quinta-feira, 27 de julho de 2017

Um jota a menos, um problema a mais, José Serra, OESP


A ‘terapia’ da TLP, no lugar da TJLP, é do tipo curar a doença matando o doente

*José Serra, O Estado de S.Paulo
27 Julho 2017 | 03h09
Durante a Assembleia Nacional Constituinte, há cerca de 30 anos, fui o relator da comissão que cuidou dos capítulos de orçamento, tributação e finanças. Essa condição, porém, não me permitiu redigir o texto final de acordo com tudo o que pensava, em razão de entendimentos para que dispositivos ruins não fossem aprovados, como, por exemplo, a nacionalização e estatização dos bancos! Em outros casos fui simplesmente derrotado, como na folclórica fixação do teto de 12% para a taxa de juros real da economia.
Uma das inovações da comissão foi a mudança do destino do PIS-Pasep. A ideia inicial de alguns integrantes da comissão era jogar o PIS-Pasep nos fundos de participação de Estados e municípios. Fui contra, pois a própria comissão já havia aprovado aumentos altíssimos do FPE-FPM. Além disso, e a esse respeito nunca tive ilusões, o grosso do aumento adicional desses fundos iria, inexoravelmente, financiar aumentos das despesas de custeio, não de investimentos, de prefeituras e governos estaduais.
A proposta que apresentei terminou prevalecendo. O PIS-Pasep passaria a financiar um Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que cobriria o abono salarial e pagaria o seguro-desemprego. E, de cada R$ 100 arrecadados, aplicaria R$ 40 no BNDES. O rendimento obtido engrossaria o patrimônio do FAT. Isso tudo ficou cravado na Constituição e na lei correspondente. A lógica era simples: faz-se uma poupança para financiar projetos de investimento, que contribuem para o crescimento da economia, e nos anos de retração a reserva financia o gasto com mais seguro-desemprego.
O FAT passou a ser remunerado segundo a inflação mais taxa fixa. Assim foi até o segundo semestre de 1994, início da vigência do Plano Real. A queda radical da inflação jogara os juros reais dos empréstimos contratados no BNDES para as nuvens. Por isso mesmo o então presidente do banco, Pérsio Arida, elaborou e implantou a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP). Ao longo dos anos, a regra para a fixação da TJLP foi composta por juros internacionais livres de risco, somados ao risco Brasil, mais as metas de inflação (adotadas a partir de 1999).
Há unanimidade de que os níveis dos investimentos públicos e privados no Brasil despencaram, ficando muito abaixo dos necessários para gerar mais produção e empregos. Mas sem os financiamentos do BNDES e a TJLP a situação teria ficado muito pior, sobretudo por causa dos superjuros pilotados pelo Banco Central.
A combinação dos superjuros com os financiamentos baseados na TJLP foi, digamos assim, mais que deturpada na era petista, pela política de imensos e crescentes empréstimos do Tesouro ao BNDES – cerca de R$ 0,5 trilhão –, a fim de desenvolver programas de investimentos (e subsídios) decididos pelo governo federal. Para tanto o Tesouro emitia títulos não previstos na lei orçamentária. A partir de medidas provisórias, portarias do Ministério da Fazenda e decisões do Conselho Monetário Nacional, decidia-se o tamanho dos empréstimos e dos subsídios, os prazos, os setores privilegiados e a remuneração dos agentes financeiros (incluído o setor privado).
Esquematicamente, o Tesouro captava recursos no mercado financeiro aos siderais juros Selic e o BNDES emprestava-os à TJLP ou a taxas ainda menores. A literatura crítica desse método, tendo à frente o economista José Roberto Afonso, foi incansável na reiteração, bem fundamentada, de que se estava criando um verdadeiro e explosivo “Banco do Tesouro”, com os consequentes desequilíbrios fiscais e a deturpação do papel do BNDES, que acabou levando a “culpa” por uma decisão que não foi dele e não o beneficiou.
Consequência dessa situação foi a edição da MP 777, determinando que nas operações do BNDES seja trocada a TJLP pela nova TLP – taxa de juros de longo prazo a ser apurada a cada mês. O economista Felipe Salto fez um cálculo retroativo simples e interessante, que precisa ser conhecido pela atual equipe econômica: se a TLP estivesse valendo desde 2003, durante dois terços do tempo ela teria sido superior à própria Selic.
A “terapia” da TLP é do tipo “curar a doença matando o doente”, começando por derrubar maciçamente os já escassos planos de investimentos. Além disso, o FAT decorre de vinculação constitucional e os aumentos de receitas provenientes dos maiores juros serão neutros do ponto de vista do resultado primário das contas públicas. Não cabe aplicar livremente a ideia de custo de oportunidade em receita vinculada a tributos. Ao contrário, a TLP aumentará o montante de recursos equalizados pelo Tesouro, por exemplo, no caso dos financiamentos agrícolas com fonte BNDES, impactando assim negativamente o resultado fiscal primário. Isso valerá para todas as linhas de crédito que hoje são equalizadas com base na TJLP. Os subsídios financeiros previstos no Orçamento serão maiores. Ninguém do governo notou isso?
A precariedade da tese alcança também a política monetária, quando se sustenta que a TLP contribuirá para aumentar sua potência. A atuação do Banco Central no gerenciamento cotidiano da liquidez mira a Selic. Como o Brasil é uma exceção, posto que a maior parte dos títulos emitidos são papéis pós-fixados, os juros de curto prazo sempre precisam subir mais do que o necessário, dado o efeito renda positivo dos investidores produzido em ciclos de alta. A TJLP, nesse contexto, foi criada justamente para suprir a ausência de um mercado de longo prazo.
Melhor seria ajustar a MP 777 em dois aspectos. Por um lado, na contabilidade do BNDES, segregar os recursos de dívida pública e aplicar-lhes a TLP, mas manter a TJLP para o FAT. Por outro, aumentar a transparência exibindo o efeito fiscal de todo e qualquer crédito concedido, seja via equalização ou subsídio implícito, como mandam os manuais do FMI e da OCDE. Foi esse o espírito da emenda que aprovei em 2015 obrigando a Fazenda a publicar o impacto fiscal das operações do BNDES. Intensifiquemos os trabalhos nessa direção, sob risco de o banco voltar à posição de gigolô do Tesouro, como diria Roberto Campos.
*Senador (PSDB-SP)

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Contran aprova carteira de habilitação digital, G1


Documento poderá ser apresentado em smartphones a partir de fevereiro próximo, diz Ministério das Cidades. Versão impressa continuará sendo emitida.

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Rafael Siqueira, Advogado
Publicado por Rafael Siqueira
há 9 horas
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A Carteira Nacional de Habilitação Eletrônica (CNH-e) foi aprovada nesta terça-feira (25) pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Segundo o Ministério das Cidades, ela será uma versão do documento com o mesmo valor jurídico da CNH impressa e estará disponível a partir de fevereiro próximo.
Os motoristas poderão apresentar o documento de porte obrigatório tanto impresso quanto em formato digital, no smartphone.
O ministério afirma que há um conjunto de padrões técnicos para suportar um sistema criptográfico que assegura a validade do documento. A autenticidade da CNH digital poderá ser comprovada pela assinatura com certificado digital do emissor ou com a leitura de um QRCode.
Com esse dispositivo, os agentes de trânsito também poderão consultar os dados dos documentos por meio de um aplicativo de celular, que ainda está em fase de testes. O app fará a leitura do QRCode, como já é realizado com a CNH impressa.
"Com isso, quem esquece a CNH em casa não estará sujeito a multa e pontos na carteira. Basta apresentar o documento digital”, diz o ministro das Cidades, Bruno Araújo.
O Contran ressalta que a CNH impressa continuará sendo emitida normalmente.

Como vai funcionar

• Cadastro - O usuário realizará o cadastro no Portal de Serviço do Denatran e confirma seu email com o uso de certificado digital. Para isso, o acesso deve ser efetuado por um equipamento que permite o uso desse certificado; ou por meio do seu e-mail, no balcão do Detran.
• Ativação do cadastro - Será enviado um link para o email informado. Em seguida, o motorista deverá realizar o login pelo aparelho onde deseja ter sua CNH digital.
• Segurança - No primeiro acesso, será preciso criar um PIN (código) para armazenar os documentos com segurança. Será preciso inserir o PIN criado para poder visualizar os documentos.
• Bloqueio – Caso necessite bloquear o aparelho para impedir o uso de sua conta e acesso aos seus documentos, o usuário deve acessar o Portal de serviços do Denatran com o certificado digital e solicitar o bloqueio.

A fervura de Henrique Meirelles, FSP

Não se diga que estão fritando Henrique Meirelles. Ele é um queridinho do mercado, entende-se bem com Michel Temer e vocaliza as ortodoxias de gênios que sabem como consertar o Brasil, mas não conseguem conviver bem com seu povo. Meirelles está sendo fervido.
A fervura de um ministro difere da fritura porque enquanto a frigideira é desconfortável desde o primeiro momento, inicialmente o panelão oferece um calorzinho agradável. Depois é que são elas.
Desde o amanhecer do governo, Michel Temer flertava com a abertura de um balcão no Planalto. O ministro da Fazenda conseguiu contê-lo, até que surgiu o grampo de Joesley Batista. Para salvar seu mandato, o presidente abriu os cofres para os piores interesses predatórios instalados no Congresso. Não se deve esquecer que Meirelles foi levado para a Fazenda numa equipe em que estavam o senador Romero Jucá e o deputado Geddel Vieira Lima.
Temer deu a Meirelles quase toda a autonomia que ele pediu, mas o ministro não entregou os empregos e a perspectiva de crescimento que prometeu. Entrou no governo oferecendo um aumento de 1,6% para este ano e elevou o balão para 2%. Tudo fantasia, hoje o FMI espera 0,3%.
Na segunda-feira, ao ser indagado sobre a possibilidade de um novo aumento de impostos, ele informou: “Tudo é possível, se necessário”. Frase típica das serpentes encantadas pelos refletores. Não quer dizer absolutamente nada. Enuncia um dilema que exige a definição de “possível” e de “necessário”. Atravessar uma rua com o sinal fechado, por exemplo, pode parecer necessário, mas deixa de ser possível se o cidadão é atropelado. O Visconde de Barbacena achava que a derrama era necessária. Descobriu que não era possível.
Todos os ministros da Fazenda desempenham o papel da animadores do auditório. Alguns fazem isso com elegância, como Pedro Malan, outros, de forma patética, como Guido Mantega. Meirelles distanciou-se de Malan e caminha para o modelo de Mantega, num governo onde estão Michel Temer e seu mundo de bichos fantásticos.
Em fevereiro, Meirelles anunciou pela primeira vez: “A mensagem importante é que essa recessão já terminou”. Atrás dele veio uma charanga comemorativa. No mundo real, seu teto de gastos estourou, a reforma da Previdência será diluída e benza-se aos céus se o piso dos 65 anos for preservado. No caso da reforma trabalhista fingiu-se que acabou o imposto sindical, ao mesmo tempo em que o governo negocia uma nova tunga. Antes, os trabalhadores formais pagavam um dia de trabalho a uma máquina infiltrada pela pelegagem e trabalhadores e patrões. Pelo que se negocia, algumas categorias serão mordidas em mais que um dia.
O remédio de Meirelles foi aumentar um imposto. Faça-se justiça ao doutor registrando que ele nunca se comprometeu a não aumentá-los. O seu problema é outro. Ele lida com essas taxações como se fossem uma arma para punir uma sociedade que é obrigada a pagar porque ele e seu presidente não fazem o serviço que prometem.
Um dia Meirelles deve dar uma olhada na galeria de doutores que o antecederam. Nos últimos 20 anos, foram 14. Pelo menos sete foram fritos. Antonio Palocci está na cadeia, uns três deveriam ter ido para o hospício. Inteiros, saíram só dois, Malan e Fernando Henrique Cardoso, mas todos foram homenageados pela mesma orquestra que hoje ensaboa Meirelles.
Artigo publicado Folha de São Paulo – disponível na internet 26/07/2017