quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Corintiano ganha estádio que terá a sua própria cara



02 de dezembro de 2012 | 2h 07
EDUARDO ASTA / INFOGRAFIA, TEXTO, JONATAN SARMENTO / ILUSTRAÇÃOALMIR LEITE, PAULO FAVERO, REPORTAGEM - O Estado de S.Paulo
A cada dia que passa a Fiel está vendo o sonho da casa própria se tornar realidade. Em Itaquera, a Arena Corinthians caminha em ritmo acelerado para receber a abertura da Copa do Mundo de 2014 em um projeto que já conquistou o VIII Grande Prêmio de Arquitetura Corporativa no ano passado e que tem como principal aspecto conciliar a simplicidade das formas com os anseios do corintiano. "A primeira ideia é que o estádio servisse à torcida, que ajudasse o time a ganhar jogos. Então eu quis botar a torcida dentro do campo para empurrar a equipe", conta Anibal Coutinho, idealizador do projeto.
Ele também revela que uma exigência do clube foi dar conforto à torcida. "No estádio não haverá nenhum ponto ruim para ver o jogo, pois as curvas de visibilidade são boas. Optamos por fazer um estádio compacto, para ter a ideia da massa", diz. Com capacidade para 48 mil torcedores, será ampliado para receber a abertura da Copa. Ganhará arquibancadas móveis atrás dos gols e em um dos lados do campo, o que aumentaria sua capacidade para até 72 mil lugares.
Mas, para receber o jogo inaugural do Mundial, alguns assentos serão sacrificados para atender posicionamentos de câmeras e áreas vips, o que faria com que a capacidade ficasse em 65 mil lugares.
E, justamente por causa da Copa de 2014, a grande dificuldade foi fazer uma arena que servisse ao clube, mas também ao maior evento do planeta.
"As exigências da Fifa foram um estímulo, pois superamos os desafios e fomos além do que era pedido", explica Coutinho. "O estádio sairia de qualquer maneira e o legado é para o torcedor corintiano." Ele revela que o banheiro da área vip será igual ao da área comum. "O banheiro luxuoso é o da área comum, são todos excepcionais. Fizemos também menos cadeiras do que poderíamos colocar, com mais espaço entre elas, para dar um grau de conforto maior."
Um ponto alto do projeto arquitetônico é a cobertura, que passa a impressão de que o teto está flutuando em cima das arquibancadas. "Quisemos passar a ideia de leveza, que tem a ver com o futebol do clube, com a categoria dos atletas. É uma identificação e acho que o estádio terá a cara da torcida", afirma.
A cobertura permite ainda que o estádio seja ventilado e ao mesmo tempo que ela é arrojada arquitetonicamente, também possui o formato perfeito para iluminação HD 3D.
Em reunião com a Osram, empresa que fornecerá a iluminação, o Corinthians ouviu do parceiro que o teto tem boa angulação e altura para as transmissões em três dimensões que serão usadas em 2014.Aliás, a empresa alemã de iluminação é uma das 33 que vão participar de alguma forma da construção do estádio.
Custo reduzido. O Corinthians sentou com cada fornecedor, negociou preços, ofereceu contrapartidas e conseguiu descontos significativos nos produtos. Segundo Luis Paulo Rosenberg, vice-presidente do clube, a economia que foi feita ajudou até a introduzir novos itens, que não estavam previstos, na arena. "Acho que vamos conseguir fazer uma obra mais barata do que estimamos, mas colocando de 30% a 40% a mais do que imaginávamos", revela.
O telão que ficará na fachada externa e que mostrará imagens da torcida, considerado o maior do mundo, veio dessa economia que foi feita. Ele terá 170 m de comprimento por 20 m de altura. "Quando começamos a ver os fornecedores, falamos para a Odebrecht: 'deixa que a gente negocia'. Acredito que até o final do ano teremos acordos com 50 empresas", lembra Rosenberg. Ele aponta como pontos cruciais do estádio o gramado, as posições das câmeras e a iluminação, lembrando que todos esses itens ficarão acima do que a Fifa exige.
Setores. O dirigente diz que vai colocar oito faixas de preços de ingressos, mas partindo do conceito que ele apelida de Robin Hood: cobrar caro de quem pode mais para subsidiar os ingressos de quem pode menos.
"O Corinthians tem capacidade de extrair dinheiro da classe alta como ninguém. Os setores mais caros terão escadas rolantes, elevadores, bares temáticos e restaurantes três estrelas. Isso vai gerar o excedente para baratear os ingressos populares."
A partir deste princípio de segmentar a arena, Coutinho criou na parte oeste os setores para a elite, onde o Corinthians poderá vender ingressos por temporada, cadeiras vip, etc, para que isso possa subsidiar o estádio inteiro. "A torcida não será expulsa, o Corinthians vai contra a maré. Foram pedidos do clube. A parte vip subsidia o ingresso da massa, e a massa terá o mesmo conforto dos outros setores: ar-condicionado, piso da mesma qualidade, mesmo banheiro."
Com o ingresso caro, o torcedor terá estacionamento mais próximo, comida incluída e áreas exclusivas para frequentar, entre outras coisas. Enfim, o sonho da casa própria está se tornando realidade. E com a cara da Fiel.

O sucesso do fracasso, por Sérgio Malbergier, na FSP



Só tem uma coisa mais perigosa do que um desenvolvimentista convicto: um desenvolvimentista desesperado.
Diante do biênio perdido do governo Dilma, com crescimento pífio que não deve passar muito de 1% neste ano, se tanto, os timoneiros à frente da política econômica nacional, sob forte pressão da presidenta economista-em-chefe, radicalizam a fé cega de que cabe ao Estado fazer o país crescer. Isso foi claro nos dois primeiros anos do governo Dilma e, após o fracasso dessa visão, ela está sendo... reforçada. A caixa de bondades (e maldades) foi aberta.
O tiro mais feio até aqui veio do ministro da Fazenda e desenvolvimentista-mor, Guido Mantega, que acusou o IBGE de errar o cálculo do PIB do terceiro trimestre deste ano.
Se os empresários nacionais e estrangeiros têm já enorme desconfiança no centralismo (para alguns, autoritarismo) econômico da gestão Dilma, o cheiro de argentinização infestou o ar, pois é no decadente país vizinho que os índices econômicos passaram a ser manipulados pelo governo e perderam a credibilidade.
Por aqui, depois do biênio perdido, governar-se-á desesperadamente pelo PIB confortável para uma presidenta em campanha de reeleição. Como se esse número, calculado até agora de forma independente pelo IBGE, fosse mais importante do que o ambiente de negócios no país, a eficiência judiciária, a inteligência tributária.
A necessidade de redução do custo da energia, por exemplo, unanimidade nacional, veio da forma mais truculenta possível, com o governo impondo às empresas do setor redução de ganhos. Quando algumas empresas se negaram a aceitar o plano, Dilma as acusou de antipatriotas por fazerem política sobre o assunto (quando é ela quem o está fazendo). É um quadro que assusta os investidores, já que o que os move, naturalmente, é o lucro.
O curioso é que o governo fez muito do que boa parte do empresariado pedia: quebrou a espinha dorsal dos juros altos, depreciou o real para ajudar os exportadores, tomou medidas protecionistas para barrar importações, impôs custosas reservas de mercado em setores sensíveis como o petróleo. E nada do empresário, nacional e estrangeiro, investir.
Agora anunciou mais R$ 100 bilhões do BNDES para promover o investimento no país. "É o melhor instrumento para financiar investimento que já tivemos no Brasil, com taxas reduzidas e prazos elevados", argumentou o ministro Mantega, que previu crescimento de 4% neste ano e deve entregar menos de 1,5%.
É notável nesse desenvolvimentismo tropi-keynesiano como o governo dos sindicalistas enxuga o dinheiro dos trabalhadores para dá-lo aos grandes empresários do país a uma taxa de juros negativa, abaixo da inflação. O dinheiro do BNDES em boa parte é dinheiro do trabalhador, oriundo do FGTS recolhido compulsoriamente dos salários. Se esses recursos sequestrados fossem investidos no (desculpem o palavrão) mercado, renderiam muito mais do que rendem sob a administração do governo.
Sob Dilma, o viés de Estado virou fato. Ele começou a se formar com a crise 2008-2009, no fim da Era Lula, tornou-se hegemônico com Dilma e está sendo paradoxalmente reforçado pelo seu fracasso.
Sérgio Malbergier
Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos "Dinheiro" (2004-2010) e "Mundo" (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve às quintas no site da Folha.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Arranha-céus - MARCOS AUGUSTO GONÇALVES


FOLHA DE SP - 03/12


Construir "espigões" passou a ser politicamente incorreto. Igual plantar eucalipto


Faz um dia radioso e aqui estou eu, no alto do edifício Martinelli, esquina da rua Libero Badaró com a velha ladeira de São João, sobre a colina que se ergue entre os vales do Anhangabaú e Tamanduateí -o coração de São Paulo. São Bento, rua 15, rua Direita, sente-se neste belo pedaço de cidade a espessura histórica da vila dos jesuítas que se transformou em capital do café, metrópole industrial e centro financeiro.

Foi ali que um imigrante italiano, Giuseppe Martinelli, deu início, em 1924, à construção do arranha-céu, idealizado para ser o primeiro do Brasil e o "maior da América do Sul" -como diziam os jornais à época.

O prédio, projetado pelo arquiteto húngaro William Fillinger, da Academia de Belas Artes de Viena, foi concluído em 1929. Naquela época tocava-se no Rio um empreendimento semelhante, o edifício A Noite, na região portuária -obra do francês Joseph Gire e do brasileiro Elisiário da Cunha Bahiana. O arranha-céu carioca, que vai ser restaurado, apareceu recentemente na imprensa como "o primeiro da América Latina". Fiquei surpreso. O Martinelli, então, teria vindo depois?

Eis que, coincidentemente, encontro em São Paulo, o artista plástico Robero Cabot, na galeria Nara Roesler, onde ele participa de uma mostra inspirada na "op art", com curadoria de Vik Muniz. Muito boa, por sinal. Meu caro Cabot é bisneto de Gire e coordena o projeto de um livro sobre a obra do arquiteto no contexto arquitetônico da época.

Ele me diz que o arranha-céu carioca foi, na realidade, inaugurado depois do paulistano. "Tudo indica que foi em 1930. Pelo menos em 1929, não foi. Tenho cartas de meu avô, de 29, reclamando do andamento das obras".

Consta que Martinelli e Gire competiram ao longo da construção e que o italiano teria mandado fazer sua casa na cobertura do prédio para torná-lo o mais alto do país, suplantando o rival do Rio.

Ano a mais, ano a menos, andar a mais, andar a menos, o fato é que o Martinelli e o A Noite são marcos arquitetônicos do nascente processo de verticalização pelo qual passariam as duas grandes cidades nos anos seguintes, a exemplo do que já ocorria em outros lugares do mundo, a começar pelos Estados Unidos, os inventores do "skycraper".

Curiosamente, de décadas para cá, foi-se consagrando a ideia de que a verticalização é um mal. Construir "espigões" passou a ser politicamente incorreto. Igual plantar eucalipto. Não há dúvida de que a anarquia e a truculência da especulação imobiliária estimularam essa reação, no fundo sentimental e nostálgica.

Está claro, hoje, que é preciso verticalizar de maneira planejada. Como aproveitar a infraestrutura do centro expandido para ampliar oferta de moradia? O movimento de empurrar populações de baixa renda para as periferias tem que ser invertido, e isso não vai acontecer com a construção de casinhas. Avenidas como a Rio Branco, por exemplo, poderiam ser mais verticalizadas.

São Paulo está mudando. A metrópole fabril dá lugar à de serviços e as ruínas da industrialização são a base para construção da nova cidade. Há boa oportunidade para propostas inteligentes e ambiciosas, que pensem no entorno, na oferta de comércio e na convivência de pessoas de renda e classes diferentes.

A boa notícia é que esses projetos já existem e são grandes as chances de que venham a ser implantados nos próximos anos.