sexta-feira, 25 de março de 2022

Belo Monte alerta sobre risco de megaprojeto de ouro ao lado da usina, OESP

 BRASÍLIA -A concessionária Norte Energia, dona da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, enviou um pedido ao governo do Estado, para que seja reavaliado o projeto de mineração de ouro da companhia canadense Belo Sun, que pretende transformar uma região localizada a poucos quilômetros da barragem da hidrelétrica no maior garimpo industrial do Brasil.

Estadão teve acesso a um ofício que a Norte Energia enviou na semana passada à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), órgão do governo paraense responsável por licenciamento ambiental no Estado. No documento, que também foi encaminhado ao Ibama e Funai, a dona de Belo Monte alerta que estudos já realizados “apontam conflito entre as atividades e risco de implantação de atividade minerária em conjunto com a operação da UHE (usina hidrelétrica) Belo Monte”.

Apesar de haver uma série de “efeitos cumulativos e sinérgicos entre os projetos de mineração e hidrelétrico”, o processo de licenciamento do “Projeto Volta Grande”, da canadense Belo Sun, é tocado pela secretaria estadual de meio ambiente, enquanto a hidrelétrica de Belo Monte foi licenciada pelo Ibama.

Há anos, o Ministério Público Federal em Altamira questiona o rito de licenciamento. A própria Norte Energia alertou, em 2013, que tinha preocupação com eventuais impactos que a mineração possa gerar em sua estrutura. O processo de extração de ouro previsto para a região inclui o uso constante de explosivos, durante anos de atividades. A Belo Sun já negou que haja riscos de abalos sísmicos, mas a realidade é que, nove anos depois, a questão não está resolvida.

Belo Monte
Usina hidrelétrica de Belo Monte; concessionária aponta conflito entre atividades e risco de implantação de atividade minerária em conjunto com a operação da hidrelétrica Foto: TV Brasil

“Solicita-se, desde já, a reavaliação do processo de licenciamento ambiental de Belo Sun, a fim de que o tema em questão possa ser objeto de análise técnica detalhada e de imprescindível interlocução entre os interessados”, afirma a Norte Energia, em ofício que foi encaminhado dia 14.

Procurada pela reportagem, a Norte Energia não se manifestou sobre o assunto, mas o fato é que a empresa que opera a maior hidrelétrica do País nunca viu o empreendimento vizinho com bons olhos. Ainda assim, a Semas do Pará liberou, em 2014, a licença prévia do projeto de mineração nas margens do Rio Xingu, uma autorização que atestaria a sua viabilidade ambiental, desde que cumpridas determinadas exigências. Em 2017, a secretaria emitiu a licença de instalação para o Projeto Volta Grande, permitindo a montagem da infraestrutura para a exploração efetiva do ouro, mas uma decisão judicial suspendeu seus efeitos.

Na emissão das duas licenças, foi exigido que a Belo Sun apresentasse documentos e estudos sobre os impactos do projeto na área da usina. Para a Norte Energia, porém, o tema segue em aberto e não há conclusão sobre a viabilidade da mina. Em 2020, foi a vez da Funai se manifestar sobre o assunto e informar que a Belo Sun ainda não tinha apresentado estudos detalhados sobre os impactos associados à usina e mineração.

“No processo de licenciamento da usina de Belo Monte, já há uma exigência de se fazer o monitoramento constante e por seis anos nos cem quilômetros da Volta Grande, devido ao forte impacto dos hidrogramas que passaram a ser aplicado no rio”, Rodrigo Oliveira, pesquisador do Instituto Socioambiental (ISA). “É uma região de extrema vulnerabilidade e que foi profundamente afetada pela hidrelétrica. Por isso, é muito temerário fazer qualquer outro tipo de projeto na área, principalmente nesta fase de monitoramento.”

Questionada sobre o assunto, a Belo Sun Mineração declarou que desconhece o conteúdo do ofício da Norte Energia. A mineradora afirmou que, “nos últimos três anos, manteve um diálogo técnico com a Norte Energia e compartilhou informações atualizadas sobre o licenciamento do Projeto Volta Grande, seja por solicitação da Norte Energia e por iniciativa própria”. 

A empresa informou que as atualizações dos projetos técnicos e sociais são submetidas regularmente ao órgão licenciador, que concluiu a consulta e o Estudo de Componente Indígena com as comunidades locais e que “continuará a promover o Projeto Volta Grande de maneira consciente, dialogando com as partes interessadas, seguindo todas as leis e regulamentos aplicáveis e respeitando as comunidades tradicionais e locais”.

A Semas declarou, por meio de nota, que o processo de licenciamento ambiental de Belo Sun está suspenso por decisão judicial, desde 2017. “A Semas informa, ainda, que a reavaliação de processos faz parte da rotina administrativa da Secretaria.”

O procurador regional da República, Felício Pontes, disse que a Norte Energia reconhece agora aquilo que ribeirinhos e indígenas têm alertado há uma década. “A concessionária confirma aquilo que tem sido dito há muito tempo. A região mal consegue lidar com a estrutura da usina e seus impactos. Dois projetos de grande dimensão naquela região é algo simplesmente insuportável para os milhares de indígenas e ribeirinhos que vivem na Volta Grande do Xingu.”

Reportagem publicada pelo Estadão em dezembro do ano passado revelou que a mineradora canadense Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

Para viabilizar as transações, o Incra estabeleceu que será um tipo de “sócio” da mineração e que vai receber parte do que a empresa retirar de ouro. Somente depois desses detalhes serem revelados, o Incra publicou uma instrução normativa, para permitir esse tipo de parceria em todo o Brasil.

Nova Serra Pelada

A Belo Sun pertence ao grupo canadense Forbes & Manhattan, um banco de investimento voltado a projetos internacionais de mineração. O projeto prevê um investimento total de R$1,22 bilhão. A produção média de ouro calculada pela empresa é de aproximadamente 5 toneladas de ouro por ano. A extração ocorreria por, no mínimo, 12 anos, “com a possibilidade de se estender o prazo, devido ao potencial mineral da região”, conforme afirma a companhia.

São números que fazem frente ao que ocorreu nos anos 1980 na Serra Pelada, no sul do Pará, onde 42 toneladas de ouro foram extraídas em uma década, segundo registros oficiais. No auge daquele garimpo, em 1983, 14 toneladas de ouro foram retiradas do local só naquele ano.

Na fase de instalação do empreendimento da Belo Sun, a empresa calcula que serão gerados 2.100 empregos diretos e outros 6.300 indiretos. Na operação, seriam mais 526 diretos e 1.500 indiretos.

Etna anuncia fim de suas atividades, depois de 17 anos no mercado, OESP

 Depois de 17 anos no mercado, a rede de decoração e móveis Etna anuncia nesta sexta-feira, 25, que "está programando o encerramento de suas atividades". A empresa atua hoje com quatro lojas físicas e uma plataforma de comércio eletrônico. Os pontos de venda serão encerrados gradativamente até o fim do primeiro semestre. A loja da Avenida Berrini, em São Paulo, e o site da companhia continuarão vendendo até o esgotamento dos estoques.

A empresa enviou a clientes, via e-mail, um comunicado de encerramento de atividades, seguido do anúncio de uma queima total de estoques, com descontos de até 90%. A desistência do negócio vem depois de cerca de uma década tentando fazer o projeto de concorrer com gigante como a TokStok “acontecer”. A Etna foi oferecida a vários investidores ao longo do tempo, sem sucesso.

Na nota em que confirma processo de encerramento dos negócios, a Etna afirma que "pertence a um grupo empresarial de sucesso no varejo e irá descontinuar suas operações da melhor forma possível, cumprindo com todos os seus compromissos perante seus colaboradores, clientes, fornecedores e prestadores de serviço".

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Antiga loja da Etna na Marginal Tietê, que deu lugar a um atacarejo  Foto: Paulo Pinto/AE

A Coluna do Broadcast mostrou recentemente que a empresa vinha fechando lojas, além de manter as quatro restantes com prateleiras esvaziadas, enquanto não encontrava compradores para o negócio. A empresa pertence à família fundadora do negócio, os Kauffman, donos também da rede de joalherias Vivara.

Datafolha: Ações 'pró-pobre' de Bolsonaro minam Lula e armam bomba-relógio para 2023, FSP

 Fernando Canzian

SÃO PAULO

As medidas do governo Jair Bolsonaro para a camada mais pobre da população surtiram efeito e o presidente reduziu em oito pontos (de 40 para 32) sua desvantagem em relação a Luiz Inácio Lula da Silva no maior grupo de eleitores: os que ganham até dois salários mínimos e que representam 53% do eleitorado na amostra do Datafolha.

Embora a pesquisa atual não seja diretamente comparável ao levantamento feito em dezembro por conter cenários diferentes (em que foram retirados alguns nomes na disputa e acrescentados outros, todos com pontuações quase irrelevantes), ela sinaliza como o eleitor mais pobre se comporta.

Montagem de Bolsonaro e Lula, ambos de perfil, um olhando para o outro
Bolsonaro e Lula - Anderson Riedel/PR e Bruno Santos/Folhapress

Entre a pesquisa de dezembro e agora, as intenções de voto em Bolsonaro nesse grupo, crucial para decidir a eleição, oscilaram de 16% para 19%. Na contramão, as em Lula cederam de 56% para 51%. A margem de erro da pesquisa, para este segmento, é de três pontos percentuais, para mais ou para menos.

O movimento nesse estrato enorme de eleitores explica a brusca diminuição da vantagem de Lula sobre Bolsonaro entre as duas pesquisas (de novo, não totalmente comparáveis).

Nas intenções de votos totais (todos os grupos), a liderança do petista sobre o presidente encurtou nove pontos, de 26 em dezembro para 17 pontos agora.

Entre as ações já adotadas pelo governo Bolsonaro ou em curso, o Auxílio Brasil é a mais potente. São quase R$ 90 bilhões distribuídos no ano eleitoral a 18 milhões de pessoas vulneráveis e que estão entre as que ganham até dois salários mínimos (R$ 2.424).

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Elas receberão R$ 400 mensalmente até dois meses após o segundo turno, quando o valor deve cair à metade —uma novidade em se tratando de programa de complementação de renda e que nunca foi adotada no Bolsa Família.

Ainda na base da pirâmide, o governo anunciou o abatimento de 92% no valor das dívidas do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) para estudantes inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico).

A estimativa é que mais de meio milhão de pessoas se beneficiem. Para as demais, haverá outros abatimentos, e as dívidas serão parceladas em até 150 vezes.

Em outra frente, pelo terceiro ano consecutivo o governo antecipou o 13º dos benefícios do INSS e permitirá saques de até R$ 1.000 no FGTS, medida que pode injetar até R$ 30 bilhões na economia. Há ainda cortes de impostos em milhares de produtos.

Para Alexandre Rands, economista e presidente da consultoria Datamétrica, do Recife, esse conjunto de medidas tende a continuar favorecendo Bolsonaro principalmente no Nordeste, segundo maior colégio eleitoral do país e onde há maior concentração de eleitores pobres.

"O impacto é muito grande no interior e nas periferias das grandes cidades. Não surpreenderá se Bolsonaro anunciar durante a campanha que, se eleito, manterá o Auxílio Brasil de R$ 400", diz Rands.

Embora a maioria dos atuais governadores do Nordeste sejam favoráveis a Lula (em PE, BA, PI, MA, CE e RN), Rands ressalta que políticos nordestinos (deputados, prefeitos e vereadores) têm perfil conservador e governista, no sentido de dependerem de verbas federais.

"Se houver um estreitamento da diferença entre o presidente e Lula, não descartaria uma avalanche de conversão pró Bolsonaro no Nordeste", afirma.

Para o diretor da FGV Social, Marcelo Neri, o formato "retrátil" escolhido por Bolsonaro para o Auxílio Brasil seria um "populismo versão 2.0" que promete resultados eleitorais.

"O governo está jogando tudo o que tem e inovando, no mau sentido. É como se estivesse distribuindo a velha cesta básica do clássico voto de cabresto, para deixar de dar o benefício após a campanha", diz Neri.

Nesse contexto, a maior crítica ao formato do Auxílio Brasil é que ele desmonta a lógica consolidada de programas sociais focalizados: dar mais a quem tem menos. "Os R$ 400 distribuídos de modo igual acabam funcionado como um maravilhoso outdoor de campanha."

Para especialistas em contas públicas, no entanto, são os cortes ou isenção de impostos adotados neste ano eleitoral que trazem maior risco para o futuro da economia e o próximo presidente.

Bolsonaro decretou corte linear de 25% na alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em fevereiro e nesta semana zerou o imposto de importação do etanol e de seis produtos da cesta básica (café, margarina, queijo, macarrão, açúcar e óleo de soja) até o fim do ano.

Aqui, novamente, o governo deixou de aplicar o princípio da focalização nos mais pobres, já que os mais ricos também poderão comprar automóveis e queijos pagando menos impostos. Essas e outras medidas em preparação podem ter custo aproximado de R$ 50 bilhões para União, estados e municípios em 2022.

Daniel Couri, economista da IFI (Instituição Fiscal Independente), ligada ao Senado, lembra que, ao abrir mão de receitas em um ano eleitoral com perspectiva de baixo ou nenhum crescimento econômico, o país semeia um 2023 difícil para o equilíbrio das contas públicas.

"Muito do dinheiro sendo gasto agora pelo governo federal, assim como nos estados, é resultado da inflação, que faz a arrecadação subir à frente das despesas. Mas isso só funciona se a inflação for sempre crescente", afirma.

Couri lembra que o governo federal aprovou no Congresso a Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano com um déficit de R$ 170 bilhões, sendo que o Ministério da Economia trabalha com projeção pouco superior a R$ 70 bilhões (a da IFI é de R$ 100 bilhões).

"Com isso, o governo ficou com margem grande para adotar medidas no ano eleitoral. Como o teto de gastos limita o aumento da despesa, a saída tem sido fazer política fiscal expansionista com redução de receitas [de impostos]", diz.

Para Silvia Matos, coordenadora do boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, essas medidas tendem a gerar uma "ressaca" em 2023, com mais pressão sobre as contas públicas e a inflação futura. Pois, quando a tributação voltar, ela será reincorporada aos preços.

Ela avalia que, com tantas medidas de estímulo, o trabalho do Banco Central de subir a Selic para controlar a inflação equivale a "enxugar gelo". Por conta da escalada na taxa básica, o Brasil deve pagar cerca de R$ 900 bilhões de juros neste ano, o dobro de 2021.

Mas Matos considera difícil que, num quadro de baixíssimo crescimento e inflação alta como o atual, essas medidas sustentem a renda dos brasileiros —e o súbito aumento da competitividade eleitoral de Bolsonaro.

"Uma coisa é um cenário de preços em alta com crescimento econômico. Outra, uma economia parada, em que a renda do trabalhador já teve queda muito forte, não reage e é corroída todos os meses pela inflação num ambiente de alto desemprego", afirma.