também desmontou 57 barracas de camping armadas irregularmente nas areias. O estacionamento em local proibido também foi alvo da operação, que rebocou 390 veículos na orla do Leme ao Leblon.
Atendimentos. A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) realizou 740 atendimentos nos cinco postos médicos montados na orla de Copacabana desde as 17h30 de ontem. A maioria foi motivado por excesso de bebidas alcoólicas, cortes, dor de cabeça e mal estar. Ao todo, 46 pessoas precisaram ser removidas para hospitais da rede de urgência e emergência municipal. Os números foram menores do que no ano passado, quando foram realizados 909 atendimentos e 64 remoções, de acordo com a SMS.
A rede estadual de saúde, que vem operando com dificuldades devido à crise financeira do Estado, informou que não possui um balanço dos atendimentos realizados em suas unidades na noite do réveillon. Desde o dia 18 de dezembro, a rede estadual opera com um Plano de Contingência, com auxílio do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar. A operação vigora até o dia 7 de janeiro.
“A medida já foi usada de maneira informal, pontualmente, em outras situações e faz parte do plano de contingência, traçado de forma preventiva, considerando que o período de festas de fim de ano é crítico no que se refere a escalas de plantão médico de urgência e emergência, historicamente com muitos registros de falta de funcionários. O objetivo é garantir o atendimento e a prestação de serviços de saúde à população”, informou a Secretaria Estadual de Saúde, em nota. 

Primeira turma de sem-terra conquista diploma em Medicina Veterinária, Brasil de Fato



“Nosso compromisso é nunca esquecer que viemos dos assentamentos e acampamentos. Ao MST: conte com essas médicas e médicos veterinários; com homens e mulheres dispostos a encarar a luta por um Brasil sem cercas”, discursou uma estudante.
21/12/2015
Por Catiana de Medeiros,
De Pelotas (RS)

 
 Formatura dos sem-terra em Veterinária | Fotos: Leandro Molina
“Juro, no exercício da profissão de Médico Veterinário, doar meus conhecimentos em prol da salvação e o bem-estar da vida animal, respeitando-a tal qual a vida humana e promovendo o convívio leal e fraterno entre o homem e as demais espécies.” Este foi o juramento feito por 45 trabalhadores rurais sem-terra durante cerimônia de formatura da 1ª Turma Especial de Medicina Veterinária para assentados da reforma agrária, realizada na última sexta-feira (18), em Pelotas (RS).
Os formandos, oriundos dos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Ceará, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, receberam o diploma de Médico Veterinário após oito anos da realização do primeiro vestibular, que ofereceu 60 vagas, e de enfrentamento às barreiras impostas por ruralistas e setores conservadores da região de Pelotas que não queriam que o curso não fosse uma conquista dos sem-terra.
A 1ª Turma Especial de Medicina Veterinária teve como patrono o deputado Adão Pretto (in memoriam) e é uma parceria entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), onde ocorreram as aulas, através do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). Uma segunda turma, que também iniciou com 60 acadêmicos, está em andamento deste 2013.
Durante a cerimônia de colação de grau, a oradora da turma, Roseli Canzarolli, afirmou que o ingresso dos sem-terra na universidade, a cinco anos atrás, representa o rompimento das cercas do saber e que o diploma conquistado reforça o compromisso que os acadêmicos têm com a luta do MST e a responsabilidade de atuar na produção agroecológica, travando o avanço do agronegócio.
Roseli também explicou que a turma não teve regalias ou vantagens: “Só tivemos o que é nosso por direito e de qualquer outro estudante”, e relatou o preconceito sofrido e as dificuldades que vieram com a falta de infraestrutura e de recursos para realizar o curso. Em nome dos 45 formandos, ela ainda ressaltou que jamais esquecerão de suas origens: a família sem-terra.
“Nosso compromisso é nunca esquecer que viemos dos assentamentos e acampamentos. Ao MST: conte com essas médicas e médicos veterinários, mas, principalmente, com homens e mulheres dispostos a encarar a luta por um Brasil sem cercas”, finalizou Roseli.
Educação aliada à transformação social
Em nome do MST, o coordenador nacional Cedenir de Oliveira, agradeceu à Ufpel por ter aberto as portas da universidade para acolher os acadêmicos e da coragem que tiveram de enfrentar, junto ao Movimento, todos as barreiras que se levantaram contra a realização do curso para acampados e assentados da reforma agrária. Ele também afirmou que, além de marchar e ocupar latifúndios, os Sem Terra têm a condição de entrar na universidade de cabeça erguida. “Essa juventude nos orgulha”, disse.
Para o dirigente do MST, o processo de educação dos filhos de assentados e acampados tem entre seus objetivos principais mudar os paradigmas da agricultura, na qual são jogados em torno de 1 bilhão de litros de veneno por ano, provocando câncer e a morte de mais de 500 mil pessoas.
Segundo Oliveira, para mudar essa realidade se faz necessária a produção de alimentos sadios, uma prática já adotada por milhares de trabalhadores Sem Terra em todo o Brasil, mas que também é fundamental o conhecimento acadêmico e científico para fortalecer esse modelo saudável de agricultura.
 
A 1ª Turma Especial de Veterinária teve como patrono o deputado Adão Pretto 
“Nossa perspectiva é que possamos avançar na produção de alimentos livres de venenos. E, para isso, contamos com o conhecimento empírico dos nossos camponeses, mas também precisamos, sim, do conhecimento científico, que se dá através de cursos como o de Medicina Veterinária, Agronomia e tantos outros que conquistamos, para que de fato possamos enfrentar as grandes contradições, produzir com qualidade e abastecer a sociedade”, argumentou.
Cedenir ainda apontou a importância de romper as cercas da educação, para além do latifúndio, “para ter pessoas mais dignas, mais cultas e, consequentemente, mais humanas”. “Não faremos mudanças sociais nesse país apenas distribuindo economia. Nós precisamos elevar o nível de conhecimento e de cultura das massas através da educação dos nossos filhos e das nossas bases. Somente assim transformaremos esse país”, concluiu.
Barreiras
O curso de Medicina Veterinária para assentados da reforma agrária começou a ser pensado ainda em 2005 pelo MST, quando foi encaminhado um projeto para a capacitação de jovens em Medicina Veterinária ao Pronera. No ano de 2007 ocorreu a assinatura do convênio e foi realizado vestibular para o ingresso de 60 acadêmicos.
Porém, o Ministério Público de Pelotas entrou com uma ação civil contra a realização do curso e as aulas iniciaram apenas quatro anos depois, no primeiro semestre de 2011, após longa disputa judicial que terminou com o parecer favorável do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao Incra no final de 2010.
As aulas iniciaram em regime de alternância, ou seja, os estudantes passavam de 80 a 120 dias na universidade e depois mais dois meses nas suas comunidades, realizando trabalhos acadêmicos e de pesquisa prática.