terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Oportunidade para crescer junto com o Brasil. Henrique Meirelles, OESP

Em maio de 2016, ao assumimos a Fazenda, a situação da economia brasileira era gravíssima. Atravessávamos a pior recessão que o Brasil já viveu, maior que a grande crise de 1929. Estávamos no 6.º trimestre consecutivo de queda no PIB e tudo indicava que os trimestres seguintes seriam muito ruins. A produção industrial havia caído 7,3% em 12 meses e o comércio, 10,2%. O índice de confiança do setor de serviços caíra 6,7% em 12 meses, e a do setor de construção, 8%. Já a confiança do consumidor havia caído 6,9%. A inflação acumulada em 12 meses era de 9,6%, em trajetória ascendente. Os juros Selic estavam em 14,25%. O risco Brasil, medido pelo CDS, estava em torno de 360 pontos-base.
Sob ceticismo se as reformas seriam aprovadas e se o Brasil conseguiria sair da recessão, implantamos uma política forte de ajuste da economia.
Um ano e sete meses depois, todas essas dúvidas foram superadas. O Brasil já cresceu no primeiro trimestre de 2017, mas o crescimento esteve concentrado na agricultura. A partir do segundo e terceiro trimestres, houve crescimento em praticamente todos os setores. De acordo com os últimos dados disponíveis, a produção industrial cresceu 5,2% nos últimos 12 meses, o comércio cresceu 7,5%, o PIB subiu 1,4% e a inflação caiu aos menores patamares históricos. O IPCA acumulado em 12 meses está em 2,8% e os juros Selic em 7%, enquanto o risco Brasil está em torno de 170 pontos.
Há cerca de um ano, o desemprego subia em ritmo acelerado, mas o mercado de trabalho reagiu antes do que muitos analistas esperavam. Em termos dessazonalizados, o desemprego começou a cair em abril e vem caindo desde então. O número de pessoas ocupadas cresce fortemente. Nos últimos 12 meses, foram geradas um milhão e seiscentas mil vagas de trabalho.
Com a recuperação já instalada em diversos ramos de atividade, a questão agora é outra: quanto podemos esperar de crescimento da economia nos próximos anos? A média dos analistas projeta crescimento de 2,6% para 2018, convergindo depois para 2,5% nos anos à frente, até 2021. Acreditamos, porém, que será sensivelmente maior que isso, sendo que a nossa previsão para 2018 é de 3%.
O número de 2,5% de crescimento é aproximadamente quanto o Brasil cresceu nos últimos 20 anos, levando em conta dados demográficos. É natural esperar que o crescimento no futuro seja próximo à média do passado. Mas esse raciocínio não leva em conta as profundas transformações que estão ocorrendo em nossa economia, devido às reformas em curso.
Nesse curto espaço de tempo, o governo está aprovando quatro tipos de reformas estruturais, que transformam completamente a produtividade da nossa economia.
Primeiro, o ajuste fiscal e a mudança de paradigma sobre o crescimento do Estado. Desde a Constituição de 1988, o Estado brasileiro cresceu muito mais que a economia como um todo. Os gastos federais, que eram 10,8% do PIB em 1991, chegaram a 19,9% no ano passado. A conta reversa é que o setor privado teve de encolher 10 pontos porcentuais do PIB.
O teto dos gastos, já aprovado, reverterá esse processo. Ao manter as despesas primárias do governo federal constantes em termos reais, como o PIB continua crescendo, o tamanho do governo será reduzido como proporção do PIB. Estimativa conservadora é que em dez anos as despesas da União cairão gradativamente de 20% para 15% do PIB. Isso fará com que o setor privado se expanda, trazendo mais eficiência e produtividade para a economia, com mais recursos disponíveis para investimentos. Para que isso ocorra, é imprescindível que se reforme o sistema de Previdência, que além de corrigir desigualdades e unificar os sistemas de aposentadoria, diminui enormemente o déficit nas contas públicas.
Além disso, a reforma trabalhista também foi importantíssima. A legislação trabalhista do Brasil foi criada por Getúlio Vargas nos anos 40, e as inovações tecnológicas causaram mudanças radicais nas formas de organizar a produção. A lei trará benefícios relevantes para o funcionamento do mercado de trabalho. Os benefícios são óbvios. Aumento da segurança jurídica para empregados e empregadores, e redução do número de conflitos trabalhistas. A consequência é tanto maior emprego quanto menores custos relacionados ao insumo trabalho.
Em terceiro, as várias reformas relacionadas ao crédito, algumas já aprovadas e outras em tramitação. Como a da TLP, que cria um alinhamento no custo do crédito público, aumenta o poder da política monetária, e permite que os juros da economia fiquem mais baixos, de forma sustentável. Outras são a Letra Imobiliária Garantida, que reduz o risco da operação e consequentemente o spread, a duplicata eletrônica, que cria um ambiente centralizado para registro de duplicatas mercantis e recebíveis de cartão de crédito, a permissão de diferenciação de preço entre os meios de pagamento, o cadastro positivo, que é um poderoso instrumento para reduzir os juros aos bons pagadores e, finalmente, a nova lei da recuperação judicial, que visa a reduzir o prazo e os custos do processo de recuperação e liquidação, incentivar o aporte de novos financiamentos, melhorar as garantias do adquirente de ativos e reduzir a insegurança jurídica.
Quarto, as demais reformas microeconômicas. É um projeto em conjunto com o Banco Mundial, simplificando os processos burocráticos que dificultam a vida dos brasileiros.
Alguns exemplos são medidas de desburocratização. O eSocial, que simplifica o pagamento de obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias, reduzindo o tempo gasto pelas empresas para preenchimento de declarações e formulários. O Sped, um sistema público de escrituração, que unifica a prestação de informações contábeis e tributárias. Implantação nacional da Nota Fiscal de Serviços Eletrônica e do Redesim – Rede para Simplificação do Registro e Legalização de Empresas e Negócios. A expansão do Portal Único do Comércio Exterior e do Operador Econômico Autorizado, que trazem benefícios relacionados à facilitação dos procedimentos aduaneiros, reduzindo o tempo de desembaraço das mercadorias.
Os resultados que estamos obtendo em alguns itens já são impressionantes. Para exemplificar, estamos trabalhando para atingir os seguintes objetivos: o tempo para abertura ou fechamento de empresas irá dos cerca de 100 dias atuais para 7, e depois para 3. O tempo de pagamento de impostos será reduzido em 70%. O tempo de licenciamentos, formulários, burocracia para exportar ou importar mercadorias cairá em 60%.
Tomados em conjunto, esses quatro tipos de reformas estruturais elevarão nosso crescimento potencial para valores bem superiores aos observados nas últimas décadas. É possível que em vez de 2,5%, cresçamos 3,5% ou 4% durante a próxima década.
É fundamental observar que houve transformações importantes em vários aspectos do processo produtivo. Temos de continuar trabalhando, avançando na agenda de reformas, para que não haja desvio desse cenário positivo. Mas estamos convictos de que teremos boas surpresas com nossa economia nos próximos anos. E que há uma grande oportunidade para crescer junto com o Brasil.
*É ministro da Fazenda

Boeing & Embraer, por Celso Ming, O Estado de S.Paulo


Há muita coisa boa a desfrutar com anúncio de que Embraer e Boeing negociam arranjo

Celso Ming, O Estado de S.Paulo
24 Dezembro 2017 | 08h11
O anúncio de que Embraer e Boeing negociam um arranjo não pode ser analisado pela ótica da desnacionalização em marcha, como os aflitos de sempre se apressam em protestar. Tem que ser visto pelo lado do que é melhor para o Brasil. E há aí muita coisa boa a desfrutar.
Há o reconhecimento de que a Embraer conquistou lugar especial no setor. Se não tivesse sido privatizada, como foi em 1994, não passaria de um monte de sucata ou de cabide de empregos, como aconteceu com a Engesa, que fazia veículos bélicos para uso em terra.
A Boeing está vindo atrás porque sentiu que precisa se posicionar no segmento de jatos de médio porte, principalmente depois que a europeia Airbus e a canadense Bombardier anunciaram, em outubro, planos de fusão.
Também é preciso ter em conta que a Embraer, terceira maior produtora de jatos no mundo, se tornou um dos campeões nacionais porque livrou-se de vícios que tomam outros setores da indústria, como subsídios e, principalmente, políticas supostamente nacionalistas, como exigências de conteúdo local. De 17% a 20% dos componentes das aeronaves da Embraer vêm de fora. Ela não foi obrigada a pagar mais caro para desenvolver o que outros países e empresas fazem mais barato. No caso das aeronaves da família E-Jet E2, as asas têm parte da estrutura feita em Portugal; a cabine e seus assentos são do Reino Unido; o motor das turbinas, do Canadá; o sistema estabilizador, dos Estados Unidos; o sistema de controle de flaps vem da Alemanha... E assim vai. A Embraer se especializou em produzir projetos e conceitos.
A Embraer não é uma empresa que tenha um dono. Cerca de 65% de seu capital está pulverizado no mercado. Tem como principais acionistas a norte-americana Brandes (15% do total), a Mondrian (10%), o BNDES (5%) e o fundo Blackrock (5%). O Tesouro brasileiro possui uma golden share, ou prerrogativa de vetar qualquer negócio que contrarie o interesse nacional.
A proposta em negociação não está clara. Mas não dá para dizer que seja de compra pela Boeing. Por disposição estatutária, nenhum acionista pode ter mais do que 35% das ações da empresa.
Mas já dá para antever algumas das vantagens de que desfrutaria a Embraer a partir de uma associação com a Boeing. A primeira delas seria o fortalecimento do seu próprio segmento do mercado que está sendo deslealmente atacado pela Bombardier e pode enfrentar forte concorrência de novos players, especialmente da China, do Japão e da Coreia do Sul. Segunda vantagem, a Embraer poderia partilhar com a Boeing a faixa de aviões de grande porte. E, terceira, ganharia importante reforço em seu capital.
Não faz sentido o discurso de que a Embraer também fabrica aviões militares e, por isso, não se podem misturar interesses das empresas por motivos de segurança nacional. É difícil imaginar que os produtos da Embraer para fins militares sejam segredos importantes para os norte-americanos – até porque qualquer um dos produtos pode ser adquirido no mercado. Em segundo lugar, a Boeing tem mais abrangência e produtos de defesa do que a Embraer.
De todo modo, antes de conhecer melhor o que está em jogo, não se terão os principais elementos para uma melhor avaliação desse pretendido acordo.

A economia brasileira em 2018, 0 Luiz Schymura , O Estado de S.Paulo



Um crescimento na faixa de 3% no ano que vem parece não ser nada desafiador






Luiz Schymura *, O Estado de S.Paulo
24 Dezembro 2017 | 05h00
Estamos a menos de um ano da eleição presidencial. O que esperar do cenário econômico para 2018?
Para tornar mais clara minha reflexão, divido-a em dois campos: conjuntural e estrutural. Começarei apresentando os aspectos conjunturais interno e externo relevantes para uma avaliação da economia brasileira.
Por conta de dois anos, 2015 e 2016, de forte retração da atividade econômica e do incômodo convívio com uma taxa de desemprego de dois dígitos, o PIB brasileiro apresenta desempenho aquém da capacidade produtiva do País. Há ociosidade dos fatores de produção. Ao quantificá-la, os especialistas não chegam a um consenso. Os mais otimistas creem que exista espaço para elevar o nível do PIB em 8%, enquanto que, na outra ponta, os pessimistas calculam um hiato do produto na faixa de 3%. Seja quanto for, um crescimento na faixa de 3% em 2018 parece não ser nada desafiador.

Sapato
Ociosidade. Setor produtivo tem capacidade para crescer sem investir Foto: JF DIORIO
Observando a conjuntura internacional, a economia dos países desenvolvidos cresce de forma sustentada, a taxa de desemprego encolhe, e a taxa de inflação mantém-se baixa e sob controle. E o mais importante: para fugir da baixa rentabilidade, o capital procura pouso em estâncias fora do primeiro mundo.
Neste contexto, oitável. Nest interesse em investir e aportar recursos em nosso País se amplia, desde que, evidentemente, o nível de risco percebido internacionalmente seja acea frente, portanto, as notícias são muito positivas.
Passo agora ao aspecto estrutural que poderia afetar a economia brasileira em 2018: as contas do setor público. Os dados relativos ao desajuste fiscal não deixam margem a dúvidas. O Estado brasileiro convive com um desequilíbrio recorrente em seu orçamento: não consegue gerar em cada exercício fiscal receita suficiente sequer para cobrir as despesas, mesmo quando o pagamento do juro não é computado. O processo de deterioração é inquestionável. Em dez anos, o resultado primário saiu de um patamar de 3% de superávit para 2,4% de déficit, em 2017.
Embora o estoque, isto é, o tamanho da dívida, ainda não seja um problema aterrador, o débil desempenho das contas públicas ano após ano coloca em cheque a solvência do setor público. Os dados são contundentes. A partir de 2013, a dívida líquida cresce de forma inequívoca, saindo de cerca de 30,5% para 50,7% do PIB em outubro deste ano.
A impressão que se tem é a de que o bom desempenho estrutural da economia brasileira deve passar pela melhora consistente no resultado das contas públicas. Por conseguinte, como anda o processo para reverter o descompasso fiscal?
Sob a ótica da União, a contenção na expansão dos gastos virou o alvo. Com a aprovação da Emenda Constitucional 95, de 15 de dezembro de 2016, a chamada emenda do teto, as despesas do governo central não podem mais crescer acima da inflação. Ao cumpri-la, os levantamentos feitos por técnicos sugerem que o problema fiscal estará resolvido. Pelo menos em tese as contas públicas ficarão equilibradas.
Contudo, é importante dar uma noção do esforço fiscal necessário implícito na observância da emenda constitucional. Ao longo dos últimos 20 anos, os gastos da União crescem a uma taxa média em torno de 6% reais ao ano. Em termos prospectivos, caso nenhuma mudança importante seja efetuada nos programas existentes, a elevação continuará ao ritmo de cerca de 3,5% reais ao ano. Ao supor que a reforma da Previdência proposta pelo governo comece a viger, Manoel Pires, pesquisador da FGV Ibre, estima que a taxa de expansão operará na faixa de 2,2% reais ao ano.
A emenda constitucional, por seu turno, exige que as despesas da União cresçam a uma taxa não superior a 0% real ao ano. Caso contrário, o teto será violado. Como se vê, a tarefa não é simples. O corte tem de ser expressivo.
Ao analisar os dados, os especialistas reconhecem a grande dificuldade no respeito ao teto já em 2019. Embora a emenda constitucional estabeleça dispositivos de ajustes, é difícil imaginar um cenário no qual eles sejam acionados. Antes que isso aconteça, o País chegará a um nível visível e incômodo de paralisação da máquina pública, com cortes crescentes do custeio flexível para compensar o aumento irrefreável das despesas rígidas.
Embates político-institucionais estarão, portanto, na ordem do dia. É inexorável. Com todos os seus propagados méritos no equacionamento das contas públicas, a emenda constitucional abrirá uma caixa de Pandora de indagações, incertezas e riscos. Com isso, parece inevitável que ao longo do próximo governo seja instituído um marco legal que substituirá a emenda do teto.
Enfim, resta saber de que forma a economia brasileira responderá aos sinais trocados oriundos dos aspectos conjuntural e estrutural. De um lado, as contas públicas ainda não controladas desestimulam o investimento. Por outro lado, a ociosidade nos meios de produção, legada pela crise, conjugada com os ventos internacionais extremamente favoráveis, permitirá uma melhora significativa no PIB, sem a consequente pressão inflacionária.
O cenário dos pesquisadores da FGV Ibre é de melhora nos principais indicadores no próximo ano. Assim, a taxa de crescimento sai de 1% em 2017 e atinge 2,8% em 2018. A taxa de desemprego, por sua vez, parte do patamar de 12,8% neste ano e reduz-se para 12,4% no próximo. A taxa de inflação firme em torno de 3,9% e taxa de juro com expectativa de estar rodando na faixa entre 6,75% e 7,25% em 2018. Um aspecto, no entanto, não pode passar despercebido: o crescimento será liderado pelo consumo das famílias.
Isso torna o avanço menos suscetível aos atribulados movimentos políticos porvir, diferentemente do que se esperaria caso a alavanca da expansão fosse o investimento. Afinal, é de se esperar que a decisão de investir seja mais sensível ao quadro político do que a de consumir.
Continuando ainda na toada do exercício de futurologia. O debate em 2018 será pautado por especulações sobre o que será feito a partir de 2019. De concreto, nada. Apenas promessas e suposições. No novo governo, entretanto, tanto os arranjos políticos como a conjuntura global possivelmente terão outra configuração. A crise fiscal, contudo, estará lá, firme e difícil de ser gerida.
* Pesquisador da FGV Ibre